Donald Trump, que voltou à Casa Branca promovendo deportações em massa e intensificando a guerra comercial contra países vizinhos e contra a China, quer reformular a estrutura do Estado norte-americano. Para cumprir a missão, o republicano escolheu o empresário Elon Musk, que chefia o novo Departamento de Eficiência Governamental.
Um dos principais alvos da dupla é a Agência dos Estados Unidos para Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em inglês), uma organização responsável por executar programas de ajuda para outros países do mundo.
Desde que Trump voltou ao poder, no último dia 20 de janeiro, o futuro da USAID está em risco. As especulações sobre um possível fim das atividades da agência vinham ganhando força nas últimas semanas, dada a decisão do governo de congelar o seu financiamento e de afastar funcionários.
Agora, o risco se tornou ainda mais real. No último domingo 2, por exemplo, Musk foi ao X – a rede social de sua propriedade – para acusar a USAID de ser uma “organização criminosa”. Ele não apresentou provas da acusação, mas pediu o fim das atividades da agência.
Na mesma linha, Trump também indicou que a agência estaria sendo dirigida “por um bando de lunáticos radicais”, que estariam sendo afastados das suas funções.
O argumento formal da dupla Trump-Musk é que é necessário cortar gastos. O próprio Musk, aliás, chegou a dizer que tentaria reduzir em dois trilhões de dólares os gastos federais. A visão do governo é que há investimentos excessivos, inclusive no exterior. No âmbito militar, por exemplo, o republicado é um crítico habitual dos aportes feitos pela antiga gestão Joe Biden na defesa da Ucrânia contra a Rússia, no leste europeu.
Disputa por poder
Mas não é só o dinheiro que move as investidas da dupla. Há, também, uma disputa por poder. Segundo informações do jornal The Washington Post, a demissão recente de dois altos funcionários da USAID foi motivada pelo fato de que ambos teriam se recusado a conceder ao governo o acesso a áreas consideradas restritas da agência.
Mesmo porque, se observado apenas do ponto de vista orçamentário, o eventual fechamento não representaria um alívio tão significativo nas contas públicas dos Estados Unidos. Segundo registros do governo dos EUA, a USAID administra cerca de 40 bilhões de dólares, o que, na prática, representa menos de 1% de todo o orçamento federal.
Essa quantia costuma ser usada para fornecer assistência humanitária em vários países. Por meio da USAID, o governo dos EUA envia os recursos para organizações não governamentais, organismos internacionais e até para governos. Países como Etiópia, República Democrática do Congo e Jordânia, além da Ucrânia, se beneficiam da estrutura, que conta com mais de 10 mil pessoas.
A história da USAID é longa: a agência foi criada no início dos anos 1960, visando unificar os diferentes programas de ajuda externa dos EUA. Mais recentemente, a agência passou a focar os seus trabalhos em programas de saúde e em assistência humanitária.
Efeitos no mundo
O iminente fechamento da USAID tem desdobramentos que vão além da fronteira norte-americana. Exemplo disso é o fato de que, no ano passado, foi a agência que forneceu 42% de toda a ajuda humanitária realizada pela Organização das Nações Unidas (ONU). As cifras fazem da USAID o maior doador individual do mundo.
Para Musk, a caça implacável se justifica pelo fato de que a agência se trata de “um ninho de vermes”, como disse no último final de semana, dizendo que o governo precisa se “livrar de tudo”, uma vez que a agência estaria “além de qualquer conserto”.
Acesso cada vez mais amplo
Autorizado a passar um pente-fino nos trabalhos das agências norte-americanas, Musk avança sobre o Tesouro dos EUA.
Segundo informações do jornal The New York Times, vem crescendo a preocupação de burocratas sobre a ampliação do acesso do empresário ao sistema do Tesouro do país, notadamente ao sistema responsável pelo pagamentos às agências federais. É de lá que saem 6 trilhões de dólares anuais para remunerações.
O sistema não apenas é rico em dinheiro, mas em dados. Através do seu novo cargo, Musk deseja – segundo o NYT – ter acesso aos dados pessoais de milhões de norte-americanos que recebem um leque de pagamentos do governo, desde aposentadorias até restituições de impostos.