Entre os momentos mais criativos da música instrumental brasileira, certamente, estão os anos 1950 e 1960, quando a bossa-nova surgiu, influenciada pelo jazz. Nesse período, novas harmonias, melodias, timbres e concepções rítmicas foram incorporadas às formas musicais tradicionais do Brasil. O desenvolvimento da bateria brasileira, liderado por Edson Machado, Milton Banana, Robertinho Silva e Rubens Barsotti, é um exemplo disso. Além disso, a evolução do contrabaixo acústico, explorada por Luiz Alves e Luiz Chaves, e os solos e bases de piano, concebidos por Tenório Jr., João Donato, Johnny Alf e Amilton Godoy, também foram importantes.
Um dos grupos mais talentosos da época foi o Zimbo Trio, formado em 1964 pelo pianista Amilton Godoy, o contrabaixista Luiz Chaves e o baterista Rubens Barsotti. Se todos eles estivessem vivos, o grupo teria a minha idade, pois nasci em 1964; durante a mocidade, tive a felicidade de escutá-los tocar ao vivo numerosas vezes.
Em geral, na música popular, há instrumentos de solo, como os instrumentos de sopro, que encarregam-se da melodia, e instrumentos próprios para fazer a base harmônica, como o violão e os teclados. Além disso, há instrumentos que conduzem o ritmo, como a bateria e a percussão. Essas funções podem ser modificadas, mas, em geral, elas são mantidas na maioria dos gêneros musicais.
A bateria, antes de Edson Machado e outros bateristas da bossa-nova, não tinha a distribuição de bumbo, aro de caixa e pratos que posteriormente se tornou comum. Além disso, o baterista não desenvolvia a melodia em contraponto com os demais instrumentos, apenas acompanhava o ritmo. O contrabaixo também participava apenas da base harmônica, sem qualquer papel contrapontístico ou independência melódica.
No entanto, o Zimbo Trio e seus integrantes inovaram essas concepções. Rubens Barsotti participou dos desenvolvimentos da arte de tocar bateria e Luiz Chaves inovou as concepções do contrabaixo, principalmente na composição das linhas melódicas e nos usos do braço do instrumento. Amilton Godoy, poucos brasileiros com formação de piano erudito, soube combinar as técnicas da música de concerto com o suingue da música popular brasileira.
Por fim, gostaria de sugerir duas audições: a interpretação do Trio da canção “Fé cega faca amolada”, de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, acompanhados do violeiro e guitarrista Heraldo do Monte e do saxofonista e flautista Hector Costita, de 1976, e a interpretação da música instrumental “Bebê”, de Hermeto Pascoal, de 1978.
A primeira gravação dura aproximadamente 7 minutos e apresenta uma interpretação de ritmo nordestino. A segunda gravação é exclusivamente com o Zimbo Trio e expressa sensivelmente a concepção da bateria com mudanças de levada em cada parte da composição; as linhas melódicas do contrabaixo em contraponto com o piano e a bateria; a genialidade do pianista em complexificar técnica erudita e suingue.
Endereço das composições no YouTube:
(1) Fé cega faca amolada:
(2) Bebê: