“É um truque antigo: se você não pode vencer uma votação, garanta que ela não aconteça.” Foi assim que o New York Times, jornal norte-americano, definiu a manobra dos republicanos.

Com o aval do presidente Donald Trump, parlamentares republicanos do Texas apresentaram uma proposta para redesenhar os distritos eleitorais do estado, numa tentativa de ampliar a representação conservadora na Câmara dos Representantes. 

O golpe, articulado em parceria com o governador texano Greg Abbott, prevê mudanças em cinco distritos atualmente controlados por democratas. Se aprovado, o plano pode elevar de 25 para 30 o número de deputados republicanos do Texas, reforçando a maioria do partido em Washington às vésperas das eleições legislativas de 2026.

A sessão extraordinária para votação do novo mapa estava marcada para segunda-feira (4), mas acabou suspensa por falta de quórum, após dezenas de deputados democratas deixarem deliberadamente o estado. 

A manobra teve o objetivo de impedir a realização da sessão e bloquear a tramitação do projeto. Segundo o jornal New York Times, a proposta dos republicanos afeta principalmente áreas urbanas com maioria democrata — como Houston, Dallas e Austin — e também regiões da fronteira com o México, onde o eleitorado hispânico tem crescido. 

A tática empregada, conhecida como gerrymandering, visa concentrar eleitores progressistas em poucos distritos e diluí-los nos demais, garantindo vantagem estrutural aos conservadores. Embora a prática seja legal segundo decisão da Suprema Corte dos EUA de 2019, ela é amplamente denunciada por distorcer a representatividade democrática.

A fuga dos democratas para fora do estado gerou reações autoritárias do governo texano e do próprio Trump. O governador Greg Abbott ameaçou prender e multar os parlamentares ausentes e declarou que irá cassar seus mandatos caso não retornem até o fim da semana.

O procurador-geral do Texas, Ken Paxton, afirmou que buscará ordens judiciais para obrigar o comparecimento. Já Trump indicou que pode acionar o FBI para forçar a volta dos legisladores e viabilizar a votação. 

“Talvez precise mandar a polícia federal buscá-los”, declarou o presidente. A escalada da retórica evidencia o caráter autoritário da ofensiva republicana, que pretende redesenhar o mapa eleitoral não por via do convencimento político, mas por imposição institucional.

Em reação coordenada, os deputados democratas encontraram abrigo em estados governados por aliados. O governador de Illinois, JB Pritzker, recebeu cerca de 30 parlamentares texanos em Chicago, fornecendo apoio logístico e político. 

Durante uma coletiva ao lado de lideranças democratas, Pritzker rebateu o governador Abbott e seu alinhamento com Trump. “Greg Abbott é um covarde”, disse, ao responder uma provocação do republicano publicada nas redes sociais. “Eles dizem: ‘Sim, senhor. Imediatamente, senhor. Feliz em lamber sua bota, senhor’”, ironizou Pritzker, ao descrever a submissão dos aliados de Trump. 

O impasse no Texas é apenas a face mais visível de uma estratégia nacional articulada pelo trumpismo para consolidar o domínio republicano no Congresso antes das eleições legislativas de 2026. 

Atualmente, a Câmara dos Representantes conta com 219 republicanos e 212 democratas. Quatro cadeiras estão vagas, e o equilíbrio de forças é considerado crítico. 

Segundo aliados de Trump ouvidos pelo Politico, a estratégia é de “guerra total, em todo lugar, o tempo todo”. A proposta do Texas já inspira iniciativas semelhantes em estados controlados por conservadores, como Flórida, Missouri, Indiana, Ohio, Kansas e New Hampshire. 

O vice-presidente JD Vance estaria pressionando por mudanças em Indiana. A meta é simples: garantir maioria estrutural para barrar projetos dos democratas, impedir investigações contra Trump e consolidar um novo ciclo de dominação legislativa.

Diferente do sistema brasileiro, nos Estados Unidos os deputados federais são eleitos por distrito geográfico, e não por voto proporcional em âmbito estadual. Isso significa que o redesenho das fronteiras pode alterar radicalmente o resultado das eleições sem que haja qualquer mudança no número absoluto de votos recebidos por cada partido. 

É o mapa que decide quem vence, não o eleitorado em si. A manipulação desse mecanismo representa um risco grave à democracia representativa. Ainda que tecnicamente legal, o gerrymandering mina o princípio da igualdade de voto e permite que uma minoria organizada mantenha o controle institucional.

As táticas de Trump nos EUA ecoam as tentativas vistas no Brasil durante o governo Bolsonaro: ataques ao sistema eleitoral, intimidação de opositores, tentativa de controlar as regras do jogo por dentro das instituições. 

Ao ameaçar prender parlamentares e acionar a polícia federal para forçar sessões legislativas, Trump e seus aliados colocam em xeque até mesmo os fundamentos da democracia liberal norte-americana. 

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 07/08/2025