O ministro Luís Roberto Barroso sinalizou que pode derrubar o artigo 19 do Marco Civil da Internet durante o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a responsabilidade das plataformas digitais em relação a conteúdos publicados por terceiros, conforme informações do Valor Econômico.
Em seu voto, ainda não concluído, Barroso expressou preocupação com a burocracia envolvida no processo de retirada de conteúdos, mesmo após ordens judiciais, conforme previsto pelo artigo 19. O texto atual determina que as plataformas só podem ser responsabilizadas se não removerem, dentro do prazo estipulado, conteúdos ilícitos identificados por decisão judicial.
Barroso destacou as etapas exigidas pelo artigo, que incluem a emissão de uma ordem judicial, o não cumprimento por parte das plataformas e o respeito a prazos técnicos para a remoção. “Vejam a burocracia que existe mesmo com a ordem judicial para se remover [o conteúdo]. E a responsabilidade [das plataformas] só surge depois, pelo artigo 19”, afirmou o ministro no plenário.
A posição de Barroso foi acompanhada por um movimento da Advocacia-Geral da União (AGU), representada por Jorge Messias, que defendeu a inconstitucionalidade do artigo 19. Messias argumentou que o dispositivo cria uma “imunidade” que favorece a omissão das plataformas diante da desinformação, prejudicando a democracia brasileira e a economia.
Ele citou como exemplo a necessidade de recorrer ao STF para suspender transmissões ao vivo durante os ataques de 8 de janeiro de 2023, quando os prédios dos três Poderes foram invadidos. “Estamos tratando de algo maior, da sobrevivência do estado democrático de direito”, declarou Messias.
O ministro Alexandre de Moraes reforçou as críticas, afirmando que o episódio de 8 de janeiro exemplifica a “total falência” da autorregulação das plataformas digitais. “É faticamente impossível defender que o sistema de autorregulação funcione depois do 8 de janeiro. Tudo foi organizado pelas redes”, afirmou Moraes.
Jorge Messias também apresentou argumentos sobre os impactos do “ecossistema de desinformação” gerado pelas plataformas, defendendo exceções ao artigo 19, como a obrigatoriedade de remoção de conteúdos relacionados à proteção de crianças e adolescentes, integridade eleitoral, ilícitos penais e desinformação, mesmo sem ordem judicial. A proposta vai de encontro à ideia original do Marco Civil da Internet, que previa que a palavra final sobre o que deve ser removido cabe sempre ao Judiciário.
No encerramento da sessão, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, afirmou que o julgamento deve ser concluído ainda este ano, antes do recesso do Judiciário em 20 de dezembro. “Vamos tentar fazer o possível para concluir este julgamento ainda este ano, não deixar pendente nas férias”, disse Barroso.
O julgamento analisa dois recursos que discutem a moderação de conteúdo e a responsabilidade de provedores, sites e redes sociais por conteúdos de terceiros. Um dos casos envolve a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil, que limita a responsabilização das plataformas a casos de descumprimento de ordens judiciais. O outro aborda questões de moderação de conteúdo antes da vigência do Marco Civil.
O artigo 19 do Marco Civil da Internet tem sido tema de intensos debates por estabelecer que as plataformas não podem ser responsabilizadas civilmente por conteúdos de terceiros, a menos que descumpram uma ordem judicial de remoção. Essa regra dá às empresas liberdade para criar e aplicar suas próprias políticas de moderação de conteúdo, sem a obrigação de atender a pedidos extrajudiciais de usuários.