Chegou ao Disney Plus Tucci in Italy, a nova incursão do ator Stanley Tucci ao mundo da enogastronomia italiana. São cinco episódios que propõem um passeio pelas tradições e desafios da Itália, muito além das toalhas de linho, taças de cristal, pratos cheios e trufas de verão e de inverno.
No terceiro episódio, Tucci desembarca no Alto Adige, mais especificamente no Tirol do Sul, na fronteira com a Áustria — região historicamente disputada entre os dois países. Quando Mussolini chegou ao poder, falar alemão era proibido e podia levar à prisão. Hoje, massas e molhos austríacos se combinam a seus congêneres italianos na busca por uma identidade única — uma questão que ganhou novas camadas.
Nos últimos anos, a região passou a receber imigrantes, muitos deles vindos da África. Em um almoço na cidade de Bolzano com integrantes do grupo Cozinha sem Fronteiras, Tucci conversa sobre o tema com italianos e etíopes. Na mesa, pratos típicos do país africano, como a injera, uma espécie de panqueca. Entre mordidas, um etíope relata que vive em um apartamento de 25 metros quadrados com outras seis pessoas e enfrenta dificuldades para alugar moradia. “Quando os italianos veem que somos nós que estamos procurando um lugar, as ofertas são retiradas”, diz.
Na Lombardia, em Milão, o ator participa de um almoço de domingo na casa de Davide Fassi e Davide Chiappa, casal que se tornou pai de Martino Libero por meio de uma barriga de aluguel nos Estados Unidos. A criança tem apenas a cidadania americana, já que há entraves legais no reconhecimento de filhos de casais do mesmo sexo na Itália. Durante as filmagens do longa Conclave, sobre a guerra de bastidores da escolha de um papa, Tucci conheceu a história da família e decidiu entrevistá-los. A comida, aqui, vai além do que está na mesa.
Tucci mergulha em tradições e modernidades. Na Toscana, acompanha a corrida de cavalos em Siena — tradição secular que chegou a inspirar a abertura de um filme de James Bond. Visita também o restaurante Ciblèo, que tem apenas 16 lugares e propõe uma fusão entre a tradição italiana e a delicadeza oriental. Localizado no coração renascentista de Florença, o estabelecimento deve seguir regras rígidas: 80% dos ingredientes precisam ser locais. Há quem torça o nariz, mas outros aplaudem a ideia. Entre os pratos, guiozas cozidas em caldo de porco da região.
Em Abruzzo, o ator mostra os trabocchi — estruturas de pesca construídas em madeira que se projetam sobre o Mar Adriático, sustentadas por pilares fixados nas rochas. Grandes redes são suspensas por roldanas e cabos. Em uma delas, foi aberto um restaurante à beira-mar, que serve pescados frescos com pratos da terra.
Em Lazio, numa mesa estrelada, Tucci conhece um casal que trocou a agitação de Roma pela produção de vinhos no interior. A filha, porém, reclama da ausência de comida chinesa e das lojas da capital italiana.
Essa não é a única incursão de Tucci pelo universo dos sabores. Em maio, chegou ao Brasil O que eu comi em um ano, livro lançado pela editora Intrínseca e continuação de Sabor, em que o ator relata sua paixão pelo tema. Diagnosticado com câncer na garganta — o que o fez perder o paladar —, Tucci vive hoje em remissão e reflete sobre comida, bebida, restaurantes, memórias e a vida. Estima que ainda tenha “de 20 a 30 anos a serem degustados”, se tiver sorte.
Tucci manteve um diário enquanto filmava Conclave — base para o novo livro. Aproveitou para viajar pela Itália. Alguns dos endereços aparecem na série de cinco episódios, disponível no Disney Plus. Outros estão no livro, como o restaurante L’Eau Vive, administrado por freiras carmelitas francesas desde 1969, em Roma. O local, um dos preferidos de Ingrid Bergman — mãe de Isabella Rossellini, colega de cena em Conclave —, é simples, sem ostentações. E discreto: não há paparazzi.
No meio da refeição, o trio — Tucci, Rossellini e o ator John Lithgow — foi interrompido quando as freiras distribuíram folhas com a letra de hinos religiosos em francês. Reunidas num canto, elas entoaram os cânticos e encorajaram os presentes a participar. Os atores acompanharam.
“Hoje, avizinhando-me do inverno da vida, é por meio da natureza, da arte e dos meus filhos que sinto uma forma de reverência, e é ao redor da mesa que vivencio uma forma de cerimônia. Tudo isso sem culpa.”