Falar sobre o que acontece dentro das quatro linhas do futebol brasileiro tem se tornado cada vez mais desafiador.

O caso de racismo sofrido pelo jovem Wendel, jogador da categoria sub-20, na Rússia, é importante por vários motivos.

O primeiro deles é o fato de ele ter conseguido, no auge da emoção, expressar-se de forma bem articulada e com uma lucidez surpreendente.

De acordo com as notícias publicadas na mídia, Wendel foi expulso aos 29 minutos do segundo tempo do jogo pelo campeonato russo por fazer gestos ofensivos em direção à torcida do time adversário, o Fakel.

O técnico do Zenit chegou a afirmar, ao fim da partida, que Wendel estava sofrendo ofensas racistas dos torcedores e de pelo menos um jogador do Fakel. Mas, nas redes, o clube tratou o episódio de forma genérica, sem dar detalhes do que aconteceu.

O atleta então escreveu: “Esse gesto não intencional foi minha reação emocional. Não aguentava mais (…) Já me deparei com manifestações como essas antes, e isso significa que há pessoas que participam, permitem e até incentivam esse comportamento”.

Vale destacar também a revolta de Wendel ainda em campo, quando foi abordado por um repórter que o questionou normalmente sobre o jogo.

Em tom indignado, ele respondeu: “Você não vai perguntar sobre o que fizeram comigo? É sério? O que fizeram comigo é um crime!”

Por um lado, é um alento ver um jogador “em formação”, como Wendel se autodenominou, com um nível de consciência tão elevado sobre o assunto. Isso reacende a esperança de que mudanças concretas aconteçam nessas situações.

Todos estamos cansados de notas protocolares e medidas que supostamente serão tomadas, mas que nunca se concretizam.

Embora o caso de Wendel seja de extrema relevância, nesta semana ele acabou sendo ofuscado por outra polêmica envolvendo Neymar, que gerou discussões sobre sua ausência no jogo entre Santos e Corinthians, pela semifinal do Campeonato Paulista.

Para entendermos melhor por que Neymar foi poupado, bastaria lembrar as condições de seu contrato curto, que sugeria a intenção de se preparar com tranquilidade para disputar a próxima Copa do Mundo, no ambiente “caseiro” de Santos.

No entanto, a alegria pelo gol olímpico na Vila Belmiro logo foi substituída por uma tempestade que perturbou tudo, inclusive colocando em dúvida sua convocação para a próxima Data Fifa.

Uma discussão interessante que esse momento provoca é a situação de um treinador quando precisa decidir se escala ou não determinado jogador, considerando questões como sua condição física. Um exemplo disso foi o caso do agora palmeirense Vitor Roque.

Mesmo tendo acabado de chegar, mas estando em boa forma e com ritmo de jogo, ele ficou à disposição. Abel Ferreira confessou seu dilema ao ter de “sacar” o titular de um time que estava indo bem. Nesse caso, ele optou por chamar o argentino Flaco López, explicando sua escolha para buscar maior profundidade no ataque.

Nessa hora, com o jogador “na bronca” (pois todo mundo sempre quer jogar), surgem os conflitos de egos e a necessidade de uma gestão de equipe eficaz, capaz de resolver esses problemas de forma profissional.

Uma notícia sobre esse tipo de questão veio, esta semana, da Bélgica. De acordo com o Globo Esporte, o goleiro Koen ­Casteels renunciou à convocação para a seleção por causa do retorno de Courtois, do Real Madrid, à equipe.

Koen, que se tornou titular quando Courtois saiu, criticou a federação de futebol do país: “É estranho que a federação tenha mudado de direção e estendido o tapete vermelho para ele, para recebê-lo de braços abertos”.

Outro caso envolve o próprio Neymar, que foi para o banco de reservas sem que se compreendesse muito bem o motivo.

A justificativa do treinador foi que a presença do jogador no banco serviria como um apoio emocional, pelo que ele representa. Na realidade, isso acabou demonstrando uma fragilidade na estrutura do clube.

O que significava a presença do craque, uniformizado, se não tinha condições de entrar em campo em nenhum momento? Isso acabou desgastando sua imagem em um momento inoportuno. •

Publicado na edição n° 1353 de CartaCapital, em 19 de março de 2025.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Basta disso’

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Last Update: 13/03/2025