Em meio a tarifas e tensões geopolíticas, Índia e EUA lançam satélite que pode transformar a forma como lidamos com desastres e mudanças climáticas


Enquanto tensões comerciais marcavam o dia a dia das relações internacionais, os Estados Unidos e a Índia celebraram um marco científico significativo com o lançamento bem-sucedido do satélite NISAR, um projeto conjunto que promete revolucionar o monitoramento ambiental e a prevenção de desastres naturais em escala global.

O satélite de radar de abertura sintética NISAR, desenvolvido em parceria entre a NASA e a Organização Indiana de Pesquisa Espacial (ISRO), decolou na última quarta-feira às 17h40, horário local, do Centro Espacial Satish Dhawan, em Sriharikota, na costa leste da Índia. O foguete GSLV-F12 da ISRO levou a carga para o espaço, e cerca de duas horas depois, às 5h59, o satélite havia entrado com sucesso em sua órbita prevista.

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A ISRO comemorou a precisão técnica da operação em sua conta no X (antigo Twitter): “Cada estágio é preciso. Ignição criogênica e desempenho do estágio criogênico impecáveis”, anunciou a agência espacial indiana, destacando o sucesso de uma das operações mais complexas da astronautônica moderna.

Tecnologia de ponta para monitorar o planeta

O NISAR (NASA-ISRO Synthetic Aperture Radar) representa um salto qualitativo na capacidade de observação da Terra. Equipado com tecnologia de radar de última geração, o satélite será capaz de rastrear movimentos sutis nas superfícies terrestres e nas camadas de gelo, fornecendo dados cruciais para o entendimento das mudanças climáticas e para a prevenção de desastres naturais.

A missão tem como objetivos principais monitorar fenômenos como terremotos, inundações, furacões e outros eventos extremos que afetam milhões de pessoas ao redor do mundo. A capacidade do satélite de gerar imagens detalhadas mesmo em condições de nuvem ou escuridão o torna particularmente valioso para regiões propensas a desastres naturais.

De acordo com a NASA, o NISAR gerará mais dados diariamente do que qualquer outro satélite de observação terrestre já lançado por qualquer uma das duas agências. O investimento norte-americano no projeto chegou a aproximadamente US$ 1,2 bilhão, embora a ISRO não tenha divulgado o montante investido pela Índia.

Parceria que transcende tensões comerciais

O lançamento ocorreu no mesmo dia em que o presidente Donald Trump anunciava uma tarifa de 25% sobre produtos indianos, destacando a complexidade das relações internacionais contemporâneas, onde cooperação científica e disputas comerciais coexistem.

A colaboração entre NASA e ISRO não é nova. A parceria remonta à missão Chandrayaan-1, em 2008, que marcou a primeira incursão da Índia no espaço profundo e que contou com instrumentos da NASA para confirmar a presença de água na Lua. Mais recentemente, as duas agências trabalharam juntos em uma missão que enviou um astronauta indiano à Estação Espacial Internacional em junho deste ano.

“O NISAR aproximou as duas agências mais do que nunca”, declarou o presidente da ISRO, V. Narayanan, pouco depois do lançamento bem-sucedido do satélite.

Consolidação da posição da Índia no cenário espacial global

O projeto NISAR demonstra a crescente maturidade do programa espacial indiano e sua capacidade de protagonizar missões complexas em parceria com as principais agências espaciais do mundo. A Índia tem investido pesadamente em sua infraestrutura espacial nos últimos anos, com o objetivo de se tornar uma potência global nesse setor estratégico.

A expansão das colaborações internacionais da ISRO ganhou novo impulso recentemente. Em maio, a Agência Espacial Europeia (ESA) anunciou uma declaração de intenções para colaborar com a contraparte indiana em voos espaciais tripulados. O movimento foi concretizado em dezembro passado, quando um foguete indiano lançou dois satélites da ESA, marcando o primeiro lançamento comercial da ISRO para a agência europeia em cerca de duas décadas.

Impacto científico e humanitário

A implementação do NISAR promete benefícios concretos para milhões de pessoas ao redor do mundo. A capacidade de prever e monitorar desastres naturais com maior precisão pode salvar vidas e reduzir perdas econômicas significativas. Além disso, os dados coletados pelo satélite serão fundamentais para pesquisadores que estudam as mudanças climáticas e seus impactos em diferentes ecossistemas.

O sucesso da missão reforça a importância da cooperação internacional em ciência e tecnologia, especialmente em um momento em que desafios globais como as mudanças climáticas exigem soluções colaborativas que transcendam fronteiras políticas e comerciais.

Com o NISAR agora em órbita, os olhos do mundo estarão voltados para os primeiros dados que o satélite enviará à Terra, prometendo uma nova era no monitoramento ambiental e na prevenção de desastres naturais.

Trump anuncia tarifa de 25% sobre a Índia e ameaça sanções por compras russas

O presidente Donald Trump surpreendeu o cenário internacional nesta quarta-feira ao anunciar uma tarifa de 25% sobre as exportações indianas para os Estados Unidos, a partir de 1º de agosto, em uma medida que promete abalar as relações comerciais entre os dois países e impactar diretamente diversos setores da economia indiana.

Em pronunciamento veiculado pelas redes sociais, Trump justificou a decisão apontando as altas tarifas indianas e a forte dependência do país asiático em relação à Rússia. “Além disso, eles sempre compraram a grande maioria de seus equipamentos militares da Rússia e são o maior comprador de ENERGIA da Rússia, juntamente com a China, em um momento em que todos querem que a Rússia PARE COM A MATANÇA NA UCRÂNIA”, escreveu o presidente norte-americano. “A ÍNDIA, PORTANTO, PAGARÁ UMA TARIFA DE 25%, MAIS UMA MULTA PELOS ITENS ACIMA, A PARTIR DE PRIMEIRO DE AGOSTO.”

Impacto imediato nos mercados indianos

A reação dos mercados foi rápida e contundente. A rupia indiana despencou 0,8%, atingindo 87,87 por dólar nas negociações offshore — sua menor cotação em cinco meses. Os futuros do índice Nifty 50, negociados na Gujarat International Finance Tec-City, recuaram 0,5% após o anúncio.

“Embora as negociações comerciais pareçam ter fracassado entre as duas nações, levando os EUA a penalizar a Índia, achamos que a saga comercial e as negociações não necessariamente acabaram”, analisou Madhavi Arora, economista da Emkay Global Financial Services Ltd. “Há também um ângulo geopolítico global nessas negociações comerciais que vai além do ângulo puramente econômico.”

Contexto das negociações frustradas

O anúncio de Trump chega como uma surpresa para Nova Déli, que havia finalizado os termos de referência para um acordo comercial bilateral após a reunião do vice-presidente americano, J.D. Vance, com o primeiro-ministro Narendra Modi em abril. Ambos os lados haviam se comprometido com um prazo para conclusão do acordo no outono.

Até mesmo horas antes do pronunciamento presidencial, autoridades em Nova Déli afirmavam que continuariam negociando um acordo comercial “justo, equilibrado e mutuamente benéfico”. O governo indiano destacou a necessidade de proteger agricultores, empreendedores e pequenas empresas, reafirmando que “tomará todas as medidas necessárias para garantir nossos interesses nacionais”.

Mudança abrupta na postura americana

Durante grande parte do ano, o governo Modi adotou uma abordagem conciliatória em relação ao governo Trump, reformulando sua estrutura tarifária e oferecendo diversas concessões comerciais e de imigração. Assessores do presidente norte-americano também haviam sinalizado que um acordo comercial com a Índia estava próximo.

No entanto, nas últimas semanas, o tom das negociações parece ter mudado drasticamente, com Nova Déli endurecendo sua posição diante de obstáculos em questões sensíveis como a agricultura. Um dos principais pontos de discórdia foi a exigência dos EUA de exportar safras agrícolas geneticamente modificadas — algo que a Índia se recusou a aceitar, alegando riscos para seus agricultores.

Sanções secundárias e dependência russa

A ameaça de Trump não se limita às tarifas comerciais. O presidente também anunciou a possibilidade de aplicar “sanções secundárias” aos países que continuarem comprando petróleo da Rússia — uma medida que pode atingir diretamente a Índia, que se tornou uma das maiores importadoras de petróleo russo desde a invasão da Ucrânia em 2022.

Dados da consultoria Kpler mostram que a Índia importou mais de um terço de suas compras totais de petróleo da Rússia neste ano. Além disso, cerca de 36% do arsenal militar indiano é de origem russa, o que complica ainda mais a posição de Nova Déli diante das pressões americanas.

“Essa dependência energética significa que mudar para novos fornecedores pode ter um impacto negativo nas contas correntes e nas expectativas de inflação da Índia, além de pesar no sentimento em relação aos mercados locais”, alertou Brendan McKenna, economista de mercados emergentes e estrategista de câmbio do Wells Fargo & Co.

Repercussão política interna

A oposição indiana não poupou críticas ao governo Modi. O líder do principal partido de oposição, Jairam Ramesh, foi direto ao ponto ao afirmar que a aproximação do primeiro-ministro com Trump não rendeu resultados concretos. “Todo aquele conflito entre ele e Howdy Modi significou pouco”, escreveu Ramesh em sua conta no X.

Desvantagem competitiva para a Índia

A tarifa de 25% imposta aos produtos indianos coloca o país em desvantagem competitiva em relação a outros parceiros asiáticos dos EUA. Enquanto o Vietnã garantiu tarifas de 20%, a Indonésia 19% e o Japão 15%, a Índia enfrentará a maior carga tributária entre os principais parceiros comerciais norte-americanos.

“Perspectivas de exportação e o apelo de investimentos da Índia seriam prejudicados, ainda mais se as isenções setoriais para smartphones e outros eletrônicos fossem eliminadas e a tarifa básica de cada país fosse aplicada”, advertiu Alexandra Hermann, economista da Oxford Economics em Londres.

Desafios para a economia global

O comércio bilateral entre Índia e EUA atingiu US$ 128 bilhões em 2024, com os Estados Unidos sendo o maior parceiro comercial da Índia e seu principal mercado de exportação. A decisão de Trump coloca em xeque não apenas as relações bilaterais, mas também os esforços dos EUA para cultivar a Índia como um aliado estratégico no Indo-Pacífico, especialmente como contrapeso à influência chinesa na região.

Kevin Hassett, presidente do Conselho Econômico Nacional da Casa Branca, defendeu a posição americana ao afirmar que os EUA buscam “acesso aos mercados da Índia para suas empresas e agricultores”. “E se pudéssemos fazer isso na Índia, seria uma mudança radical para a economia global, porque é uma economia muito grande e crescente”, destacou.

Com a decisão de Trump, a Índia agora enfrenta um dilema geopolítico complexo: manter sua independência estratégica e suas relações tradicionais com a Rússia, ou alinhar-se mais estreitamente com a agenda comercial e política dos Estados Unidos. A resposta de Nova Déli nos próximos dias será crucial para definir o futuro das relações entre as duas democracias emergentes.

Com informações de Bloomberg e Agências de Notícias*

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Last Update: 30/07/2025