Os impactos da crise que agita o Nepal vão além da renúncia, nesta terça-feira (9), do primeiro-ministro Khadga Prasad (KP) Sharma Oli, membro do CPN [Partido Comunista do Nepal – Marxista-Leninista Unificado]. Em carta ao presidente Ram Chandra Poude (do partido Congresso Nepalês), Oli afirmou que seu gesto visa “dar novos passos em direção a uma solução política e à resolução dos problemas”. O desfecho da turbulência, porém, não está claro.
Durante dois dias, atos violentos terminaram com mais de 20 mortos e 600 feridos, além de um cenário de profunda instabilidade política. As sedes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário foram incendiadas. À frente das manifestações está a chamada Geração Z, formada por jovens nascidos entre 1995 e 2010. Eles teriam reagido ao bloqueio das principais plataformas digitais, iniciado em 4 de setembro.

O Portal Vermelho conversou com a líder sindical e comunista Smritee Lama, secretária de Relações Internacionais da Gefont (Federação Geral dos Sindicatos Nepalenses) e dirigente do CPN. Segundo Smritee, “os protestos da Geração Z abalaram a nação em sua essência, deixando um rastro de devastação generalizada e colapso político”.
A mobilização nas ruas teve início quando o governo, cumprindo uma decisão da Suprema Corte do Nepal, bloqueou 26 grandes plataformas, como WhatsApp, Facebook, Instagram, YouTube e X (ex-Twitter). Comandadas pelas big techs – as gigantes da tecnologia –, essas redes se recusaram a colaborar com a Justiça, que lhe exigia registro local.
“Embora fosse uma medida de conformidade legal, muitos jovens a perceberam como um ataque à liberdade de expressão e aos direitos digitais”, diz Smritee. “Ao mesmo tempo, alguns interesses políticos e geopolíticos parecem ter manipulado e mobilizado parcialmente os jovens para os protestos, ampliando as tensões e transformando uma questão legal em uma crise nacional.”
Com slogans como “Desbloqueiem as Redes Sociais” e “Acabem com a Corrupção, não com as Plataformas”, milhares de jovens saíram às ruas a partir de segunda-feira (8). “O que começou como um protesto pacífico se transformou em confrontos violentos, com manifestantes rompendo barricadas, incendiando prédios governamentais e invadindo escritórios políticos. As forças de segurança responderam com canhões de água, gás lacrimogêneo, balas de borracha e munição real”, resume a sindicalista.
Em sua opinião, o quadro no Nepal escalou nesta terça: “Vários dos principais líderes políticos foram brutalmente atacados, suas residências e escritórios incendiados, e o governo civil efetivamente colapsou”. Radhika Shakya, esposa do ex-premiê Oli, foi queimada viva, não resistiu aos ferimentos e morreu. “Perturbadoramente, o próprio escritório sindical do Gefont, foi sabotado durante a agitação, agravando ainda mais a crise.”
A renúncia do primeiro-ministro não foi suficiente para aplacar a crise. “Nenhuma autoridade civil eficaz assumiu o controle. No vácuo de poder, o exército tomou as ruas, impondo toques de recolher e patrulhando áreas-chave”, diz Smritee. “O Aeroporto Internacional Tribhuvan foi fechado, voos foram desviados e a vida cotidiana paralisada.”
O bloqueio às plataformas foi suspenso, mas o Nepal país segue em convulsão. “. “O país está agora à beira da incerteza, sob controle militar de fato”, explica Smritee Lama. “Além das frustrações domésticas, há interesses geopolíticos e uma manipulação da participação juvenil que alimentaram ainda mais a agitação, revelando a fragilidade das instituições democráticas do Nepal e a profunda indignação de sua juventude.”