As novas tarifas sobre veículos e autopeças impostas pelo governo dos Estados Unidos começaram a impactar diretamente a dinâmica do setor automotivo.
Desde o dia 3 de abril, quando entrou em vigor a taxa adicional de 25% sobre a importação de carros de passeio, picapes e componentes, fabricantes internacionais têm revisto suas estratégias comerciais em relação ao mercado norte-americano.
Marcas tradicionais como Audi e Jaguar Land Rover foram as primeiras a suspender as exportações para os Estados Unidos. Além dessas, outras montadoras também iniciaram ajustes.
O Grupo Stellantis, responsável por marcas como Jeep e Fiat, interrompeu operações em fábricas localizadas no Canadá e no México, com a consequente dispensa temporária de centenas de trabalhadores.
A medida adotada pela administração Trump afeta particularmente empresas que operam plantas industriais fora do território norte-americano, com destaque para o México.
A produção automotiva no país vizinho é favorecida por menores custos de mão de obra, incentivos fiscais e localização geográfica estratégica, que facilita a logística de exportação para os Estados Unidos.
De acordo com relatos obtidos junto a representantes do setor, as reações variam. Enquanto algumas empresas decidiram suspender operações ou exportações, outras preferiram aguardar os desdobramentos para avaliar os impactos e decidir sobre possíveis mudanças. Mesmo com declarações comedidas, a maioria das montadoras demonstrou preocupação com o novo cenário.
Especialistas em economia e indústria automobilística projetam desaceleração no crescimento global do setor em 2025. Estimativas anteriores apontavam uma alta de 4% na produção e vendas mundiais de veículos, mas a expectativa agora é de revisão para baixo.
Parte dessa retração estaria ligada à elevação dos preços dos veículos importados nos Estados Unidos, que, segundo previsões de mercado, podem sofrer aumento de até US$ 12 mil. A elevação dos custos é considerada um fator decisivo para a queda na demanda.
Estudos indicam que a redução nas vendas pode chegar a 1 milhão de unidades, afetando diretamente a cadeia produtiva e o consumo.
Embora o aumento das tarifas possa, em tese, beneficiar montadoras nacionais, analistas afirmam que a substituição de modelos importados por similares produzidos nos Estados Unidos não é imediata. Consumidores que buscam marcas ou modelos específicos tendem a adiar a compra, em vez de migrar para veículos de outras fabricantes.
Outro impacto previsto é no processo de eletrificação da frota norte-americana. A fabricação de veículos elétricos depende fortemente de componentes importados, que também foram atingidos pelas novas tarifas. Isso pode atrasar a transição energética no setor e comprometer metas de descarbonização estabelecidas por governos e fabricantes.
A justificativa do presidente Donald Trump para a medida é baseada em alegações de desequilíbrio nas relações comerciais. Segundo ele, outros países impõem tarifas elevadas sobre veículos fabricados nos Estados Unidos.
Como exemplo, citou a União Europeia, que aplica uma alíquota de 10% sobre carros americanos, enquanto os EUA cobravam anteriormente 2,5% sobre automóveis europeus.
No entanto, o governo norte-americano já aplicava, antes da nova medida, uma tarifa de 25% sobre a importação de picapes — o segmento de maior volume de vendas no país. Especialistas apontam que, ao considerar esse dado, o argumento de desproporcionalidade perde força.
Trump declarou ainda que a política tarifária visa fortalecer a indústria automotiva nacional. Em 2024, dados da agência de classificação de risco Standard & Poor’s revelaram que 46% dos 16 milhões de veículos vendidos no país foram importados — mais de 7 milhões de unidades.
O mercado norte-americano, apesar da presença de grandes fabricantes locais como Ford e General Motors, depende fortemente das importações para atender à demanda.
Os principais países exportadores para os Estados Unidos incluem México, Japão, Coreia do Sul e Canadá. No caso mexicano, aproximadamente 76% da produção de veículos é destinada ao mercado norte-americano, o que representa mais de 3 milhões de unidades.
Com a imposição das tarifas, a tendência é que parte dessa produção fique sem destino, especialmente se as exportações forem interrompidas ou reduzidas significativamente.
Analistas destacam que o excedente da produção mexicana pode ser redirecionado para outros mercados, incluindo a América Latina. O Brasil é apontado como destino provável para esse fluxo, em razão do acordo de livre comércio firmado com o México.
A entrada de veículos mexicanos no mercado brasileiro em volumes maiores pode gerar impacto direto na competitividade da indústria nacional, especialmente em segmentos mais sensíveis a variações de preço.
A reconfiguração das relações comerciais e industriais provocada pela medida dos Estados Unidos está sendo monitorada de perto por governos, empresas e analistas.
As consequências para o mercado global de automóveis ainda são incertas, mas a expectativa é de que os efeitos se prolonguem ao longo dos próximos meses, com implicações tanto econômicas quanto geopolíticas.
Com informações do G1