A execução do empresário Vinícius Gritzbach, delator de esquemas da facção criminosa paulista Primeiro Comando da Capital (PCC), expôs o envolvimento de agentes importantes do estado de São Paulo em esquemas ligados ao crime organizado. Caso semelhante ocorreu a partir da morte da vereadora Marielle Franco, que revelou a associação entre políticos, milicianos e criminosos no Rio de Janeiro. A reflexão foi colocada em pauta pelo pesquisador e também jornalista, Bruno Paes Manso, na TVGGN 20H desta quinta-feira (24). [Assista ao programa na íntegra no final da matéria]
“Eu costumo comparar o caso Gritzbach com a morte da Marielle, porque quando aconteceu a morte da Marielle a gente destampa um caldeirão de 10 anos no Rio de Janeiro que não conhecíamos e que tinha, principalmente, uma relação de jogo do bicho, com as milícias e a política, com matadores especializados que corromperam inclusive a investigação dos homicídios, uma vez que há 10 anos já aconteciam assassinatos impunes lá na região. O caso Gritzbach mostra isso também e, além de matadores especializados, tinham pessoas da própria delegacia de homicídios, do DEIC e tudo mais, extorquindo e ganhando dinheiro para preservar a impunidade de pessoas que estavam envolvidas nesses conflitos”, explica Paes Manso, que é autor do livro “A fé e o fuzil: Crime e religião no Brasil do século XXI”.
Gritzbach foi assassinado em pleno Aeroporto de Guarulhos, oito dias após revelar à Corregedoria da Polícia Militar paulista nomes da própria corporação e da Polícia Civil envolvidos em um esquema de venda de assassinatos e suborno para ocultar acusações ligadas ao PCC. Após ameaças de intervenção da Polícia Federal (PF) nas investigações do caso, a própria PM e a Civil passaram a agir. Até o momento, segundo a Secretária de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP), 26 pessoas foram detidas por envolvimento no caso, incluindo 17 policiais militares e cinco policiais civis.
Paes Manso pondera que toda essa atuação criminosa das coorporações de segurança pública, que vendem mortes e negociam impunidade, é apenas parte da gestão horizontal estruturada pelo PCC ao longo dos últimos 10 anos e que fatura mais de US$ 1 bilhão por ano com tráfico de drogas.
“Nós estamos tentando entender um crime com grande capacidade de ganhar dinheiro e de lavar dinheiro, de corromper agentes públicos. De um lado uma Polícia Militar oferecendo serviços de proteção e de assassinato a essas pessoas, e de um outro lado uma Polícia Civil estorquindo muitos agentes para não puni-los em casos envolvendo muito dinheiro (…) É uma relação que gera muito dinheiro e que leva a parcerias de uma facção – muito endinheirada – com grupos da Polícia Militar e da Polícia Civil de formas distintas, cada um com um papel nessa cena”, diz.
“A violência policial quase sempre chega junto com a corrupção policial, porque cada carta branca para matar dá um poder ao policial que é a venda da vida e a morte na cena do crime. Esse é um serviço muito valioso, porque esse agente vai ser visto como alguém que pode matar e que vai seguir impune e que vai atuar para beneficiar ‘A’ ou ‘B’ na cena criminal. É o que estamos vendo acontecer aqui em São Paulo e já tinha acontecido em outros períodos e em outra dimensão. A relação da polícia com o crime sempre foi uma constante, mas essa dimensão e o volume de dinheiro torna a situação mais preocupante”, acrescenta.
Problema é estrutural
Paes Manso ressalta ainda que esse é um imbróglio de ordem estrutural. “Existe uma ilusão de que a guerra contra o crime consegue, de alguma maneira, colocar uma ordem na situação. Uma ilusão que se mostra há 40 anos completamente equivocada. É mais uma crença ingênua, mas a muito tempo arraigada no brasileiro, de que usando a violência se produz ordem. Mas quando essa ordem vai ser instaurada se produz muito mais desordem, porque perde o controle da situação e se cria a semente para um processo de ‘miliciarização’”.
“Sem pensar na estrutura, as coisas continuam produzindo os mesmos problemas. Problemas individualizados são problemas estruturais. Tem grana, uma capacidade de corrupção enorme, uma polícia sem controle e motivada pela guerra ao crime – de jogar gás de pimenta no olho de vagabundo: uma cortina de fumaça desses caras, que falam que estão em uma guerra contra o crime, mas estão ganhando muito dinheiro do crime e fazem parte da quadrilha”, declara.
Assista ao programa na íntegra:
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