Na ultima terça-feira 4, Donald Trump voltou ao palanque, para dizer que fará a “América grande novamente” e disparar contra adversários. Do outro lado da tribuna, contudo,  não estavam os eleitores fanáticos que lhe deram a vitória nas últimas eleições. Eram os deputados e senadores que o assistiam, em sua primeira aparição no Congresso norte-americano.

A diferença entre um público e outro foi pequena. A tímida reação dos democratas se resumiu a queixas e à exibição de placas não apenas contra Trump, mas contra o novo membro do seu governo, Elon Musk.

Mas o clima geral da tour de force trumpista, que durou mais de uma hora e meia, foi dado pela maioria republicana: nomes de peso do governo, como o vice-presidente J. D. Vance e parlamentares da base republicana exaltavam o presidente, aplaudindo suas frases de efeito contra a China, a União Europeia e os já conhecidos ‘inimigos internos’ do trumpismo, especialmente as minorias.

A reestreia de Trump no Congresso foi uma profusão de falas contra tudo aquilo que ele mesmo promete combater. Via de regra, cabe ao Congresso mediar as políticas do presidente de ocasião, mas, pelo menos na primeira cerimônia, o que se viu foi mais um reconhecimento da nova ordem da política norte-americana pelos presentes – menos diplomacia, mais imposição pela força – do que qualquer sinal de que daquelas cadeiras poderiam surgir problemas para o presidente. Dizendo ter acabado com “a tirania da chamada ‘diversidade, equidade e inclusão’ em todo o governo federal e no setor privado e nas forças militares”, Trump, ao invés do repúdio, colheu palmas.

‘Salvacionismo’ ao modo Trump

“Foi além do que se esperava”, observa Rafael Ioris, professor na Universidade de Denver e pesquisador do Instituto de Estudos dos Estados Unidos (INCT-INEU). “Houve uma clara falta de uma tentativa de conciliação, de acalmar os ânimos. Foi um discurso extremamente agressivo, de campanha”, avalia. 

Foi um discurso de um líder populista e até neofascista. No sentido de ter pouca preocupação com fatos e evidências, mas, simplesmente, manipular a narrativa, apresentando uma perspectiva muito clara da realidade“, diz ele, para quem a fala do presidente norte-americano é marcada pelo tom de “salvacionismo”.

Trump chega ao Congresso para primeiro discurso do seu segundo mandato. Foto:ALLISON ROBBERT / AFP

Segundo Ioris, Trump até falou pouco de política externa no discurso de ontem – disse que países como Brasil aplicam taxas ‘injustas’ aos EUA, indicou que vai tomar a Groenlândia ‘de um jeito ou de outro’ e voltou a criticar os gastos do país com a guerra na Ucrânia -, mas os recados dados por ele são preocupantes.

“Ele mostrou algo como ‘eu ganhei, sou o grande líder, vou definir os rumos do mundo e não vou conciliar. É muito preocupante”, alerta o pesquisador, que destaca que os avisos de Trump aos demais países mostram o desejo do republicano de fazer com que os EUA “sozinhos, comandem o mundo”. A lógica do discurso é construída na noção de que “quem tem mais poder, manda”, segundo Ioris.

Como ficará o apoio a Trump? 

Apesar da retórica contundente — e com frequência rebatida por outras lideranças -, a grande questão passa por saber em que nível o discurso de Trump, embora semelhante às falas de campanha, conseguirá seguir convencendo não apenas a sua própria base eleitoral, mas a população norte-americana, no geral. 

Algumas chaves contribuem para essa incerteza, segundo Ioris. “Trump está apostando em uma lógica de cassino. Ou seja, tomando muitos riscos. O primeiro ponto é a questão das tarifas”,  diz. O americano não gosta de tarifas, e se essas tarifas começarem, de fato ,a aumentar a inflação, essa é uma área em que ele pode sofrer críticas. Não apenas dos republicanos, mas da população, em geral”.

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Last Update: 05/03/2025