Na tarde da última terça-feira (29), a atual vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão, participou da motociata promovida por apoiadores de Jair Bolsonaro no DF. Ao lado de Jair e Michelle Bolsonaro, Celina teve apoio declarado do bolsonarismo para pleitear o governo da capital federal nas eleições de 2026.

Divulgação/Redes Sociais

A manifestação foi contra as medidas cautelares impostas a Bolsonaro, acusado de liderar o plano de golpe que fez parte dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. À época, o governo do Distrito Federal foi substituído pelo interventor temporário, Ricardo Capelli, para que fosse investigada possível participação dos representantes do executivo distrital na trama golpista. Isto porque a circulação da turba neofascista pela capital federal foi facilitada, os acampamentos bolsonaristas foram mantidos e protegidos e não houve contenção dos bolsonaristas pela Polícia Militar do DF na descida até a Praça dos Três Poderes.

Embora tenha sinalizado afinidades com Bolsonaro e o movimento político que ele lidera, Ibaneis Rocha apresentou uma dinâmica particular de alinhamento, evitando, até o momento, expor consonância ideológica absoluta. Celina Leão, por outro lado, não é apenas uma figura próxima do bolsonarismo, como vem se consolidando cada vez mais como a representação da extrema direita no DF.

Além da participação na motociata, Celina Leão é frequentemente vista junto a Michelle Bolsonaro e Damares Alves – por quem estava acompanhada quando do recebimento do título de cidadã honorária de Brasília. Sob a reivindicação da representatividade feminina, com salvaguarda no neopentecostalismo fundamentalista e no conservadorismo misógino, essas figuras despontam como representações do neofascismo na capital do País. A então vice-governadora não representa somente a continuidade do projeto político elitista, higienista, racista, privatizante, de desmonte das políticas públicas garantidoras de direitos fundamentais e antipovo de Ibaneis Rocha, mas também um projeto antidemocrático.

Foto: CLDF

Por isso, a contraposição às aspirações do neofascismo bolsonarista para o Distrito Federal é uma urgência e precisa se dar a partir da unidade do campo progressista, dos partidos de esquerda, dos movimentos sociais e populares em torno do debate de uma alternativa para a cidade. De maneira específica, trata-se também, mais do que nunca, de uma exigência à reorganização dos movimentos de mulheres e feministas no Distrito Federal, unificando os coletivos dirigidos pelas mulheres que realmente representam essa cidade para a denúncia da falsa representatividade das bolsonaristas e, sobretudo, para a formulação de um programa que assegure direitos aos setores mais vulnerabilizados, onde está uma maioria de mulheres, principalmente as mulheres negras.

É necessário que uma frente única de esquerda, de oposição ao projeto Ibaneis-Celina-Bolsonaro, se conforme em torno da chamada à responsabilidade de dirigentes partidários e lideranças populares, inclusive no que diz respeito ao consenso para definição de um nome que vocalize as formulações de um coletivo que, para além de unificado, esteja coeso em suas elaborações para a capital federal.

Há inúmeras avaliações sobre a viabilidade de tal unidade para dar novos rumos ao DF, dentre elas a hipótese de que não há espaço para uma candidatura de esquerda pelo fato de o DF ser uma unidade da federação de direita. Em que pese a expressiva votação em Bolsonaro por parte dos eleitores brasilienses e a eleição de Ibaneis Rocha em primeiro turno em 2022, a caracterização do DF enquanto um estado de direita não é absoluta.

Há singularidades na dinâmica política distrital que merecem destaque: ao mesmo tempo que os representantes contrários ao povo foram reivindicados ou reconduzidos ao poder, o Distrito Federal tem como deputado distrital mais votado Fábio Félix (PSOL) – um jovem negro e gay, que constrói a oposição parlamentar de maneira comprometida e irredutível, sem hesitar em apontar as violências da condução de Ibaneis Rocha e Celina Leão contra a população do DF e apresentar propostas de qualificação das políticas públicas. Da mesma maneira, nas periferias do DF, como em Ceilândia, apesar da votação em Bolsonaro, as perspectivas da juventude e um projeto factível para o povo do Distrito Federal com propostas para a mobilidade urbana, ao antirracismo institucional, à promoção da cultura e para o fortalecimento da educação pública tiveram expressão na eleição de Max Maciel (PSOL) à CLDF.

Somam-se a eles, uma pequena, mas aguerrida bancada de oposição na CLDF, com parlamentares do PT e do PSB, e que vêm colocando em voga enfrentamentos fundamentais ao governo Ibaneis-Celina.

E fora do parlamento, é fundamental ressaltar os inúmeros militantes, grupos, entidades e movimentos sociais e populares que travam batalhas todo os dias, nas mais variadas frentes e lutas que perpassam a vida da população do DF.

Existe espaço na disputa social do DF. É possível dizer que, na política, tudo pode parecer impossível, até que se torne inevitável. Há muito tempo tem sido inevitável não apenas frear, mas substituir o desmonte, o sucateamento e a privatização da saúde no DF; o abandono do Sistema Único de Assistência Social (SUAS); a negligência com as políticas para as mulheres; a corrupção na política de mobilidade urbana; a violência policial; o desemprego e a informalidade; o racismo, nas suas variadas expressões; o cerceamento à produção artístico-cultural; o vazio em torno da promoção da cidadania, que exige fortalecimento da educação pública, empregabilidade, acesso ao lazer, segurança etc.

São os partidos e movimentos de esquerda que têm seus pés firmes nos territórios do Distrito Federal, com autoridade prática e política para debater e sistematizar um programa que responda às necessidades mais urgentes da população e, ainda, cumpra a tarefa de coesionar os setores mais conscientes e progressistas para uma mobilização contínua, que dê cada vez mais vida à política local e transforme a história das representações distritais – deixando no passado a tradição de eleger representantes das elites e protegendo a capital federal dos rompantes da extrema direita. Cabe a nós sermos o cordão sanitário à extrema direita no DF, algo que passa pelo fortalecimento da unidade.

Karine Afonseca é enfermeira sanitarista, servidora pública, presidente da ABEn DF
Lígia Maria é enfermeira sanitarista e servidora pública
Ambas também são colaboradoras da coluna Saúde Pública Resiste, aqui no Esquerda Online

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Last Update: 04/08/2025