A Polícia Federal concluiu que o general da reserva Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, teve papel de liderança no planejamento e na execução de medidas para desacreditar o processo eleitoral e para “subverter o regime democrático”.
A avaliação consta do relatório em que a corporação indiciou Heleno, Jair Bolsonaro (PL) e mais 35 pessoas. O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes retirou o sigilo do documento nesta terça-feira 26 e enviou o inquérito à Procuradoria-Geral da República, que pode denunciar os indiciados, arquivar o caso ou solicitar novas diligências.
Os investigadores encontraram na casa de Heleno uma agenda que, entre outros pontos, revela sua participação em reuniões de “diretrizes estratégicas” voltadas à desinformação sobre o sistema eletrônico de votação.
Diz o relatório:
“Os elementos de prova não deixam dúvidas de que a organização criminosa estava elaborando estudos para de alguma forma tentar coagir integrantes do sistema de persecução penal para que as investigações contra seus integrantes fossem cessadas, ainda que pela aprovação de verdadeiras aberrações jurídicas, como um parecer administrativo declarar uma ordem judicial inconstitucional, colocando a AGU como órgão revisor de decisões jurisdicionais, fato não abarcado pela Constituição Federal de 1988.”
Segundo a PF, documentos apreendidos na casa de Heleno descrevem argumentos ligados a supostas vulnerabilidades nas urnas, um subsídio para a disseminação de informações falsas sobre a eleição.
O nome do ex-ministro também aparece vinculado à Operação Contragolpe, deflagrada pela PF na semana passada.
A corporação prendeu quatro militares do Exército ligados às forças especiais, os chamados “kids pretos”: o general Mário Fernandes, o tenente-coronel Helio Ferreira Lima, o major Rodrigo Bezerra Azevedo e o major Rafael Martins de Oliveira. Outro preso é o policial federal Wladimir Matos Soares.
Os militares presos projetavam a criação de um “gabinete de crise” após executarem o então presidente eleito Lula (PT), seu vice Geraldo Alckmin (PSB) e Alexandre de Moraes. O comando do grupo ficaria a cargo de Heleno e do general da reserva Walter Braga Netto.
Para a PF, a posição de liderança de Heleno no plano de gabinete “demonstra aderência e ciência do investigado a ideias radicais do grupo militar engajado na tentativa de Golpe de Estado”.
Também há uma menção a Heleno em um documento encontrado na sede do PL sobre a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. As folhas estavam na mesa de um assessor de Braga Netto e traziam respostas sobre quem Cid teria citado em sua colaboração. Em um tópico intitulado “Outras informações”, havia a mensagem: “‘Não falou nada sobre os Gen Heleno e BN’.”
“O foco de atenção e preocupação dado pelos diversos investigados da área militar sobre quem teria sido citado na colaboração, demonstra que o general Augusto Heleno tinha papel relevante nos fatos investigados, exercendo, conforme todos os elementos probatórios demonstram, posição de liderança e proeminência na execução do plano de golpe de Estado”.
Os núcleos do esquema
A PF apontou Heleno como integrante de um grupo responsável por levantar dados que ajudariam Bolsonaro a consumar o golpe.
O general faria parte do chamado Núcleo de Inteligência Paralela. Como ministro do GSI, ele era o chefe da Agência Brasileira de Inteligência, alvo de investigação da PF no caso conhecido como “Abin Paralela”. Atualmente, o órgão está sob o guarda-chuva da Casa Civil.
O suposto esquema na agência teria funcionado entre 2019 e 2021, durante o período em que o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) foi o diretor-geral da agência.
O núcleo do qual Heleno supostamente fez parte tinha a seguinte atribuição, de acordo com a PF:
“Coleta de dados e informações que pudessem auxiliar a tomada de decisões do então presidente da República Jair Bolsonaro na consumação do golpe de Estado. Monitoramento do itinerário, deslocamento e localização do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e de possíveis outras autoridades da República com objetivo de captura e detenção quando da assinatura do decreto de golpe de Estado”.
Também fariam parte desse núcleo Marcelo Costa Câmara, coronel da reserva e ex-assessor de Bolsonaro, e o tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens do então presidente.
Confira os núcleos mencionados pela PF:
- Núcleo de Oficiais de Alta Patente com Influência e apoio a Outros Núcleos
- Núcleo de Inteligência Paralela
- Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas
- Núcleo Jurídico
- Núcleo Responsável por Incitar Militares à Aderirem ao Golpe de Estado
- Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral
Bolsonaro está na relação de indiciados pela PF, mas não aparece como integrante de algum núcleo específico — ele seria o beneficiário da ação dos grupos. Veja a divisão de outros alvos:
Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral
- Mauro Cesar Barbosa Cid
- Anderson Torres
- Angelo Martins Denicoli
- Fernando Cerimedo
- Eder Lindsay Magalhães Balbino
- Hélio Ferreira Lima
- Guilherme Marques Almeida
- Sergio Ricardo Cavaliere De Medeiros
- Tércio Arnaud Tomaz
Núcleo Responsável por Incitar Militares à Aderirem ao Golpe de Estado
- Walter Souza Braga Netto
- Paulo Renato De Oliveira Figueiredo Filho
- Ailton Gonçalves Moraes Barros
- Bernardo Romão Correa Neto
- Mauro Cesar Barbosa Cid
Núcleo Jurídico
- Filipe Garcia Martins Pereira
- Anderson Gustavo Torres
- Amauri Feres Saad
- Jose Eduardo de Oliveira e Silva
- Mauro Cesar Barbosa Cid
Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas
- Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros
- Bernardo Romão Correa Neto
- Hélio Ferreira Lima
- Rafael Martins de Oliveira
- Alex de Araújo Rodrigues
- Cleverson Ney Magalhães
Núcleo de Inteligência Paralela
- Augusto Heleno Ribeiro Pereira;
- Marcelo Costa Câmara;
- Mauro Cesar Barbosa Cid
Núcleo de Oficiais de Alta Patente com Influência e apoio a Outros Núcleos
- Walter Souza Braga Netto;
- Almir Garnier Santos
- Mario Fernandes
- Esteva Theophilo Gaspar de Oliveira
- Laércio Vergílio;
- Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira