Embora seja considerado a maior área úmida continental do planeta, o Pantanal está cada vez mais seco e pode sofrer sua pior crise hídrica este ano. O bioma não teve seu período habitual de cheia em 2024 e a média de área coberta por água foi menor do que a do período de seca do ano passado.
É o que revela estudo encomendado pela WWF-Brasil e feito pela empresa ArcPlan com financiamento do WWF-Japão, tendo como base dados do satélite de alta sensibilidade Planet.
“De forma geral, considera-se que há uma seca quando o nível do Rio Paraguai está abaixo de quatro metros. Em 2024, essa medida não passou de um metro. O nível do Rio Paraguai nos cinco primeiros meses deste ano esteve, em média, 68% abaixo da média esperada para o período”, explica Helga Correa, especialista em conservação do WWF-Brasil.
“O que nos preocupa é que de agora em diante o Pantanal tende a secar ainda mais até outubro. Nesse cenário, é preciso reforçar todos os alertas para a necessidade urgente de medidas de prevenção e adaptação à seca e para a possibilidade de grandes incêndios”, diz.
A dinâmica natural do bioma é ter estação chuvosa entre os meses de outubro a abril, e a seca de maio a setembro. “No processo de variação entre secas e cheias, as áreas inundadas têm sua vegetação alagada, ocasião em que parte dela morre e se decompõe, formando os detritos orgânicos que servem de alimento para os peixes detritívoros, especialmente abundantes em planícies de inundação como o Pantanal”, aponta o estudo.
Neste sentido, completa, “a diminuição das áreas úmidas gera não só uma preocupação com a conservação do Pantanal, mas também com a mudança de uso e ocupação das áreas altas da bacia, a região das cabeceiras, onde se encontram as nascentes dos principais afluentes do Rio Paraguai”.
Além dos impactos da crise climática sobre essa dinâmica, a conversão de áreas naturais por pastagem e agricultura, sobretudo nas cabeceiras (área de planalto da Bacia do Alto Paraguai), “intensifica os processos de erosão do solo e transporte de sedimentos, que gradualmente alteram as características físicas e químicas dos corpos hídricos da planície”.
De acordo com Helga Correa, “as principais nascentes da bacia do Alto Rio Paraguai, que abastecem a planície pantaneira, estão situadas na área mais alta, no Cerrado. O que observamos no Pantanal este ano está muito conectado com impactos em toda essa região nas últimas décadas. As cabeceiras foram muito desmatadas e temos riscos de barramento dos rios. Esses eventos diminuem a capacidade do Pantanal de ter seus pulsos de inundação de forma natural”.
O estudo alerta que “processos cumulativos de degradação do bioma – interrupção e regulação dos fluxos hídricos entre planalto e planície devido à construção de barramentos ou por estradas e drenos, associados ao desmatamento e queimadas – acentuados pelas mudanças climáticas aproximam o Pantanal de um ponto de não retorno”.
Outro dos sinais desses quadro preocupante enfrentado pelo Pantanal está nos incêndios que vêm ocorrendo sistematicamente nos últimos anos. Até o momento, a área queimada pelos incêndios mais recentes soma cerca de 627 mil hectares, ultrapassando de longe o desastre de 2020, quando 258 mil hectares foram consumidos pelas chamas.
De acordo com relatório feito pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), “a probabilidade da área queimada exceder 2 milhões de ha até o final de 2024 é superior a 80%”.
Recomendações
O estudo da WWF conclui que os resultados apresentados devem “servir de alerta para a urgente necessidade de medidas preventivas e adaptativas à seca que poderá mudar permanentemente o ecossistema do Pantanal, com consequências drásticas na riqueza e na abundância de espécies de fauna e flora, afora a economia local”.
Outro ponto grave é que tal situação pode impactar a produção energética do país, devido aos empreendimentos hidrelétricos instalados na região de cabeceiras dessa bacia.
Como forma de enfrentar e buscar reverter esse cenário, a organização recomenda a definição de ações de adaptação às mudanças climáticas, focando os eventos extremos; o mapeamento das ameaças que causam os maiores impactos ao conjunto hídrico da região; estruturar e aplicar planos de comunicação para disseminar e sensibilizar a população sobre a importância das cabeceiras e do Pantanal e fortalecer e ampliar políticas públicas para frear o desmatamento.
Além disso, propõe restaurar áreas de proteção permanente; mapear risco de fogo e apoiar sistemas de resposta rápida para incêndios; mapear a exposição humana à seca e antecipar planos emergenciais para a construção de cisternas e apoiar a valorização de comunidades, de proprietários e do setor produtivo que desenvolvem boas práticas e dar escala a ações produtivas sustentáveis na paisagem.
Com informações da WWF-Brasil
(PL)
