A reorganização da geopolítica mundial impulsionada pela transição energética está deslocando o foco estratégico do petróleo e do gás para os minerais críticos, como lítio, nióbio e terras raras.

Esses insumos são essenciais para tecnologias de baixo carbono, como baterias de veículos elétricos, turbinas eólicas, painéis solares e dispositivos eletrônicos. Nesse cenário, o Brasil surge com potencial para ocupar posição central no fornecimento global desses recursos.

Segundo reportagem do jornal O Globo, o país possui reservas relevantes de minerais estratégicos. Entre os destaques estão o lítio, com projetos estimados em R$ 15 bilhões até 2030, e as terras raras, cuja reserva brasileira é a segunda maior do mundo, atrás apenas da China.

Minas Gerais lidera a produção nacional, com destaque para o Vale do Jequitinhonha. No caso do nióbio, utilizado em supercondutores e baterias, o Brasil detém mais de 90% das reservas conhecidas.

Para Marcio Couto, superintendente de pesquisa da FGV Energia, o país pode aumentar sua relevância internacional.

“O Brasil pode ter uma posição geopolítica muito mais relevante do que tinha com o processo de transição energética”, afirmou. Ele destacou, no entanto, que o aproveitamento das reservas deve considerar as exigências ambientais. “Nem todo o potencial do país poderá ser explorado”, disse.

A complexidade dos projetos e a necessidade de estrutura adequada são pontos críticos. Manuel Fernandes, sócio da KPMG no setor de Energia e Recursos Naturais, afirmou que a definição do papel do país — se exportador de matéria-prima ou produtor de bens de valor agregado — será determinante.

“Para fazer uma mina tradicional, com a logística para chegar no ponto de embarque, são de três a cinco anos. E construir uma refinaria para esses minerais críticos leva de três a quatro anos. Então, não é um projeto para curtíssimo prazo”, explicou.

Outro ponto destacado por Fernandes é a necessidade de inovação tecnológica. Apesar de a China concentrar 70% da produção mundial de terras raras, o país asiático também investe em fontes renováveis de energia para sustentar sua demanda.

No Brasil, a participação na oferta global de minerais críticos ainda é inferior a 1%, o que demonstra a distância entre o potencial mineral e a capacidade produtiva instalada.

Valdir Silveira, diretor de Geologia e Recursos Minerais do Serviço Geológico do Brasil (SGB), alerta para os gargalos na cadeia de suprimentos causados pela concentração dos recursos em poucos países. “A transição energética eleva esses minerais ao status de ‘recursos estratégicos críticos’, comparáveis ao petróleo no século XX.

Portanto, países que têm reservas significativas, como o Brasil, mas também capacidade de produção ou, principalmente, capacidade de refino e processamento (onde a China domina e tem grande vantagem atualmente), estão no centro de atenção de poder geopolítico”, disse.

Um estudo da Mission Possible Partnership (MPP) identificou uma nova tendência global que pode favorecer países como o Brasil. Segundo o relatório, Índia, Egito e Brasil integram o chamado “cinturão industrial solar” — regiões com abundância de recursos naturais propícias à geração de energia solar e formação de uma base industrial limpa.

A pesquisa aponta que a China lidera os investimentos em indústrias limpas, com 25% dos US$ 250 bilhões globais aplicados, seguida pelos Estados Unidos (20%) e pela União Europeia (15%). No entanto, o cinturão solar já concentra 20% dos investimentos previstos e responde por 59% dos projetos anunciados em setores como alumínio, cimento, aço, aviação e produtos químicos.

“Assim como as indústrias do passado se localizaram perto das minas de carvão, a nova geração de plantas industriais intensivas em energia irá para onde puderem ter acesso a eletricidade abundante, confiável, barata e limpa para produzir materiais, produtos químicos e combustíveis”, afirmou Faustine Delasalle, CEO da MPP e diretora do Acelerador de Transição Industrial (ITA), em declaração divulgada durante a COP28.

Apesar das perspectivas, o relatório da MPP também apresenta obstáculos. O ritmo de conversão de projetos em operação é considerado lento. De acordo com os dados, mantida a taxa atual, seriam necessários 40 anos para que os projetos anunciados saiam do papel. O estudo defende um aumento de cinco vezes no nível atual de investimentos, com envolvimento direto de governos, instituições financeiras e empresas privadas.

No Brasil, o avanço depende da formulação de uma política industrial que estimule a agregação de valor aos produtos minerais e garanta autonomia tecnológica.

Além disso, será necessário articular políticas públicas e estratégias privadas para transformar o potencial geológico em crescimento econômico sustentável. Preservar o meio ambiente e atender às exigências regulatórias internacionais são condições para que o país amplie sua presença no cenário global de energia limpa.

O posicionamento do Brasil no mercado internacional de minerais críticos dependerá da capacidade de alinhar seus ativos naturais com investimentos estratégicos, estrutura industrial e compromisso com a transição energética.

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Last Update: 03/07/2025