O ex-presidente do Uruguai, Pepe Mujica, concedeu entrevista exclusiva à GloboNews na segunda-feira (25). Horas depois o presidente eleito Yamandú Orsi esteve na chácara onde mora seu mentor político.
Questionado pela repórter Sylvia Colombo sobre o clima eleitoral no país, visto pelos brasileiros com muita tranquilidade, Mujica destacou que apesar do resultado próximo nesta eleição que marcou o retorno da Frente Ampla ao poder com 49,8% dos votos contra 45,9% do candidato governista de centro-direita, Álvaro Delgado, o país não tem uma polarização de forças como em outros da América Latina.
“Temos uma tradição política de respeito mútuo entre as forças políticas. Sei que em outros países não é assim. Restam três de nós, ex-presidentes, ainda vivos, e [somos] de partidos totalmente diferentes. No entanto, nos reunimos e vamos juntos às cerimônias. Isso é impossível em outros países. Seria como colocar Lula com Bolsonaro. Impossível”, disse.
Segundo Mujica, é preciso que as novas lideranças políticas superem as atuais.
“É preciso criar uma geração nova. O melhor dirigente não é aquele que faz mais. É aquele que, quando desaparece, deixa um legado que o supera amplamente. Por quê? Porque as causas permanecem e a vida se vai”, completou.
Na reportagem, o líder histórico do Uruguai foi perguntado sobre o acordo entre o Mercosul e a União Europeia. Para ele é preciso alternativas, e uma delas deve ser a China.
“Estamos preocupados com o progresso do Mercosul. A Europa não vai aceitar o acordo. Lula lutou, mas a oposição da França e da Polônia está fechada. E a França é muito grande na Europa. Os agricultores franceses são os privilegiados nessa história. O plano B é tentar estabelecer melhores relações com a China”, afirmou Mujica, ao lembrar que o atual presidente do seu país, Lacalle Pou, tenta firmar acordos com os asiáticos à parte do Mercosul.
Sobre a relação de animosidade entre os governos de Brasil e Argentina, Mujica disse que observa com atenção, pois é melhor para Uruguai que os laços sejam fortalecidos.
“Para nós é importante que a Argentina e o Brasil colaborem entre si. Quanto melhor estiverem, melhor nós [uruguaios] estaremos. Não é para lavar as mãos. Nós devemos ser um país que faz uma ponte. Não um bloqueio. Temos que tentar chegar a um acordo sobre uma política comum entre nós, não nos dividir. E temos que fazer isso com o Brasil e deixar de lado a rivalidade da Argentina com o Brasil, que já não faz sentido”, explica.
O símbolo da esquerda latino-americana ainda se mostrou atento quanto às notícias brasileiras, inclusive sobre o escândalo revelado de tentativa de golpe de Estado, uma vez que o que acontece por aqui reflete em todo o continente.
“Claro que me preocupa [revelações sobre a tentativa de golpe]. O Brasil é, de longe, o irmão mais velho. O que acontece no Brasil tem repercussão em toda a América. O Brasil está destinado a ser uma grande potência por causa da evolução dos seus recursos, da sua economia, pelo tamanho de sua sociedade, por uma quantidade de coisas. Mas o mundo está muito desequilibrado. O Brasil está chegando muito tarde. A vantagem que tem o mundo central é muito grande. O resto de nós, americanos, precisamos rodear o Brasil e acompanhá-lo. E o Brasil tem que entender isso para a sua própria conveniência e para a nossa conveniência. Porque um dos problemas que nós, latino-americanos, temos é que não nos juntamos para nos defender. E isso é ridículo”, concluiu Mujica.
*Informações GloboNews