
Vitimização para Enriquecimento da Família Capachonaro
por Fernando Nogueira da Costa
Era uma vez, no reino tropical da República dos Trambiqueiros, uma conspiração digna de novela da Record. A familícia, rebatizada pelo povo infiel (e descrente) de Capachonaro, juntou-se ao televangelista de plantão, pastor Malafé, para tentar usar o tarifaço do Imperador Donald como arma de chantagem contra o Supremo e o Congresso.
Qual foi a “brilhante” estratégia? Forçar uma anistia geral para os golpistas, garantindo assim passe livre para novos ensaios de quartelada — e a ressurreição eleitoral do Messias já em 2026.
O detalhe pitoresco é nenhum deles ali ter dado a mínima para os prejuízos ao agronegócio, justamente uma base inculta sempre capaz de acreditar nas promessas de “Deus-Donald, Pátria-Americana e Família-Capachonaro” salvarem o Brasil. Para os conspiradores, se o boi engordado permanecer no pasto e a soja encalhar no armazém do porto sem exportação, pouco importa: o essencial é o STF sentir a pressão imperial e o Congresso se ajoelhar diante da “fé patriótica” do clã.
As mensagens reveladas pela PF são dignas de antologia do escárnio: Bananinha xingando o próprio pai e mandando-o VTNC, Malafé repreendendo “o babaca” como quem ralha com um fedelho desobediente, e Messias fingindo parecer estadista enquanto implorava para pouparem o Gilmar de ataques. Foi um pedido tão comovente quanto tardio.
Finalmente, depois de oito anos de aliança entre o neoliberalismo e o capachonarismo, é publicado um editorial da Folha de S.Paulo. Com a fleuma de quem descobre o leite derramado estar já azedo, o jornal declara em tom grave: “As mensagens expõem a crueza e a farsa dos Bolsonaros.”
Bravo! O problema é o diagnóstico ter chegado depois de anos de cumplicidade editorial com a farsa. Tratava o clã apenas como “radical de direita” e não como o sempre pretendido pelos oportunistas da “política profissional”: um projeto golpista persistente até ficarem milionários com Pix de donativos.
No fim, a cena é tragicômica: Capachonaro pai vislumbrando o cárcere, Bananinha tentando puxar o tapete do governador de direita, para virar herdeiro político, Malafé pregando aos berros e palavrões a desobediência civil, e o Imperador Donald, de camarote, impondo tarifas como se fossem indulgências de santa cruzada.
Moral da ópera bufa: o clã Capachonaro não defende nem Deus (só Donald), nem Pátria (só a americana), nem Família (só a própria), nem muito menos o agronegócio. Defende apenas o direito de repetir golpes.
Tardiamente, perdeu a bênção da Folha neoliberal, isto sem falar em Estadão e O Globo/Valor, diante a ameaça à soberania nacional e aos negócios dos exportadores. Só agora, em editoriais cabisbaixos, reconhecem a farsa da história prolongada pela mesma “grande (sic) imprensa” antipetista.
Senhoras e senhores, preparem-se: a vida financeira de Messias Capachonaro não é cinebiografia à americana, é novela brasileira com toques de lavagem de dinheiro e sermão neopentecostal. Intitula-se Novela do PIX Milionário.
Entre março de 2023 e junho de 2025, o “mito perseguido” recebeu a bagatela de R$ 44,3 milhões em suas contas. O pobre-coitado protagonista da farsa do “vitimismo” dizia viver apenas de pão com leite condensado, em seu condomínio de luxo em frente à praia da Barra da Tijuca, próximo do hotel Windsor…
O milagre da multiplicação não aconteceu com pães e peixes, mas com PIX de R$ 15,00 em média. Foram 1.214.254 lançamentos, somando R$ 19,3 milhões em apenas um ano. O fiel achava estar doando para pagar multa ou advogado — e parcialmente estavam, porque só os causídicos do Messias abocanharam R$ 6,8 milhões…
Enquanto isso, o PL, partido usado como a grande fonte de sustento, contribuiu com o “mero trocado” de R$ 291,7 mil. Em outros termos, os seguidores do uotzap foram mais generosos diante a legenda milionária, recebedora de Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos. VTNC, Valdemar!
No Ano da Graça (2023–2024), Capachonaro movimentou mais de R$ 30,5 milhões em créditos e R$ 30,5 milhões em débitos. Tudo certinho, um passivo entra e sai ativo digno de feira livre. Porém, segundo a PF, havia indícios de “operações suspeitas” — eufemismo técnico para lavagem de dinheiro.
Nada mais cristão senão dividir o pão com leite-condensado, ou melhor, os milhões do Pix. As transferências na famílicia rezam o Evangelho Segundo o Pix.
Em 13 de maio de 2025, Jair repassou R$ 2 milhões ao filho Bananinha, já curtindo a boa-vida de lobista nos EUA. Antes disso, em março e abril, tinha enviado mesadas de R$ 30 mil e R$ 40 mil para o mesmo herdeiro. Talvez por isso recebeu o singelo e educado xingamento de VTNC…
E, para fechar com chave de ouro, no dia 4 de junho de 2025, um dia antes de depor, Capachonaro transferiu R$ 2 milhões para Micheque — um simples gesto espontâneo de amor conjugal ou apenas prevenção contra o esperado bloqueio judicial? A PF acha ter sido a segunda opção.
Em meio a tanto PIX, Capachonaro ainda arrumou tempo para atuar de cambista, movimentando R$ 105.905,54 em operações de câmbio, mesmo estando com passaporte retido, para vazar para a Argentina do aliado Milei. O golpista milionário em dólares se apresenta como “perseguido político”!
Um documento de 33 páginas, relacionado a um pedido de asilo político dele e direcionado a Milei, só faltava data e assinatura. A Polícia Federal reproduziu trechos do texto, escrito em primeira pessoa. Na introdução, diz: “De início, devo dizer que sou, em meu país de origem, perseguido por motivos e por delitos essencialmente políticos” [a tentativa de um golpezinho acompanhada de apenas três assassinatos].
Assim se escreve a “via crucis” do ex-capitão, expulso do Exército brasileiro também por conspiração. Em 1987, Capachonaro esteve próximo de uma prisão, mas se salvou. A revista “Veja” revelou um plano de explodir bombas em quartéis e outras unidades militares como reação aos reajustes, anunciados pelo primeiro governo após a ditadura, e para desestabilizar o ministro do Exército.
O pobre-coitado negou a participação no plano, chamado de “Beco sem saída”, mas a revista informou o rascunho do plano ter sido escrito à mão pelo então capitão do Exército. Após investigação, foi julgado por uma comissão do Exército, tendo ela decidido a favor de sua expulsão.
Hoje, esse santo homem vitimizado sobrevive não de multiplicação de pães, mas da multiplicação de pixinhos de 15 reais de pobres crentes. Juntos, equivalem à uma mansão de milhões de dólares para ser um pobre vizinho do magnata Donald do setor imobiliário (e do Trump Memecoin), no Mar-a-Lago, em Palm Beach, na Flórida, clube privado exclusivo neste bolsão de milionários do sul da Flórida. O presidente da Argentina, Javier Milei, e o bananinha estiveram no local em uma reunião da organização conservadora CPAC.
Enquanto o povo crente (e ainda fiel ao Malafé) acreditava em estar ajudando o mártir injustiçado, o visto foi a montagem de um caixa milionário para pagar advogados, sustentar campanhas golpistas e abastecer a conta da Micheque, a santa do Pix, casada com o Messias vitimizado. Coitadinho…
No fim, resta a moral da fábula: quem doa com fé, paga só em parte boleto de advogado do golpista. Quem recebe com pixinho, lava a alma e talvez os milhões em paraíso fiscal.
Fernando Nogueira da Costa – Professor Titular do IE-UNICAMP. Baixe seus livros digitais em “Obras (Quase) Completas”: http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/ E-mail: [email protected].
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