O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, determinou nesta segunda-feira (11) a federalização do Departamento de Polícia de Washington, D.C., e autorizou a mobilização de cerca de 800 soldados da Guarda Nacional para atuar de forma ostensiva nas ruas da capital. 

A medida, amparada em uma declaração de “emergência” emitida pelo próprio presidente, permite que as tropas desmontem acampamentos de pessoas em situação de rua, efetuem prisões e, segundo o próprio Trump, “façam o que diabos quiserem” para conter a criminalidade. 

A medida atinge diretamente a administração da prefeita Muriel Bowser, democrata, que foi surpreendida pela decisão apesar de ter mantido, até agora, uma relação de cooperação pontual com a Casa Branca. 

Trump ameaça intervir em Washington desde 2020 e, nesse período, passou a retratar a capital com termos como “campo de matança”, “lixo espalhado” e “favelas”. 

O fato de D.C. não ter status de estado permite ao presidente mobilizar tropas e assumir o controle da polícia sem consentimento local, o que torna a capital um alvo mais fácil para uma ação com forte peso político. 

Em julho deste ano, Trump já recorreu a medidas semelhantes contra administrações democratas, como no envio de mais de 5 mil soldados da Guarda Nacional e fuzileiros navais para a Califórnia, contrariando o governador Gavin Newsom e usando o mesmo discurso de “lei e ordem”.

É a primeira vez na história moderna dos EUA que um chefe do Executivo adota esse tipo de intervenção direta sobre a segurança pública da capital federal. Apesar do discurso alarmista, dados oficiais indicam que o crime violento em Washington caiu 26% no último ano.

A prefeita Bowser afirma que, em 2025, os índices estão não apenas abaixo dos de 2023, mas também inferiores aos de 2019, período pré-pandemia, marcando o menor patamar de criminalidade violenta em três décadas.

Ao anunciar a operação, Trump afirmou que a missão busca “resgatar D.C. do crime, do derramamento de sangue, do caos e da miséria”. 

A ordem executiva foi assinada com base em uma brecha legal que autoriza o presidente a assumir o controle da polícia da capital por até 30 dias e a mobilizar a Guarda Nacional sem a anuência das autoridades locais. 

“Teremos cooperação total, integrada e sem falhas em todos os níveis da aplicação da lei e vamos posicionar agentes por todo o distrito com uma presença esmagadora”, declarou.

Segundo fontes ouvidas pelo Washington Post, Trump tinha um “roteiro informal” para intervir na cidade desde antes de assumir o cargo, com opções que variavam de um reforço de recursos federais à suspensão completa da autonomia administrativa de Washington. 

A federalização da polícia foi considerada pela Casa Branca como um “meio-termo” entre essas alternativas. Para especialistas, a medida rompe uma tradição institucional e representa uma mudança drástica na relação entre governo federal e administração municipal.

Militarização e criminalização da pobreza

O envio de tropas para funções tradicionalmente civis preocupa especialistas e organizações de direitos humanos. O secretário de Defesa, Pete Hegseth, disse que os militares “não se envolverão em ações policiais”, mas admitiu que podem “deter temporariamente” suspeitos até a chegada da polícia. 

Um oficial do Exército informou ao Washington Post que todos os soldados mobilizados estarão armados e atuarão também na remoção de acampamentos de sem-teto e no controle de perímetros urbanos.

Trump intensificou o tom ao declarar que sua gestão “vai acabar com as favelas” e “despejar bandidos e gangues”. Para críticos, a retórica e as ações evidenciam um foco punitivo contra populações vulneráveis, sem qualquer proposta de política social. 

Paralelamente, documentos do Pentágono revelam que o governo estuda criar uma “Força de Reação Rápida” para distúrbios civis, baseada em Alabama e Arizona, pronta para intervir em qualquer cidade do país em até uma hora — um passo visto por juristas como a institucionalização da presença militar na vida civil.

Crime isolado serviu de pretexto para operação planejada

O estopim para a medida foi a tentativa de roubo de carro contra Edward Coristine, ex-funcionário próximo a aliados de Trump, ocorrida no início de agosto. Conhecido nos círculos da Casa Branca e apelidado de “Big Balls”, Coristine foi retratado pelo presidente como símbolo da “violência fora de controle” na capital. 

“Se a cidade não se acertar rapidamente, veremos coisas muito piores”, escreveu Trump nas redes sociais, ao publicar uma foto de Coristine ferido.

Nos dias seguintes ao ataque, Trump designou a procuradora-geral Pam Bondi para comandar a polícia local e Hegseth para acionar as tropas. Jeanine Pirro, recém-nomeada procuradora federal do Distrito, foi incumbida de aumentar o número de processos. 

A prefeita Muriel Bowser afirmou que, embora soubesse da possível mobilização da Guarda Nacional, “não tinha razão para acreditar” que a polícia seria colocada sob controle federal. “Vou trabalhar todos os dias para garantir que isso não seja um desastre completo. Vou chamar isso de ‘suposta emergência’”, disse.

A decisão provocou reações entre especialistas e autoridades de Washington. “Você não quer normalizar a participação rotineira dos militares na aplicação da lei”, alertou Joseph Nunn, do Brennan Center for Justice, destacando que o plano reduz o limiar para futuras intervenções federais em cidades norte-americanas. 

Lindsay Cohn, professora da Escola de Guerra Naval, classificou a medida como “estranha”, observando que “o crime está caindo” e que “não há protestos ou distúrbios civis significativos” que justifiquem a ação.

Além do impacto político, há riscos práticos: sobrecarga do sistema judicial, que já sofre com a falta de promotores; desgaste dos recursos humanos e materiais da Guarda Nacional; e desvio de atenção de missões essenciais, como resposta a desastres naturais. 

Para Carter Elliott, porta-voz do governador de Maryland, “há um procedimento bem estabelecido para solicitar apoio extra em momentos de necessidade, e o governo Trump está ignorando esse precedente de forma perigosa”.

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Last Update: 13/08/2025