A Justiça Federal recebeu uma denúncia do Ministério Público Federal contra médicos-legistas pelos crimes de falsidade ideológica e ocultação de cadáver na ditadura.
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região acolheu um recurso do MPF contra a decisão da 6ª Vara Criminal de São Paulo que rejeitava a denúncia contra Harry Shibata e Antonio Valentini sob o argumento de que a Lei da Anistia extinguiu a punibilidade da dupla — a norma, de 1979, perdoou crimes políticos e conexos praticados sob o regime militar (1964-1985).
O caso se refere aos assassinatos, em novembro de 1973, de Sônia Maria de Moraes Angel Jones e Antônio Carlos Bicalho Lana, militantes da Aliança Libertadora Nacional, um dos mais destacados grupos de oposição à ditadura.
Na versão oficial dos militares, as mortes ocorreram quando o casal ‘resistiu à prisão’, em um tiroteio na Rua Pinedo, em Santo Amaro, zona sul da cidade de São Paulo. O MPF contestou a versão e apontou que o casal foi sequestrado por agentes da repressão e levado clandestinamente a um centro de tortura.
Ainda de acordo com a acusação, após serem mortos, os militantes foram enterrados como indigentes para dificultar a localização. Os corpos só foram encontrados na década de 1990.
As duas vítimas teriam sido alvejadas por diversos disparos de arma de fogo, a fim de simular a ocorrência de um tiroteio para registro no atestado de óbito. Os médicos denunciados teriam feito parte da última etapa, falsificando os laudos necroscópicos e ocultando todas as marcas de tortura sofridas pelas vítimas.
Harry Shibata ainda teria participado da ocultação do cadáver de Sônia, enterrada sob o nome falso de Esmeralda.
Na análise do caso, o MPF já havia sustentado que os crimes cometidos pelos legistas se enquadram como crimes contra a humanidade e, portanto, não seria possível aplicar a Lei da Anistia, tampouco o instituto da prescrição. A tese foi acolhida pelo magistrado Paulo Gustavo Guedes Fontes, em decisão emitida na última terça-feira 10.