Crucifixo dependurado em uma sala de aula. Foto: Tony Gentile / Reuters

Pelo menos 13 capitais brasileiras registram projetos de lei que propõem o uso da Bíblia como material de apoio em salas de aula ou sua inclusão nas bibliotecas de escolas públicas e privadas. As propostas, defendidas por vereadores ligados a grupos religiosos, também incluem a criação de “intervalos bíblicos” com momentos de oração e louvor durante o recreio. Especialistas ouvidos pelo UOL apontam que essas iniciativas violam a Constituição e a legislação educacional vigente.

Em Belo Horizonte, a Câmara Municipal aprovou no mês passado um projeto que libera o uso da Bíblia como material complementar. A vereadora Flávia Borja (DC), autora da proposta, defende que não há violação à laicidade do Estado, pois a participação dos alunos seria voluntária. A proposta aguarda sanção do prefeito Álvaro Damião (União). Em capitais como São Paulo, São Luís e Salvador, projetos semelhantes estão em tramitação, com foco na realização de cultos ou espaços de meditação nas escolas.

A justificativa dos parlamentares gira em torno da liberdade religiosa e da busca por um ambiente mais pacífico nas instituições de ensino. Cézar Leite (PL), vereador de Salvador, afirma que a medida pretende garantir o direito à fé e combater o bullying. Leia Klébia (Podemos), de Goiânia, diz ainda que, mães cristãs já participam de intervalos devocionais em algumas escolas e que a convivência respeitosa deve ser garantida.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996) e a Constituição Federal de 1988 estabelecem os princípios da laicidade e da liberdade de crença, garantindo que as escolas públicas respeitem esses direitos. Apesar das alegações de que o Estado é laico, mas “não proibitivo”, juristas e acadêmicos sustentam que o uso de textos religiosos nas escolas públicas fere princípios constitucionais e pedagógicos.

Aula de ensino religioso em Caxias, na região metropolitana do Rio de Janeiro. Foto: Zô Guimarães

Ângela Sogilo, professora da Unicamp, critica as propostas por não estimularem o pensamento crítico e por basearem-se em dogmas, o que contraria os objetivos da escola pública. Já João Marcelo Borges, consultor da União Europeia, vê nessas iniciativas parte de uma agenda conservadora que inclui a militarização das escolas e o “Escola sem Partido”, voltada ao controle ideológico do ambiente escolar.

A constitucionalidade dessas medidas já foi questionada em outras ocasiões. Em 2021, o STF declarou inconstitucional uma lei de Mato Grosso do Sul que exigia a presença da Bíblia nas escolas. Em outros estados, como Pernambuco e Paraíba, o Ministério Público e o Judiciário também barraram iniciativas semelhantes.

Especialistas reforçam que a presença da Bíblia como material de apoio pode sobrecarregar os professores, que já enfrentam dificuldades com o currículo obrigatório. Borges aponta ainda o risco de que a medida abra caminho para a inclusão do criacionismo no ensino de ciências, o que comprometeria ainda mais a qualidade educacional.

Embora a maioria da população brasileira se declare cristã, especialistas lembram que o Brasil é um Estado laico e que políticas públicas devem respeitar a diversidade religiosa e os fundamentos da educação científica. A tentativa de institucionalizar práticas religiosas nas escolas, mesmo com caráter voluntário, representa, segundo os críticos, um retrocesso democrático e educacional.

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Last Update: 18/05/2025