Os trabalhadores dos Correios entram em uma semana decisiva para o futuro da greve iniciada às 22 horas de 16 de dezembro. Na próxima terça-feira (23), a categoria em São Paulo realiza assembleia para analisar a proposta de Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) 2025/2026, formalizada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) após processo de mediação com a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT).
A deliberação ocorre em meio a um cenário de forte mobilização, desgaste após cinco meses de negociações sem avanços e ameaça de judicialização do conflito.
“A proposta não é boa, mas será submetida à categoria”

Em entrevista ao Portal Vermelho, o secretário-geral do Sintect-SP, Ricardo Rodrigues, o Peixe, foi direto ao avaliar o conteúdo apresentado. “A proposta não é boa. Não é a proposta que nós queríamos”, afirmou. Segundo ele, o movimento grevista foi resultado do cansaço da categoria diante da “enrolação” da empresa, que prorrogou o acordo coletivo sem apresentar uma contraproposta concreta desde a data-base, em agosto.
Peixe explicou que a proposta foi construída no TST durante audiência de mediação no dia 16, mas só foi formalizada no dia seguinte, quando muitas assembleias já estavam em curso, o que levou à deflagração da greve.
O que diz a proposta mediada pelo TST
De acordo com documentos oficiais do TST e da ECT, a proposta prevê vigência de dois anos e a renovação de 79 cláusulas do ACT, preservando a maior parte dos direitos históricos da categoria. Entre os principais pontos estão:
- reajuste salarial de 5,13% (100% do INPC) a partir de janeiro de 2026, com pagamento em abril;
- novo reajuste de 100% do INPC a partir de agosto de 2026;
- manutenção do adicional de férias de 70%, considerado um dos maiores diferenciais do acordo;
- preservação do plano de saúde, vale-alimentação/refeição, licenças ampliadas, auxílio-creche e demais cláusulas sociais.
Por outro lado, a proposta não contempla o pagamento retroativo de agosto a dezembro de 2025, nem a manutenção do vale-extra pago em dezembro. Cláusulas como trabalho em domingos e feriados com pagamento diferenciado e regras sobre ponto eletrônico têm validade limitada a um ano.
Incerteza e ameaça de dissídio coletivo
Peixe alertou que a rejeição da proposta pode levar a empresa a ingressar com dissídio coletivo, transferindo ao Judiciário a definição das cláusulas. “Dissídio é uma incógnita, ainda mais em período de recesso do TST. A gente não sabe o que pode acontecer”, destacou.
O próprio despacho do ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, vice-presidente do TST, aponta que a rejeição pode reduzir significativamente o espaço para preservação dos benefícios, uma vez que não há garantia de manutenção integral dos direitos em julgamento.
Mobilização forte em São Paulo e no país
Segundo o Sintect-SP, cerca de 70% do efetivo no estado de São Paulo aderiu à greve, com piquetes ativos e unidades operacionais paralisadas. Nacionalmente, o movimento apresenta um quadro heterogêneo: 11 sindicatos deflagraram greve, 16 mantêm estado de greve e outros realizam assembleias nesta semana para deliberar.
Apesar das divergências entre entidades, Peixe avalia que a paralisação começou forte nas grandes cidades e segue com grande disposição de luta, especialmente em São Paulo, Rio de Janeiro e outras capitais.
Cobrança por aporte e críticas ao governo
Outro eixo central da mobilização é a cobrança por um aporte financeiro do Governo Federal. Para o dirigente sindical, não basta retirar os Correios do plano de privatização. “O governo precisa investir, modernizar e estruturar a empresa, sem retirar direitos”, afirmou.
Peixe criticou o sucateamento da estatal, a precarização das condições de trabalho e a falta de manutenção de veículos, além de apontar concorrência desigual com empresas privadas de logística baseadas em terceirização e pejotização.
Decisão nas mãos da categoria
O Sintect-SP reforça que a assembleia do dia 23 será soberana. A proposta será apresentada ponto a ponto, com transparência, para que os trabalhadores decidam se aprovam o acordo ou mantêm a greve. “Nós vamos cumprir nosso papel. Quem decide é a categoria”, afirmou Peixe.
Independentemente do resultado, o dirigente ressalta que a luta dos trabalhadores dos Correios expõe um debate mais amplo: o futuro da empresa, o papel do Estado e a valorização de quem garante diariamente um serviço público essencial.