Não há dúvida que o imperialismo foi derrotado no terreno na guerra contra o Irã. Os primeiros lances da guerra, no entanto, favoreceram enormemente o imperialismo. Nós que lutamos contra esse monstro feroz amargamos o fato de que o Irã teria sido enganado pelas negociações com Trump e deixado o campo livre para a agressão israelense. Uma dezena de mortes de cientista nucleares, de vários generais da alta cúpula militar do Irã teriam sido trucidados por Israel, que tinha também feito um ataque devastador em 13 de junho.
A propaganda do imperialismo é que os ataques de Israel ao Irã são realizados inteiramente pelas forças genocidas de Israel, o que é evidentemente mentira. Os EUA já estão ativamente engajados no conflito israelense-iraniano, fornecendo não apenas inteligência, dados de direcionamento e armamento para as Forças de Defesa de Israel, mas também implantando os sistemas de defesa aérea THAAD do Exército dos EUA e destroieres AEGIS para apoiar a interceptação de mísseis balísticos iranianos. Relatórios não confirmados indicam que caças dos EUA também apoiaram a interceptação de drones iranianos, como fizeram durante os conflitos anteriores e menos intensos entre Irã e Israel em abril e outubro de 2024. A Força Aérea Israelense também dependeu fortemente do apoio de reabastecimento aéreo de vários membros da OTAN, incluindo os EUA e a Alemanha, para que seus caças atingissem alvos iranianos.
Sem reabastecimentos dos EUA ou maior participação de suas forças, algumas avaliações projetam que Israel poderia manter sua defesa antimísseis por mais 10 ou 12 dias se o Irã mantiver um ritmo constante de ataques. Os sistemas israelenses só podem ser capazes de interceptar uma proporção menor de mísseis devido à necessidade de racionar munição defensiva. Os sistemas de defesa antimísseis israelenses provaram ter dificuldades em interceptar ataques externos, mesmo mísseis balísticos de classe relativamente básica, como os lançados pelas forças iemenitas. Isso lançou sérias dúvidas sobre sua capacidade de interceptar mísseis iranianos de médio e alto calibre.
A escassez de mísseis antibalísticos de Israel já era um problema sério em meados de 2024, com ataques contínuos de mísseis balísticos do Iêmen, dois ataques em grande escala do Irã em abril e setembro e, em menor grau, ataques da organização libanesa Hezbollah. Os esforços bem-sucedidos do Hezbollah para atingir especificamente os ativos de defesa antimísseis israelenses pioraram a situação. Essa escassez levou os EUA a desempenhar um papel maior na defesa do território israelense contra ataques de mísseis e, como resultado, as Forças Armadas dos EUA também viram seus arsenais de mísseis antibalísticos sob crescente pressão devido à implantação dos sistemas THAAD e AEGIS da Marinha dos EUA para proteger Israel.
O próprio EUA tem problemas semelhantes. A operação aérea e naval contra as forças iemenitas, realizada pelos Estados Unidos, foi muito débil. Os iemenitas, além de abater duas dúzias de drones e três caças-bombardeiros muito caros atingiram um de novos porta-aviões dos EUA com um míssil, expondo a debilidade destas ultrapassadas plataformas.
Os EUA concentraram seus aviões em bases europeias, especialmente nas da Espanha. Se os árabes não dessem permissão, os aviões terão que decolar de porta-aviões e bases europeias. São 5.000 quilômetros da Espanha ao Irã. Os caças-bombardeiros têm, em média, um alcance de voo de 2.000 quilômetros. Eles teriam que ser reabastecidos no ar, o que atrasa ainda mais sua chegada. Em suma, haveria tudo menos surpresa, uma questão de grande importância em termos militares.
Outra questão é que a hegemonia norte americana está em declínio, com a emergência de novas potências como China, Rússia, e potências regionais como o próprio Irã, Indonésia, Paquistão e África do Sul. Nessa perspectiva, o ataque ao Irã é um ataque à retaguarda estratégica da Rússia e da China. Estes países aparentemente nada fizeram militarmente para ajudar o Irã, o que causou muito mal-estar entre os países emergentes. Em futuros conflitos vai ser difícil para eles ficarem sem enfrentar o imperialismo tardio e seus cães de guarda.
É evidente que o imperialismo está muito mais fraco do que era em 2003, a sociedade americana está muito menos coesa e o Tesouro dos EUA está em uma situação muito mais precária. Embora essa situação não seja ideal, os EUA estão reagindo de forma atabalhoada e não apenas por causa do histrionismo de Trump. O cessar fogo implementado na região reflete também a debilidades da defesa aérea iraniana e o imobilismo de seus aliados. O certo é que nada será como antes.
A agressão que não agrediu
Após o prazo de duas semanas que Trump deu a si mesmo para decidir o ataque que faria ao Irã a pedido de Israel, as Forças militares norte-americanas atacaram as três instalações nucleares iranianas: Fordow, Natanz e Isfahan. O chefe do Estado-Maior, general John Daniel Caine descreveu o ataque como uma ação de bombardeios B-2 que lançaram duas bombas “destruidoras de bunkers”, conhecidas como GBU-57 Massive Artillery Penetrators (MOPs) em Fordow e mais 14 sobre as outras duas zonas-alvo.As MOPs pesam 13,6 toneladas cada uma e tem a capacidade de penetrar 60 metros de profundidade na terra antes de explodir. O objetivo, destruir as instalações nucleares do Irã, localizadas nas profundezas das montanhas não foi atingido porque as instalações nucleares iranianas se situam 80 metros abaixo da superfície da Terra.
A comemoração de Trump e Nethanyahu de que todas as três instalações nucleares foram “completa e totalmente destruídas” demonstrou que não tem nada a haver com a realidade. O Centro Nacional para o Sistema de Segurança Nuclear do Irã confirmou o ataque, mas disse que nenhum sinal de contaminação radioativa ou vazamentos foi detectado durante as inspeções de emergência na instalação afetada, o que foi confirmado pela própria Agência Internacional de Energia Atômica.
Os objetivos de Israel não foram obtidos. Eles eram: (1) destruir o programa nuclear do Irã; (2) promover uma mudança de regime no país; e (3) Obter uma rendição incondicional do Irã.
Um dos motivos desta derrota é o total desconhecimento sobre o que é o Irã de fato. A começar pelo tamanho, com 1.648.195 km², o Irã é 75 vezes maior que Israel , com apenas 22.145 km². O Irã tem 90 milhões de habitantes. Possui algumas das maiores reservas de energia do mundo e inúmeros recursos naturais. Fabrica quase todas as suas armas e é de longe o país mais poderoso do Oriente Médio. Israel tem oito milhões de habitantes, território que deve compartilhar com cinco milhões de palestinos. Carece de recursos naturais e energéticos e a sua defesa depende 90% dos EUA e, em menor grau, dos vassalos europeus.
Mesmo com a ajuda americana, o Irã não pode ser derrotado. Lembre-se de 1991, quando uma coalizão liderada pelos EUA atacou o Iraque com tropas terrestres. Naquela época, cerca de 750.000 pessoas participaram da invasão de um país quatro vezes menor que o Irã e praticamente plano. Não foi possível conquistar todo o Iraque em 1991, apenas metade.
O Irã possui dezenas de milhares de mísseis e centenas de milhares de drones de vários tipos. Lenta mas seguramente, o suprimento de mísseis de defesa aérea, que deveriam proteger importantes instalações israelenses, estava se esgotando. Além disso, o Irã, junto com a China e a Rússia, são os únicos países que possuem mísseis hipersônicos contra os quais não há antídoto no arsenal ocidental.
O Irã está sob sanções há 45 anos, e a sobrevivência desse estado multiétnico se deve a um povo que certamente não se impressiona com um nazista em Israel e um palhaço em Washington. A visão ingênua e arrogante do Ocidente de que os ataques poderiam levar à derrubada do governo é um absurdo total. Hoje está evidente que esse ataque fortaleceu a unidade dos iranianos.
A guerra contra os BRICS
Está claro que o conflito com o Irã , além de pretender destruir o programa nuclear do Irã, tem a haver com a luta dos EUA contra os BRICS e a integração da Eurásia. Os BRICS, como uma organização econômica do Sul Global, já superam em muito o Ocidente coletivo do G7 economicamente.
A Rússia e a China, em particular, os líderes do BRICS, não ajudaram militarmente o Irã. É provável que esta atitude mude daqui para frente, pois, se o Irã caísse, essa organização ficaria severamente enfraquecida e perderia o ímpeto que construiu nos últimos 20 anos. China e Rússia, como líderes dos BRICS, e Paquistão, como vizinho do Irã e possível membro dos BRICS, farão agora todo o possível para apoiar o Irã.
Israel precisa ser destruído definitivamente
Sem a destruição do Estado terrorista e sionista de Israel, nada estará resolvido. Ele continua a bombardear Gaza e Líbano e certamente voltará a atacar o Irã. É preciso que os seus aliados principais mudem de atitude e passem a defender militarmente de forma explicita o Irã e o BRICS. É ingenuidade achar que Israel vai deixar de agredir todos os países da Asia Ocidental somente porque perdeu esta batalha. O imperialismo, sob Trump, acabou se tornando temporariamente impotente para fazer uma ofensiva real contra o Irã, mas não abandou seus planos de domínio unilateral global. É preciso obrigar Israel a abandonar o genocídio em Gaza e fazer com que surja um Estado palestino para debilitar ainda mais o Estado israelense. É preciso combinar as mobilizações de massa com a imposição de rompimentos diplomáticos e econômicos cada vez maiores a Israel. Somente assim a vitória do Irã e dos povos sobre o imperialismo poderá ser efetiva.