O artigo “Corrida armamentista da União Europeia mira a Rússia e ignora colonialismo de Trump”, publicada nesta quarta-feira (7), no jornal O Vermelho, tenta fazer uma análise da atual política armamentista que se instalou na Europa.
A esquerda, de modo geral, tem tido dificuldade em analisar os acontecimentos políticos, e isso se dá porque não utiliza o materialismo histórico como método de análise. Sem observar a luta de classes é impossível entender a realidade, ou mesmo atuar apropriadamente na defesa dos interesses da classe trabalhadora.
No texto, observamos que, por momentos, há acertos, mas logo vão na direção oposta. É verdade que “a decisão de rearmar a Europa adotada na cúpula extraordinária do Conselho Europeu, que reúne chefes de Estado e de Governo dos 27 Estados-membros da União Europeia (UE), realizada em Bruxelas, é um enfático sinal de perigo para o mundo. Seria uma resposta à política externa do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump”. E neste ponto seria necessário dizer o porquê dessa nova política externa, quais são as forças sociais que estão por trás das decisões.
No segundo parágrafo está bem explicitado que as somas para o rearmamento europeu são astronômicas, “cerca de 800 bilhões de euros – incluindo 150 bilhões em empréstimos aos Estados-membros – para reforçar a defesa do continente. Implica inclusive em aceleração do desmonte do Estado de bem-estar social, uma política de guerra que chega à flexibilização do formato fiscal da União Europeia, tido como sagrado pela ‘austeridade’ do projeto neoliberal”.
Quando se anuncia gastos severos em detrimento dos gastos sociais é necessário explicar que isso só pode ser alcançado com a implementação de ditaduras brutais, golpes de Estado, como vimos na Romênia, censura das redes, prisão de pessoas pelo crime de opinião, por se manifestarem etc. Olhando por esse ângulo, fica claro que a política de “democracia x fascismo” não passa de uma mentira, que só serve para enganar desavisados e os setores pequeno-burgueses da esquerda.
A Europa já caminha nesse sentido, vimos a repressão violenta de manifestações contra o massacre do povo palestino, pessoas presas por postarem mensagens nas redes sociais etc. Para piorar, isso tem sido feito com a conivência da esquerda que comprou a conversa fiada de que se está combatendo o discurso de ódio e as notícias falsas.
O “discurso de ódio” contra os russos esteve liberado desde sempre, e a grande imprensa continua publicando alucinadamente, como sempre, notícias falsas e distorcendo a verdade. Um exemplo típico é tratamento que dão ao Hamas, chamando o grupo de terrorista, quando, na verdade, apenas lutam contra o Estado colonialista israelense, que por décadas tem massacrado o povo palestino, expulsando e roubando suas terras.
Quem é belicista?
Segundo o artigo, com essa montanha de dinheiro que a UE pretende gastar, “os Estados-membros poderão aumentar substancialmente a sua ajuda à Ucrânia”. Com isso, fica claro que, ao contrário de Donald Trump, não querem que a guerra termine. Como desculpa, “os líderes da UE sublinham que não pode haver negociações sobre a Ucrânia sem a Ucrânia e prometeram continuar a prestar ajuda à guerra”.
Em outro parágrafo, o artigo diz que “A decisão [de Trump] reforça a corrida armamentista mundial puxada pelos Estados Unidos, com gastos militares globais que em 2024 chegaram ao recorde de 2.46 trilhões de dólares em 2024, um aumento de 7,4%, conforme dados do MIlitary Balance, estudo anual do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos”. Mas quem estava no governo dos Estados Unidos em 2024? Não disseram, mas era Joe Biden.
A divisão na burguesia norte-americana
No texto lemos que “A alegada ameaça russa pela UE, na verdade, é pretexto diante da crise do capitalismo que atinge fortemente o epicentro do imperialismo, os Estados Unidos, impossibilitados de manter os gastos militares na Europa”. É verdade, os EUA estão na lona, o país gastou apenas no Iraque cerca de US$ 300 milhões/dia. Somando os outros gastos com Afeganistão, manutenção de bases etc., os gastos ficaram na ordem de US$ 866 milhões/dia. Com isso, a dívida pública americana já ultrapassou o PIB em 122,3%. Os juros da dívida pública já batem US$ 1,3 tri. Todo esse dinheiro é drenado pelo capital financeiro, o que tem feito o grande capital doméstico americano se arruinar, e é esse o setor de Trump representa.
Neste momento, Trump e o imperialismo estão em contradição. Enquanto não resolve sua crise com o governo americano, o grande capital financeiro faz com que a Europa continue sua política de guerras.
Em vez de se guiar pelo que tem sido feito, boa parte da esquerda se deixa levar e começa a gritar por tudo o que Trump diga. Por exemplo, de “tomar posse da Faixa de Gaza e retirar de lá todos os palestinos, tomar a Groenlândia – território autônomo do Reino da Dinamarca –, ‘de um jeito ou de outro’”. Quando perguntado quantos soldados mandaria para Gaza, o presidente americano disse que não mandaria nenhum.
Como prova da confusão na análise, o artigo afirma que “Trump passa por cima de cláusulas constituintes da Otan para ressuscitar o velho colonialismo com ameaças de rapinagens via guerra comercial, tecnológica e tarifária – e, se preciso, militar –, tornando o mundo mais instável e conturbado, com o falso argumento de que pretende acabar com as guerras”.
Para começar, o argumento de acabar com as guerras não é falso, pois guerras apenas fortalecem a ala inimiga de Trump e do setor social que ele representa. Por outro lado, se atual presidente ameaça rapinagens via guerra, estas vêm ocorrendo há décadas, basta ver como o imperialismo vem agindo no continente africano, no Oriente Médio, para ficarmos em dois exemplos. Se tivéssemos que escolher entre alguém que ameaça e outro que vem paticando violência, qual seria o pior?
A UE não é inocente
Em um determinado trecho do artigo nos deparamos com a afirmação de que a União Europeia “deixou-se arrastar para a guerra da Ucrânia, puxada pela Otan”. E que essa política “penalizou sobretudo as economias da Alemanha e da França”. Ocorre que esses países estão entre os mais importantes do imperialismo. Ainda que os Estados Unidos governem com mão de ferro o bloco imperialista, todos os interesses encontram uma base comum. A comprovação de que não houve nenhum “deixou-se arrastar”, é que a União Europeia está trabalhando no sentido de continuar a guerra após o recuo do governo Trump.
É devido essa análise falha que o texto vem e afirma que “aumentam as contradições inter-imperialistas”. As contradições não estão dentro do imperialismo, mas entre o grande capital de setores produtivos americanos e o grande capital financeiro internacional.
A leitura correta dos acontecimentos nos leva à conclusão lógica de que o inimigo imediato da classe trabalhadora não é o fascismo, mas a “democracia” imperialista, que está se armando até os dentes e se prepara para uma guerra contra a Rússia, China e Irã, países que a esquerda pequeno-burguesa obediente costuma chamar de imperialistas, ditaduras ou fundamentalistas