A China registrou uma entrada líquida de US$ 17,3 bilhões em seus mercados financeiros no mês de abril, segundo dados divulgados nesta segunda-feira, 20, pela Administração Estatal de Câmbio.
O fluxo de capital ocorreu em meio a um cenário internacional marcado por tensões comerciais com os Estados Unidos, incertezas fiscais e rebaixamento da classificação de crédito soberano norte-americana.
De acordo com o relatório, investidores estrangeiros aumentaram suas posições em títulos chineses em US$ 10,9 bilhões líquidos. Já o investimento em ações locais passou de vendas líquidas para compras líquidas no final de abril.
A entrada de capital se deu apesar do agravamento das disputas comerciais entre Washington e Pequim, intensificadas após a imposição de tarifas anunciadas pelo ex-presidente Donald Trump no início de abril.
A movimentação contrasta com a instabilidade nos mercados norte-americanos. Na última sexta-feira, 17, a agência de classificação Moody’s retirou a nota AAA dos títulos soberanos dos Estados Unidos, rebaixando a avaliação para Aa1.
A decisão foi atribuída ao aumento da dívida pública e aos riscos fiscais associados. Em consequência, os rendimentos dos títulos do Tesouro de 30 anos ultrapassaram 5% na abertura dos mercados na segunda-feira, 20, alcançando o maior patamar desde novembro de 2023.
Analistas do Bank of America apontaram que a combinação entre o enfraquecimento do dólar, a elevação dos juros longos norte-americanos e sinais de recuperação econômica da China favorece os mercados emergentes. “Dólar americano mais fraco, rendimento dos títulos americanos no topo, recuperação econômica da China… é hora dos mercados emergentes”, escreveram analistas da instituição.
A Moody’s foi a última das três principais agências de rating a retirar a classificação máxima dos Estados Unidos.
Para o Deutsche Bank, o rebaixamento simboliza um desgaste crescente do “privilégio exorbitante” dos EUA de emitir dívida em moeda forte com baixos custos. Em nota, o banco destacou: “A grande incógnita é quando tudo isso ruirá.”
A percepção de risco em relação à economia americana tem gerado revisões nos fluxos de investimento internacional. Desde o anúncio das tarifas por Trump, em 2 de abril — apelidadas de medidas do “Dia da Libertação” —, a hipótese de uma saída contínua de capitais da China perdeu força, ao passo que aumentaram os questionamentos sobre a sustentabilidade fiscal dos Estados Unidos.
“Nosso entendimento é que o ‘Dia da Libertação’ provavelmente antecipou esse acerto de contas”, afirmaram analistas do Deutsche Bank. Para George Saravelos, diretor de pesquisa de câmbio da instituição, a reação do mercado ao rebaixamento da nota indica que “o mercado está perdendo o apetite para financiar os déficits dos Estados Unidos e os crescentes riscos à estabilidade financeira”.
Em resposta ao cenário, o Ministério das Relações Exteriores da China declarou nesta segunda-feira que os Estados Unidos deveriam “tomar medidas políticas responsáveis para manter a estabilidade do sistema econômico e financeiro internacional e proteger os interesses dos investidores”.
A movimentação favorável aos ativos chineses ocorre também após a trégua comercial de 90 dias firmada entre Pequim e Washington em 12 de maio. Segundo analistas, esse acordo, somado à resiliência da economia chinesa registrada em abril, levou bancos de investimento a revisarem para cima as projeções de crescimento do país asiático.
Larry Tentarelli, fundador do Blue Chip Daily Trend Report, afirmou em entrevista à Bloomberg que está observando oportunidades nos mercados asiáticos.
“A China apareceu recentemente. Estou vendo oportunidades na China, Índia, Coreia e Taiwan”, declarou. Tentarelli alertou ainda que um retrocesso nas negociações entre Estados Unidos e China pode representar risco para os mercados americanos nos próximos três a seis meses.
A discussão fiscal nos Estados Unidos também ganhou novos contornos. Segundo analistas do Bank of America, a tendência é de agravamento da situação com a possível aprovação de um novo pacote de cortes de impostos. O Senado norte-americano estuda um projeto de lei que, segundo a análise, “aumentará ainda mais o déficit do que o que a Câmara está considerando”.
A proposta poderá elevar os déficits públicos anuais para algo entre 7% e 8% do Produto Interno Bruto (PIB) nos próximos dez anos, segundo estimativa do Bank of America, superando com folga o teto de 3% proposto pelo secretário do Tesouro, Scott Bessent.
Em meio às incertezas quanto à estabilidade fiscal e ao papel do dólar nos fluxos internacionais, os dados de abril apontam uma tendência de reorientação de parte do capital estrangeiro para ativos chineses. A resposta do mercado ao rebaixamento da nota norte-americana e à volatilidade dos títulos do Tesouro pode seguir influenciando as decisões de investidores globais nos próximos meses.
Com informações da SCMP