A transição energética da economia mundial é irrenunciável. É uma questão de vida, ou desastre, em razão da crise climática que continua escalando. Porém, isso pressupõe a transformação radical no modelo predatório de produção e consumo dominante no mundo. Desafio nada trivial, ainda mais com os EUA tendo abandonado o Acordo de Paris e seu atual governo professando o negacionismo.
Em contraste, o governo brasileiro, pelas suas orientações programáticas em torno da sustentabilidade, se autoimpõe propósitos adicionais nesse campo face a credibilidade mundial conquistada no tema, e até a obrigação por uma conduta ambiental exemplar na qualidade de anfitrião da COP 30.
Avançamos nesse desafio mediante estratégias de reindustrialização do país pautadas na transição energética, e em outras bases disruptivas, consistentes com a sustentabilidade.
Na agricultura brasileira o desafio é ainda mais gigantesco, pois temos uma ampla estrutura produtiva, voltada para o mercado externo, hiper intensiva em insumos derivados dos combustíveis fósseis. Não bastasse, ainda enfrentamos o desmatamento e outras práticas anacrônicas por parte de alguns segmentos do setor, afeitos ao lucro a qualquer custo, pouco preocupados com uma nova base técnica para a agricultura. Contam com considerável suporte político nas nossas instituições.
Mesmo com o Brasil sediando a COP 30, tais segmentos continuam operando por flexibilizações desmedidas na legislação socioambiental. Propostas nessa direção no Congresso são incontáveis. “Conquistaram” recentemente, a Lei nº 15.190, de 2025, sobre o licenciamento ambiental, tida pelos ambientalistas como a “mãe de todas as boiadas”. Como sabemos, o licenciamento ambiental é um instrumento regulatório básico para a conformidade dos empreendimentos nessa área. Portanto, é decisivo para os propósitos da transição energética.
Para resgatar a credibilidade do instrumento, Lula vetou vários dispositivos da Lei, ainda pendentes de apreciação pelo Congresso. Semana passada, em pronunciamento no plenário do Senado, apelamos aos senadores e senadoras da oposição a reconhecerem a necessidade desses vetos. A eventual manutenção do texto aprovado no Congresso seria um péssimo sinal do país, com graves repercussões, inclusive no plano comercial. Daria razão, por exemplo, aos discursos dos europeus sobre a sua lei antidesmate. Fragilizaria os esforços diplomáticos gigantescos de Lula para a finalização do Acordo Mercosul/UE, ainda mais relevante após as restrições comerciais impostas pelos EUA. Sobretudo, na forma aprovada, essa Lei macularia a imagem positiva do Brasil, no mundo, na temática da sustentabilidade e na liderança potencial do país na transição energética. Imaginem o estrago na imagem do país com tamanha flexibilização no licenciamento, às vésperas da COP 30.
A propósito, talvez sob o embalo da aprovação dessa Lei, até o CADE, que é uma autarquia do governo decidiu preventivamente pela suspensão da moratória da soja sob alegação de supostos indícios de práticas anticompetitivas. Um tremendo “tiro no pé” que certamente será revertido pelo governo. Ainda a propósito, para nós da Amazônia, um licenciamento ambiental consistente é indispensável para a autorização da exploração do petróleo na margem equatorial. Neste caso, o veto do presidente, acompanhado da edição de uma Medida Provisória, garante licenciamento especial para a margem equatorial, por exemplo, com celeridade possível, mas com o rigor máximo exigido para enfrentar sensibilidades socioambientais extremas nessa região. Em suma, a transição energética, vital para a humanidade, impõe a preservação/conservação do meio ambiente como variável determinante na economia. Para tanto, o licenciamento e peça regulatória chave.