O mercado financeiro, os economistas liberais e a mídia tradicional cobram, incansavelmente, que o governo federal preze pelo déficit zero, mesmo que para isso tenha de cortar investimentos nas áreas de infraestrutura, educação e saúde.
Mas, para João Silva, presidente do Data Favela e membro do conselho de professores do IBMEC, o maior exemplo de Estado mínimo que temos hoje e sua respectiva realidade são as periferias de todo o país.
“Se tem um lugar em que o Estado não existe é na favela. A favela é a concentração geográfica das desigualdades brasileiras onde o Estado não tem nem o monopólio da força, garantido pela Constituição”, observa o convidado do programa TVGGN 20H da última sexta-feira (12).
Na última semana, o Data Favela lançou um estudo sobre o impacto das fake news na vida de 16 milhões de brasileiros moradores de comunidades.
“Em geral, quando perguntamos às pessoas como elas veem as favelas, o que vem são cenas de violência, tráfico de drogas, agressão e de extrema pobreza. Quando repetimos a mesma pergunta para pessoas da própria favela, vem alegria, senso de comunidade, trabalho e esperança”, comenta Silva.
Assim, o pesquisador conclui que a visão de quem não mora da favela tem das favelas é uma visão muito estereotipada, muitas vezes acaba sendo reforçada pelas fake news.
“Um exemplo bastante claro: quando deputados da extrema direita acusaram o então ministro da Justiça, Flávio Dino, de ter conseguido entrar em uma favela porque pediu para o tráfico, qual é a mensagem implícita nisso: que na favela só tem bandido”, continua o entrevistado.
Oportunidades
O reforço de tal estereótipo resulta em prejuízo econômico para a população, que além de representar 9% dos lares brasileiros, movimenta mais de R$ 201 bilhões por ano.
“Ou se trata as fake news ou vamos ter um prejuízo econômico muito grande no desenvolvimento das favelas, seja porque aumenta o estigma, seja porque tem um prejuízo para os consumidores das favelas”, comenta Silva.
“Mentiras fazem com que os empreendedores de favela que dependem muito da internet para vender os seus produtos vendam menos porque o consumidor tem medo de ter os dados hackeados”, emenda o entrevistado.
Potência
O Brasil soma 148 milhões de pessoas que pertencem às classes C, D e E, população superior à da Alemanha (83 milhões) e Espanha.
Já em relação às favelas, são 11.400 comunidades espalhadas por todo o território nacional, que, apesar do estigma negativo, concentram todas as características dos líderes do futuro, elencadas pelo Fórum Econômico Mundial de Davos: resiliência, capacidade de trabalhar em grupo, capacidade de trabalhar com a adversidade.
Segundo Silva, quando uma pessoa cresce em uma favela, ou ela desenvolve tais habilidades ou estará perdida.
“A lógica da solidariedade na favela é o que faz ter o lado da potência, não só o lado da carência, o lado que movimenta mais de R$ 200 bilhões no Brasil. Mas na periferia, da mesma forma que foi impactada pelo coronavírus, está sendo impactada agora pela epidemia de fake news”, alerta o convidado.
Além do impacto das fake News, João Silva falou ainda sobre a importância do empreendedorismo e da riqueza da tecnologia social desenvolvida nas comunidades. Confira o bate-papo na íntegra em: