A decisão do Comitê de Política Monetária de interromper o ciclo de cortes na taxa básica de juros não surpreende, uma vez que o mercado tem sido instado pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a “pressionar e cercar” o governo Lula (PT). A avaliação é de André Roncaglia, doutor em Economia do Desenvolvimento pela FEA-USP e professor da Unifesp.

Por unanimidade, o Copom decidiu nesta quarta-feira 19 manter a Selic em 10,50% ao ano – ou seja, votaram desta forma os cinco diretores indicados por Jair Bolsonaro (PL) e os quatro escolhidos por Lula. Com isso, o Brasil fecha o dia como o segundo colocado na lista das mais altas taxas reais de juros, atrás apenas da Rússia, conforme um ranking atualizado pela consultoria MoneYou.

No encontro anterior, em 8 de maio, houve uma profunda divisão no Comitê, com 5 votos a favor de uma redução de 0,25 ponto e 4 votos pela queda de 0,50. Os integrantes indicados ao BC pelo governo Lula defenderam o corte mais expressivo.

“Veio à tona que Campos Neto vem atuando no sentido de divulgar informações financeiras catastróficas sobre o governo e, nesse sentido, o Copom ficou acuado”, afirmou Roncaglia a CartaCapital. “Se houvesse um novo racha, o próprio mercado já havia dito que seria uma sinalização muito ruim para o futuro da política monetária.”

Diante dessa pressão, avalia o economista, os indicados por Lula ao Copom – Ailton de Aquino, Gabriel Galípolo, Paulo Picchetti e Rodrigo Teixeira – optaram por uma decisão “estratégica”, embora os fundamentos concretos permitissem um novo recuo de pelo menos 0,25 ponto na Selic.

“Como o mercado já elevou a taxa terminal (o índice básico de juros ao fim do ciclo de cortes) para algo entre 10% e 10,5%, essencialmente fez um veto à continuidade do ciclo de afrouxamento monetário”, explica André Roncaglia. “É muito triste para o País, porque seria muito positivo se a gente saísse dos dois dígitos. Mas o mercado, na sua busca por razões para manter a Selic elevada, acabou acuando o Copom a tomar essa decisão muito aquém daquilo que poderia ter sido.”

No comunicado em que divulgou a decisão desta quarta, o Banco Central argumenta que o ambiente externo segue adverso, devido à “incerteza elevada e persistente sobre a flexibilização da política monetária nos Estados Unidos e quanto à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países”.

Já no cenário doméstico, a alegação é que “o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentando dinamismo maior do que o esperado”.

Além disso, ao contrário do que ocorreu nos últimos meses, não há uma sinalização clara sobre o que o Comitê fará no próximo encontro.

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Última Atualização: 01/07/2024