Camilo Santana e o “neonovo” ensino médio
O governo que não aprende com os erros do passado.
Uma das heranças más do governo Lula foi o mal denominado “novo ensino médio”.
Agora, o governo perdeu mais uma oportunidade de se livrar disso.
Diante da oportunidade aberta pelo Senado, o governo preferiu a pior saída, contribuindo para a derrota da educação, na votação realizada na Câmara dos Deputados.
O líder do governo, deputado José Guimarães, e o ministro da Educação, Camilo Santana, têm especial responsabilidade.
Particularmente espantosas são as postagens divulgadas pelo ministro, logo após a votação.
Atribuir o resultado ao “diálogo respeitoso” revela, na melhor das hipóteses, um total alheamento em relação aos fatos.
Ao contrário do que sugere o ministro, o que foi aprovado não contribui para a construção de um ensino médio de qualidade.
Que o ministro não se dê conta disto e comemore o resultado, revela não apenas cretinismo parlamentar e governamental, como também confirma o quanto ele foi ganho para concepções antagônicas às que o PT sempre defendeu.
Mais uma vez, repetimos: ou muda a linha política do governo, ou mais e piores derrotas virão pela frente.
Mais uma vez, os privatistas impõem gravíssima derrota à educação pública
Resistiremos!
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – CNTE
As pessoas que defendem a educação pública de qualidade, a democracia, a integração regional com os países de língua espanhola e que apostavam nas correções que o Senado Federal havia feito no primeiro substitutivo da Câmara dos Deputados ao PL nº 5.230/2023, que trata da reformulação do Ensino Médio, viveram ontem um misto de horror, raiva e decepção com a certeza de que o País está longe de encontrar a rota definitiva para a inclusão social de seu povo, com dignidade.
Em meio a atropelos regimentais nos processos de votação, propositalmente conduzidos pelo presidente da Casa, dep. Arthur Lira (PP/AL), a Câmara dos Deputados aprovou ontem o parecer do relator Mendonça Filho (União/PE) – ex-ministro da Educação e coautor da medida provisória nº 746/2016, que deu origem a nefasta reforma do Novo Ensino Médio (NEM) no governo do golpista Michel Temer.
O Orientou favoravelmente à aprovação do Parecer, o líder do Governo na Casa, dep. José Guimarães (PT/CE), que disse ter defendido o acordo entre o Governo, o relator e a oposição, firmado durante a primeira tramitação da matéria na Câmara, em março último.
Ocorre, no entanto, que o segundo momento de debates e ajustes no texto da reformulação do NEM se deu no Senado, onde a sociedade civil teve acesso ao diálogo e conseguiu corrigir parte das incoerências aprovadas no substitutivo da Câmara.
E mesmo mantendo princípios da Lei nº 13.415/2017, o texto do Senado revertia uma parte importante dos prejuízos remanescentes no NEM, especialmente nos itinerários formativos e em particular na formação técnica-profissional.
As alterações no substitutivo original da Câmara, feitas pelo Senado, contaram com a participação do Ministério da Educação, à luz do processo democrático que rege os acordos políticos no Poder Legislativo.
Neste sentido, esperava-se do Governo maior empenho para concretizar esses acordos, mesmo com as contingências que, sabidamente, ele possui para aprovar matérias de seu interesse na Câmara dos Deputados. Mas não foi o que aconteceu!
Dias após a aprovação do projeto no Senado, o líder do Governo na Câmara fez coro às ameaças do relator Mendonça Filho para rejeitar o substitutivo oriundo da Casa revisora, o que acabou se concretizando na votação de ontem.
Apesar das limitações no Congresso Nacional, não há como eximir o Governo de mais esse triste episódio para a educação brasileira.
Não se trata apenas do silêncio do MEC durante todo o dia de ontem, ou da manifestação desarrazoada do ministro Camilo Santana comemorando o texto da Câmara nas redes sociais, sem qualquer menção aos avanços que ajudou a produzir no Senado.
O Centrão e o setor privado derrotaram a educação pública, sem oposição do Governo, e com o MEC negociando com o relator a derrota do texto do Senado (total incoerência!).
O parecer final de Mendonça Filho, que vai a sanção presidencial, contemplou apenas emendas de redação do Senado.
O núcleo da reforma de 2017 está mantido, com alguns avanços, entre os quais, destacam-se:
(i) a recomposição da carga horária de 2.400 horas para a formação geral básica – FGB (exceto no itinerário da formação técnica-profissional);
(ii) a reintrodução curricular das demais disciplinas da BNCC na FGB (acabando com a obrigatoriedade apenas de Português e Matemática);
(iii) a regulamentação nacional dos itinerários através de diretrizes do Conselho Nacional de Educação;
(iv) a oferta de ao menos dois itinerários por escola, os quais também devem observar os conteúdos da BNCC; e
(v) a vinculação do itinerário técnico profissional ao Catálogo Nacional de Cursos Técnicos e às diretrizes curriculares do CNE.
Outras questões de relevância foram ignoradas e, mais preocupante, o eixo privatista do NEM se mantém inabalável e aderente às perspectivas do Novo Arcabouço Fiscal, que tem ameaçado a vinculação constitucional de recursos para a educação e a saúde e da qual a sociedade não abrirá mão!
O apetite do setor privado sobre o FUNDEB não cessará e a disposição dos governos em se desvencilhar do compromisso da oferta pública escolar poderá precipitar novas alterações na Lei nº 14.113/2020.
Atualmente, outras rubricas orçamentárias são destinadas para as parcerias educacionais com o setor privado, e a expansão do itinerário técnico-profissional do Ensino Médio tende a acelerar o processo de privatização da escola pública, com todas as consequências já conhecidas.
A CNTE e seus sindicatos filiados continuarão lutando contra o desmonte da escola pública, forjado na reforma educacional de 2017, a qual, infelizmente, nem o processo de consulta pública do MEC sobre o NEM, tampouco a tímida ação governamental na votação de ontem na Câmara dos Deputados conseguiram reverter neste momento.
Brasília, 10 de julho de 2024
Diretoria da CNTE
*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.