Nesta quinta-feira (19), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já havia formado maioria para rejeitar a candidatura do vereador Fábio Augusto de Oliveira Brasil (MDB-RJ), mesmo sem condenação do parlamentar. Suspeito de envolvimento com milícia, Brasil recorreu ao TSE após ter seu registro de candidatura negado por extrapolação da Lei da Ficha Limpa.

A Candidatura

Conhecido como Fabinho Varandão, Brasil é vereador na cidade de Belford Roxo (RJ) e teve seu pedido de registro de candidatura na última eleição negado. O entendimento do juiz de primeira instância foi de que a negativa ocorreu devido à suspeita de ligação do vereador com grupos criminosos.

Fabinho Varandão não foi condenado em segunda instância, sendo réu em procedimento ainda em trâmite. Nessa situação, ele não atenderia aos requisitos de condenação por órgão colegiado para impedimento de registro de candidatura, conforme estabelecido pela Lei Complementar n.º 135, de 2010, conhecida como Lei da Ficha Limpa, afastando qualquer lastro normativo da sentença.

É irônico, mas o entendimento parece ser supostamente baseado na Constituição e na necessidade de “moralidade”, a partir da “vida pregressa do candidato”. A parte da Carta Magna que versa sobre a presunção de inocência parece não ter sido levada em consideração pelo magistrado.

A Acusação

Fábio foi preso em 2018, em uma operação da Polícia Civil, tornando-se réu por extorsão e porte ilegal de arma de fogo. Ele foi acusado de liderar uma organização criminosa que coagia moradores e explorava serviços clandestinos de internet em bairros de Belford Roxo.

O Ministério Público (MP) sustenta que o grupo atua no monopólio de distribuição de sinal clandestino de internet, na venda de gás de cozinha e de cigarros contrabandeados, além da exploração do serviço de moto-táxi.

Segundo o MP, os milicianos forçavam comerciantes e moradores dos bairros Vale do Ipê, Parque Amorim, Lote XV, Jardim do Ipê, Vale da Mangueira, Vasco, Vona, Parque Roncali, São Vicente e Heliópolis a pagar uma “taxa de segurança”.

O processo foi fundamentado em denúncias anônimas das vítimas ao MP, corroboradas por testemunhas.

Segunda Instância

Ferido em seus direitos, o vereador interpôs recurso ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ). Entretanto, o órgão de segunda instância manteve a decisão. A relatora, desembargadora Maria Helena Pinto Machado, considerou que existiam “provas consistentes” contra o réu.

Segundo a desembargadora, o réu “integra milícia armada e, em inúmeras oportunidades, ameaçou de morte quem tentou realizar a distribuição de sinal de internet em Belford Roxo, em um comportamento criminoso gravíssimo”. Entretanto, esse não é o objeto do procedimento em questão.

Como bem colocado pela defesa do candidato, ele “possui todos os requisitos de elegibilidade”, inexistindo “razões, nem mínimas que sejam, com o devido amparo jurídico, para se esquivar de tal fato incontestável”, explicando que a vida pregressa dos candidatos “não deve ser monitorada pela Justiça Eleitoral”.

Todavia, a desembargadora Machado manteve: “ainda que não haja decisão condenatória acerca das acusações, a prática criminosa objeto da ação penal é, definitivamente, incompatível com a moralidade requerida para o exercício do mandato eletivo para o qual pretende concorrer, além de atentar contra a normalidade das eleições”.

Vale Tudo no Arbítrio do Poder Judiciário

Em entrevista ao Globo, o presidente do TRE-RJ, desembargador Henrique Carlos de Andrade Figueira, defendeu o endurecimento da Justiça no registro de candidaturas. Alegou que a Constituição, em face da Lei da Ficha Limpa, teria um “alcance maior” para barrar candidatos ligados ao crime.

“Quando existem provas efetivas, cabais de que o candidato está vinculado ao crime organizado, os juízes estão rejeitando o registro. Essa decisão pode até estar contrária ao que determina a Lei da Ficha Limpa, em relação ao que ela versa sobre a condenação em segundo grau, mas ela está absolutamente conforme os comandos constitucionais.

A lei tem uma limitação de vedação, mas a Constituição tem um alcance maior”, declarou Figueira. Evocar a Constituição para distorcê-la é uma farsa dedicada a encobrir a atuação política do poder judiciário.

Terceira Instância

O recurso à terceira instância não trouxe novidades: o TSE manteve a maioria do entendimento da sentença e dos acórdãos anteriores. Em termos simples, um juiz de primeira instância criou uma nova lei, baseada na Lei da Ficha Limpa, ou uma emenda a essa, que foi ratificada e autorizada em instâncias superiores do judiciário.

Ocorre que ao judiciário cabe aplicar a lei, não “interpretá-la”, modificá-la ou criá-la; essas são prerrogativas do poder legislativo. É fato que os magistrados não se baseiam na Constituição, mas sim a ignoram.

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Last Update: 21/12/2024