As atuações infantis, quando muito boas, tendem a conduzir os espectadores a um lugar de encantamento, no qual as eventuais fragilidades do filme tendem a importar menos do que a grandeza da performance.
E é esse o caso de Meu Verão com Gloria, que abriu a Semana da Crítica do Festival de Cannes, em 2023, passou pelo Festival do Rio nesse mesmo ano, e só agora é lançado nos cinemas brasileiros.
Segundo longa-metragem da diretora e roteirista francesa Marie Amachoukeli, o filme, em cartaz desde a quinta-feira 20, traz à frente do elenco a menina Louise Mauroy-Panzani, que dá vida a Cleo.
A criança, no início da trama, é vista numa rotina leve e agradável em Paris, cuidada pela babá, Gloria – vivida pela também ótima Ilça Moreno Zego.
A ausência materna e a presença fugaz do pai da menina tornam-se logo evidentes. Cleo não parece, porém, ressentir-se mais profundamente desses vazios.
É apenas quando Gloria, ao saber da morte da mãe e da gravidez da própria filha, pede demissão do emprego para voltar para Cabo Verde que o sentimento de orfandade da menina vem à tona.
O pai, sensibilizado pelo que vê, promete à criança deixá-la passar as férias em Cabo Verde.
E é partir daí que a trama passa a abarcar outros temas, como a imigração da população negra, os lugares de afeto de uma mulher que é remunerada para cuidar da criança de outra família; e a vida em Cabo Verde.
Marie Amachoukeli conta essa história de forma simples, ao longo de breves 84 minutos, e com um tom que se aproxima da fábula – sublinhado pela presença de animações de desenhos coloridos, feitos à mão, que buscam nos aproximar do mundo como uma criança o vê.
Essa abordagem acaba por justificar o olhar um tanto simplista do filme sobre as relações entre patrões e empregados e até mesmo a tornar mais verossímil a viagem da menina, sozinha, para outro continente.
Nada é, porém, tão definidor para a identificação do espectador com a história quanto Louise Mauroy-Panzani, com seus olhos cheios de dúvida, medo e esperança, recobertos pelos óculos que moldam sua expressão.
A própria atuação de Ilça Moreno Zego, também estreante no longa-metragem, parece, em parte, derivar do carinho que emana da criança. •
Publicado na edição n° 1350 de CartaCapital, em 26 de fevereiro de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Um filme para uma pequena atriz’