A “luta” contra a extrema direita transformou o esquerdista pequeno-burguês brasileiro no mais radical defensor do Estado capitalista que esmaga o povo e de figuras deploráveis, tais quais o ministro Alexandre de Moraes, cuja indicação ao STF foi “prejudicial à democracia”, segundo a presidenta licenciada do PT Gleisi Hoffmann em 2017. As fantasias mais selvagens dos oportunistas alcançaram o paroxismo com o julgamento-farsa de Bolsonaro, iniciado na terça-feira (10). Em coluna para o Brasil 247, Florestan Fernandes Jr. se dedicou a uma profunda e repulsiva apologia ao “careca” do STF:
“[…] O líder da extrema-direita bolsonarista finalmente ficou frente a frente com Alexandre de Moraes, o homem que nos quatro anos do governo Bolsonaro enfrentou a fúria do núcleo duro do governo fascista e sua horda de fanatizados.
Senhor de todo o processo de investigação e ministro relator do processo, Alexandre de Moraes surpreendeu a todos pela maneira cordata e até bem-humorada como conduziu os questionamentos ao ex-presidente e seus sete colaboradores, acusados de terem participado do planejamento da tentativa golpista.”
Florestan Jr. prossegue com uma crítica delirante aos militares julgados:
“Acompanhando o chefe, os generais Augusto Heleno, Braga Netto, Paulo Sérgio Nogueira e o almirante Almir Garnier se acovardaram ao vivo, diante das câmeras da TV Justiça. Nenhum deles teve coragem de assumir a tentativa de golpe. Ou seja, o que estava em jogo para os golpistas ouvidos ontem não era a defesa de uma convicção político- ideológica, mas única e tão somente dos interesses mesquinhos de se manterem no poder a qualquer custo.”
Os réus estariam cometendo um grande crime em não se declararem culpados. Ou seja, o colunista sabe que se trata de julgamentos-farsa, que os réus, ou pelo menos parte deles, serão declarados culpados. Seu grande crime, para Florestan Jr., seria não participarem diretamente na farsa, não se levarem à cadeia pelas próprias mãos.
O esquerdista enlouquecido se transformou no maior defensor do mais anti-democrático poder no regime político brasileiro, o Judiciário. Florestan Jr. busca, então, apoiar sua posição profundamente reacionária num revisionismo histórico absurdo:
“A história mostra que a Justiça é a primeira vítima dos autocratas. Destruí-la é questão primordial para a implantação de um estado ditatorial.”
Não é verdade. Para se ater a exemplos nacionais, o golpe semi-fascista, que levou ao Estado Novo, não vitimou um sistema judiciário, célebre é o caso da extradição de Olga Benário à Alemanha Nazista, enquanto ela carregava em seu ventre filha de Luis Carlos Prestes, um brasileiro.
O mesmo pode ser dito do golpe militar de 64, o único dos três poderes que não sofreu com os militares foi o judiciário. Finalmente, o golpe de 2016, que derrubou a presidente Dilma, foi feito “com Supremo, com tudo”. Ele conclui:
“O Brasil está no momento mais crítico de sua história recente. A extrema-direita perdeu a primeira batalha, mas não perdeu a guerra. E nesse combate pelos ideais democráticos, o avanço do julgamento dos golpistas, com a garantia do contraditório e da ampla defesa aos réus – como temos visto – é de imenso valor. Que estejamos todos, sociedade civil, instituições, eu e você, como patriotas que somos, atentos e dispostos a proteger o país e nossa democracia.”
De fato, o Brasil está no momento mais crítico de sua história recente. De fato, em certo sentido, o combate é “democrático”. O problema é que Florestan Fernandes Jr. e demais defensores de Moraes estão jogando “pelo outro time”.
Para defender o “Estado democrático de direito”, estão militando ativamente pela destruição dos direitos democráticos do povo brasileiro. Para “combater a extrema-direita”, estão defendendo poderes especiais a uma corte, que não responde ao povo. Para “defender a democracia”, criaram uma ditadura.
Não é possível se enganar. O fechamento do regime político brasileiro já ultrapassa – e muito – o “combate à extrema-direita”, ou seria a perseguição sistemática aos defensores dos palestinos no Brasil uma frente de combate ao fascismo?
O mais chocante é o fato de este não ser um processo inédito. Como Trótski demonstrou de maneira cabal em seus escritos sobre a ascensão do nazismo na Alemanha, o fechamento do regime político para impedir o fascismo de tomar o poder só faz, na verdade, criar os mecanismos político-judiciais para que, quando o grande capital decidir ser o momento do fascismo, o seu governo seja o mais forte possível.
Ao abdicar à luta política contra a extrema direita e transformá-la em um problema judicial, de “cadeia”, além de criar mecanismos que fortalecem o campo, a esquerda pequeno-burguesa está deseducando as massas operárias, levando-as à ilusão de que seus problemas serão resolvidos pelo seu maior inimigo: o Estado capitalista. A receita perfeita para a desmoralização do campo e para derrotas catastróficas da classe operária, que deve rejeitar orientações desorientadoras do gênero e, longe de estimulada a confiar em seus inimigos, deve ser estimulada a lutar com as próprias forças.