Embora um tópico sensível para muitos na “vida real”, a morte tem se tornado um nicho nas redes sociais. Pelas lentes de um coveiro, em vídeos de uma paciente terminal, os relatos de maquiadoras e preparadoras de cadáveres, ao redor do mundo, telespectadores tem se interessado por conteúdos desse gênero tão temido fora das telas.
“Passei a mostrar o meu tratamento como uma forma de desabafo e de escape. Minha intenção era de conversar com quem já me seguia e brincar, viver de forma mais leve”, ressalta Ana Luiza, de 18 anos, diagnosticada com um Linfoma de Hodgkin, câncer do sangue com origem no sistema linfático, que, segundo previsões médicas, estaria em seus últimos meses de vida.
“Fico orgulhosa porque sei o quanto ajudo outras pessoas que enfrentam a doença, um cuidado paliativo”, disse Ana Luiza. “Todos merecem qualidade de vida, com cuidados paliativos ou não.”
Ana Luiza recebe mensagens de apoio, mas também se tornou alvo de ataques. Já teve de lidar com mensagens como “por que você ainda não morreu?”, como conta o Globo.
🚨VEJA: Ana Luiza, jovem que luta contra um câncer terminal, afirma que seu tumor se encontra estável.#BBB24 #instagramdown #Itzulia2024 #24againstpredators #Airdrop #Bbb24 #beardtwitter #dax18 #DCvKKR #earthquake #JapaneseGP #WhatsApp #choquei
— Abu Victor Abu (@vikman88990) April 8, 2024
Para o jornal, a professora da Universidade Federal Fluminense Renata Rezende, especialista em estudos sobre mídia e morte, defende que a exposição do tema permite que ele seja debatido com mais naturalidade. Para ela, o assunto tem gerado comoção e curiosidade por se tratar de um destino comum da humanidade, que, na prática, é desconhecido. Os usuários encontram, assim, uma forma de criar um “laço social invisível” e preservar memórias.
“O interesse é evidente inclusive em casos de famosos que, ao morrer, ganham seguidores, como Pelé e Marília Mendonça. Existe uma espécie de cultura de pertencimento e de manutenção da memória que explica esse crescimento”, declara.
“Esta nova lógica, em que se expõe quase tudo remonta a como funcionava a sociedade na Idade Média, quando lidar com a morte fazia parte do dia a dia da população”, prossegue Renata. “Com a modernidade, houve o avanço da medicina e foram criados espaços para morrer, como cemitérios e hospitais. A internet, sobretudo após a pandemia, fez com que essa temática voltasse a ser abordada com menos tabu.”
O perfil @egocarina, é um exemplo disso. Em seus vídeos, a técnica em tanatopraxia responde dúvidas sobre ciências mortuárias dos quase 170 mil seguidores no Instagram. Seu trabalho consiste em procedimentos que visam a higienizar o cadáver de dentro para fora.
“Comecei a crescer na internet quando eu estava estudando esta profissão e compartilhei minhas primeiras experiências. Sofro críticas o tempo todo, principalmente, por abordar a morte, que é um tema que a sociedade tenta esconder a todo custo. Mas gera interesse.”, explicou Ego ao jornal.
Como conta na reportagem, assim como Ana Luiza, a técnica em tanatopraxia ressalta que, apesar de provocar estranhamento, a maioria dos comentários em suas postagens são positivos. Além disso, seus seguidores pedem para compartilhar histórias de perdas próximas e de superação destes momentos.
Um coveiro brasileiro na França
César Marcos Junior, conhecido como Júnior Covas nas redes sociais, documenta seu trabalho como coveiro na França para quase 900 mil seguidores no Instagram e 1,5 milhão no TikTok. Ele utiliza o humor para compartilhar a rotina no cemitério com seu público online, a quem se refere como “futuros clientes”.
Em suas postagens, o goiano, que se chama de “Senhor das Covas”, demonstra como realiza a limpeza de sepulturas e a exumação de corpos, além de explicar as diferenças entre os procedimentos funerários no Brasil e na França.