Venezuela e a Ofensiva Imperialista dos EUA
por Erick Kayser
A retórica do “novo” imperialismo estadunidense volta a assombrar a América Latina, agora sob a forma de uma escalada militar dirigida contra a Venezuela. Washington reedita antigas táticas de pressão, revestidas por uma linguagem moralizante que pretende transformar disputas geopolíticas em cruzadas civilizatórias. Não é a primeira vez, e tampouco será a última, que o governo dos EUA utiliza rótulos infamantes para justificar intervenções: o caso venezuelano é apenas o exemplo mais recente de uma estratégia histórica de construção do inimigo.
A classificação escancaradamente falsa de Nicolás Maduro como “narcoterrorista” revela mais sobre a falência da política externa estadunidense do que sobre a realidade venezuelana. Ao transformar adversários políticos em criminosos internacionais, os EUA buscam pavimentar o terreno discursivo para ações militares e sanções cada vez mais agressivas. É uma técnica antiga: substitui-se a política pela criminalização, o diálogo pela ameaça, a diplomacia pela guerra preventiva. O objetivo não é apenas desestabilizar um governo, mas enfraquecer um projeto regional que ousa afirmar autonomia.
Essa retórica encontra expressão concreta no deslocamento recente de uma frota militar dos EUA para o entorno caribenho, gesto que tensiona de modo perigoso a estabilidade hemisférica. A operação vem acompanhada de uma série de ações que, longe de serem de “segurança”, configuram práticas abertamente ilegais – verdadeiros atos de pirataria e agressão. Entre eles, acumulam-se casos de assassinatos aleatórios cometidos por forças militares norte-americanas, que já vitimaram 84 pessoas, em sua maioria pescadores. É a face mais brutal de um poder que se arroga o direito de policiar mares e fronteiras de outros povos.
O risco de uma desestabilização política ampla é real e profundo. Uma guerra provocada por Washington teria efeitos devastadores não apenas para a Venezuela, mas para toda a região: deslocamentos populacionais, ruptura de cadeias produtivas, fragmentação institucional e o fortalecimento de setores militaristas que se alimentam do caos. Repetir no século XXI o tipo de políticas imperialistas desastrosas, como as que marcaram regiões como o Oriente Médio, seria um crime histórico contra a América do Sul. Ainda mais quando sabemos que conflitos fabricados raramente trazem qualquer forma de “democracia”, mas sempre ampliam a desigualdade, a violência e a dependência.
É preciso afirmar, com toda a força, que a América do Sul é um continente da paz, não apenas por tradição, mas por projeto. A defesa da soberania regional não pode ser delegada aos governos, isoladamente; ela deve brotar da solidariedade ativa entre os povos, dos movimentos sociais, das organizações populares e das vozes que recusam a naturalização da guerra. Diante da ofensiva imperial que volta a rondar o continente, a escolha histórica é clara: ou permitimos que a lógica da força determine nosso destino, ou renovamos o compromisso com uma integração baseada na autonomia, na justiça e na dignidade comum.
Erick Kayser é Historiador e Secretário-geral do PT de Porto Alegre
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