Neste domingo, 14 de julho, o periódico O Estado publicou editorial intitulado “Unidos na indecência”. O artigo busca equiparar Lula e Bolsonaro, a partir da aprovação pela Câmara de Deputados do perdão às multas arbitrárias impostas aos partidos pela Justiça Eleitoral, na prática, uma redução do poder inquisitório do judiciário sobre a vida política do nacional.
“A toque de caixa e por ampla maioria, a Câmara dos Deputados aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que perdoa as multas impostas aos partidos políticos pelo descumprimento das cotas de repasse do fundo eleitoral a candidaturas de negros e mulheres. Não se trata de um valor trivial. As multas aplicadas pela Justiça Eleitoral entre 2018 e 2023 foram estimadas em R$ 23 bilhões, mas o valor pode ser ainda maior.”
Ou seja, havia 23 bilhões de reais, uma soma absurda, em multas a partidos por suposto descumprimento, visto que a Justiça Eleitoral inventa “leis” e a aplicação das mesmas é feita de forma autocrática. Um controle evidente do que deveria dizer respeito apenas aos cidadãos brasileiros e suas próprias organizações.
“O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), até fez uma mise-en-scène ao não votar a PEC na semana passada. Não havia acordo com o Senado, e o PT havia manifestado discordância sobre alguns pontos do texto. Lira não queria que o ônus da proposta recaísse apenas sobre os deputados e disse que o texto só seria pautado quando houvesse apoio de todos os partidos e da Casa ao lado.”
Em outras palavras, se antecipando ao apoio da imprensa burguesa pró-imperialista, o presidente da Câmara procurou assegurar uma aliança política para garantir a PEC. Na prática, uma frente em defesa de uma ampliação democrática, ainda que pequena, dos direitos políticos da população, o que poderia ser levado adiante de maneira mais acabada com a revogação dos princípios condenatórios e do poder da Justiça Eleitoral.
As chamadas “cotas de repasse do fundo eleitoral a candidaturas de negros e mulheres”, por exemplo, são uma ingerência aberta no funcionamento dos partidos. Ao invés de realizar uma campanha política para a inclusão de mais setores oprimidos da população na política, pelo contrário, defendem o Estado e os Alexandres do TSE a imposição de normas, ou seja, a restrição da liberdade política de organização no Brasil, pela ampliação do arbítrio judicial.
O texto foi aprovado em primeira e segunda votação na Câmara, com ampla maioria, e seguiu para o Senado. O Estado até cita algumas das medidas democráticas aprovadas:
“Com a PEC, penalidades aplicadas na eleição passada serão perdoadas. A Câmara inovou e criou um ‘Refis’ para os partidos, permitindo que dívidas mais antigas possam ser pagas em até 15 anos, sem cobrança de juros, e as obrigações previdenciárias, em até cinco anos. […]
“Não é só isso. A exemplo de igrejas, partidos e federações passam a ter imunidade tributária, sanções em fase de execução ou já transitadas em julgado serão anuladas.
“Para garantir que o montante de multas não volte a crescer, a PEC facilita a vida dos partidos que descumprem a determinação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de alocar a verba eleitoral e tempo de propaganda eleitoral gratuita de forma proporcional entre candidatos brancos e negros.”
Em sanha repressiva, o Estado busca ainda dar um golpe na praça, apontando que:
“Solenemente ignoradas, mais de 30 entidades manifestaram repúdio ao teor da PEC em nota e a classificaram como uma ‘inaceitável irresponsabilidade’. À exceção do PSOL e do Novo, a maioria dos integrantes das siglas, do PT ao PL, deu aval a essa medida.
Quem seriam tais entidades? Qual o seu teor político concreto? Quem representam de fato? Ninguém sabe. Ora, o PSOL e o NOVO são duas faces, uma à esquerda e outra à direita, de uma política ligada umbilicalmente ao imperialismo. Nesse sentido, a posição de ambos não é um mérito, mas uma condenação à política repressiva propagandeada pelo Estado.
“Trata-se da quarta anistia concedida pelos partidos a si mesmos, mais um episódio a reforçar a necessidade de acabar com o indecente financiamento público para forçar as siglas e suas lideranças a trabalhar, conquistar apoiadores e se sustentar por conta própria.”
Aparentemente democrática, a medida colocada é outro golpe. Com o fim do financiamento público, se enfraqueceria o chamado centrão, ala ligada a setores da burguesia nacional, não necessariamente alinhados ao imperialismo. Na prática, representaria uma ampliação da influência externa sobre a política nacional. Além disso, os pequenos partidos de esquerda também sairiam prejudicados, frente a agremiações da burguesia e do imperialismo, capazes de facilmente repor esses fundos com seu capital próprio. Seria em todos os sentidos uma derrota para o povo brasileiro.