Receita falsa assinada por médica mineira
Receita falsa assinada por médica mineira – Reprodução/g1

O pediatra João Batista, de 72 anos, foi surpreendido ao receber uma carta do Conselho Regional de Medicina de São Paulo (CRM-SP) questionando a emissão de diversos atestados médicos. Segundo a denúncia, ele teria emitido até nove atestados para a mesma pessoa — alguém que ele afirma nunca ter atendido. “Nunca vi essa pessoa. Nem sei como meus dados foram parar nessas mãos”, relatou. Com informações do G1.

Essa não foi a primeira vez que o médico teve seus dados utilizados ilegalmente. Há seis anos, ele também foi vítima de um esquema de falsificação de atestados médicos, que tem crescido rapidamente com o apoio das redes sociais, especialmente o Telegram.

Diversos médicos brasileiros estão tendo seus nomes, registros (CRMs) e carimbos utilizados em receitas médicas falsas, laudos, atestados e até requisições de exames fraudulentos. Grupos clandestinos no Telegram comercializam esses documentos como se fossem legítimos.

Uma pesquisa inédita do pesquisador Ergon Cugler, do Laboratório DesinfoPop/FGV, revelou que a oferta desse tipo de conteúdo aumentou mais de 20 vezes desde 2018. Em 2025, até julho, os posts de venda de receitas médicas e atestados falsificados já acumularam quase 500 mil visualizações no Brasil. Mais de 27 mil usuários participam ativamente dessas comunidades ilegais.

Bots e marketplaces impulsionam o crime digital

O comércio de documentos médicos falsificados no Telegram não é mais artesanal. Os grupos utilizam bots automatizados, marketplaces organizados e perfis falsos para agilizar vendas e evitar rastreamento. Os pagamentos são feitos rapidamente, e os arquivos são enviados de forma quase imediata.

Foram identificados vendedores que oferecem três tipos de receitas falsas no Telegram:

  • Receitas brancas: para medicamentos comuns.
  • Receitas azuis: exigidas para psicotrópicos.
  • Receitas amarelas: usadas para entorpecentes.

Todas são disponibilizadas com carimbos e dados de médicos reais, com instruções para uso seguro e discreto. Os golpistas recomendam evitar grandes redes de farmácias e dar preferência a drogarias menores.

Grupos no Telegram
Grupos no Telegram – Reprodução/g1

Além de receitas, os criminosos vendem atestados médicos falsificados com:

  • Número de dias de afastamento à escolha do comprador;
  • Definição do CID (Classificação Internacional de Doenças);
  • Recomendações médicas personalizadas.

Muitos desses documentos são assinados com o nome e CRM de médicos reais, sem que esses profissionais tenham qualquer envolvimento.

Os grupos também comercializam medicamentos de venda controlada, como:

  • Remédios tarja preta (benzodiazepínicos, opioides e drogas Z);
  • Abortivos ilegais;
  • Inibidores de apetite, como as populares canetas emagrecedoras.

Esses produtos são vendidos sem exigência de receita médica, violando a legislação sanitária.

Outras redes também são usadas: Google, Meta, TikTok e X

Apesar de o Telegram concentrar a maioria dessas transações ilegais, outras plataformas como Google, Facebook, Instagram, TikTok e X também abrigam esse tipo de conteúdo.

A investigação encontrou até anúncios pagos de documentos falsos rodando nas plataformas do Google e da Meta, indicando falhas graves na moderação de conteúdo. No TikTok, vídeos explicam como adquirir receitas falsas; no X, há “cardápios” com opções de laudos, receitas e atestados disponíveis para compra.

O levantamento de dados foi feito com a ferramenta TelegramScrap, desenvolvida por Ergon Cugler e disponível no repositório da Universidade de Cornell, nos EUA. A tecnologia já foi usada por autoridades italianas e pesquisadores para rastrear células extremistas online e esquemas de fraude digital.

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 16/08/2025