
A British Petroleum, uma das gigantes globais do petróleo, anunciou nesta segunda-feira (4) a maior descoberta da empresa nos últimos 25 anos. O achado foi feito no campo de Bumerangue, na Bacia de Santos — uma área de mais de 300 km², equivalente a cinco vezes o tamanho de Manhattan. Segundo a própria companhia, trata-se do maior achado desde Shah Deniz, campo de gás descoberto em 1999 no Mar Cáspio.
O modelo de partilha de produção prevê que a empresa vencedora destine à União uma parte do chamado “lucro óleo”, o excedente de petróleo que sobra após o abatimento dos custos. Nos leilões, vence quem oferece o maior percentual para o Estado brasileiro. No caso de Bumerangue, ninguém concorreu com a BP. E, mesmo sem disputa, ela ficou com o campo por um valor irrisório em relação ao potencial da região.
Mas um detalhe chama atenção: Bumerangue foi adquirido pela BP em 2022 no primeiro Ciclo de Oferta Permanente da ANP, usando o modelo de Partilha de Produção. E mais: a BP foi a única interessada no bloco e pagou o menor percentual de lucro óleo ao governo — apenas 5,9%.
Um número muito abaixo dos ágios registrados em outros campos da mesma rodada. Ou seja: a empresa garantiu 100% do controle do bloco, por um valor quase simbólico, e menos de três anos depois anuncia a maior descoberta de sua história recente.
No mundo dos negócios, esse tipo de coincidência raramente é obra do acaso. Alguém sabia exatamente o que estava levando. Alguém lucrou muito, antes mesmo de qualquer barril ter sido extraído.
O campo está na mesma faixa geológica do bloco Aram, operado pela Petrobras em parceria com a estatal chinesa CNPC. Aram é apontado pela ANP como um dos maiores do pré-sal, com estimativa de 29 bilhões de barris in place. Técnicos ouvidos pelo Globo acreditam que Bumerangue deve ter volumes comparáveis, embora ainda não confirmados oficialmente.

Outro ponto que gera desconfiança é o ritmo. Campos do pré-sal costumam levar muitos anos entre aquisição e descoberta. Em Bumerangue, a BP conseguiu avançar da assinatura do contrato à descoberta em menos de três anos. Para os padrões de águas ultra-profundas, esse tipo de agilidade sugere que informações prévias já existiam, ou que os dados sísmicos utilizados na decisão de compra eram mais precisos do que se esperava.
O anúncio acontece na véspera da divulgação dos resultados trimestrais da BP e em meio à pressão do fundo americano Elliott, que recentemente entrou no capital da empresa exigindo mudanças estratégicas. A BP também enfrenta rumores de fusão com a Shell e trocou o comando do conselho de administração nesta semana, nomeando o irlandês Albert Manifold para o posto.
Em meio a tudo isso, a notícia de uma superdescoberta no Brasil caiu como uma luva: impulsiona as ações da empresa, reforça a narrativa de eficiência exploratória e eleva o valor do ativo — comprado por um preço que agora soa ridículo.
A sequência de fatores levanta uma pergunta inevitável: como um campo dessa importância foi parar nas mãos de uma única empresa, praticamente sem disputa, por um percentual tão baixo?
Não é a primeira vez que ativos do pré-sal mudam de mãos com pouca transparência ou sob condições favoráveis demais. A diferença agora é que a descoberta foi rápida e grandiosa. Resta saber se os órgãos de fiscalização vão olhar com atenção para esse processo, ou se a história de Bumerangue será enterrada sob uma camada de bilhões de barris de silêncio.