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Juros: nunca antes neste país!

por Paulo Kliass

A divulgação da edição mais recente do Relatório de Política Fiscal do Banco Central (BC) no final de julho confirmou, mais uma vez, a tendência altista no volume de juros pagos regularmente pelo Estado brasileiro aos detentores de títulos de dívida pública de nosso País. Uma parcela significativa dos gastos realizados pelo governo federal sempre foi direcionada para tal compromisso, mas esses valores nunca estiveram na linha de mira dos agentes a serviço do financismo, todos eles sempre muito alertas para denunciar a suposta gastança da administração pública.

O fato é que há décadas foi implementada na seara das finanças públicas oficiais uma metodologia que deixa à parte do cálculo as chamadas despesas financeiras. Assim, por meio de tal armadilha sutil, as preocupações dos “especialistas” em política fiscal se restringem às chamadas contas “primárias”. Ora, a partir de tal regra arbitrária, como que por uma tautologia auto-explicável, apenas são utilizadas as contas ditas “primárias”, vale dizer, as contas não-financeiras. É exatamente por isso que todo o esforço sugerido pelas vozes do austericídio se concentra em sugestões de cortes orçamentários em rubricas de saúde, previdência social, saúde, segurança pública, assistência social, saneamento, salários de servidores, investimentos, etc.

Juros: recorde atrás de recorde!

Mas o fato é que, apesar disso, as despesas com juros continuam sendo as que mais crescem no conjunto dos gastos estatais. Ao longo do mês de junho, o montante atingiu a marca mensal de R$ 95 bilhões. Como diria o Presidente Lula, “quase” nunca antes na história deste País houve tamanho gasto público em apenas 30 dias. Sim, isso porque a marca recorde ainda não foi superada: foram R$ 98 bi em junho de 2022. Na verdade, valores expressivos também haviam sido atingidos durante o seu terceiro mandato, quando ao longo de agosto e setembro do ano passado o sistema financeiro foi agraciado, respectivamente, com R$ 84 bi e R$ 82 bi a título de pagamento de juros da dívida pública.

O gráfico abaixo demonstra que dos 9 maiores valores mensais da série histórica apresentada pelo BC, 6 deles ocorreram ao longo do atual mandato de Lula. Como o montante pago a cada mês depende basicamente do valor total do estoque da dívida pública e do patamar fixado pelo Comitê de Política Monetária (COPOM) para a SELIC, pode-se perceber que a manutenção da remuneração referencial da taxa de juros em níveis muito elevados é um dos principais fatores responsáveis pelo gasto financeiro ocorrido.

Por outro lado, talvez seja interessante observar uma tendência de mais longo prazo, sem nos prendermos a eventuais variações sazonais ou extraordinárias de algum mês em especial, que podem ser provocadas por variações inesperadas e pontuais. Assim, se considerarmos o valor acumulado ao longo de um semestre, o que se depreende é que também neste tipo de amostra os recordes acontecem em épocas mais recentes.

Ao longo dos primeiros seis meses do ano presente, a série histórica do BC nos oferece um montante inédito a título de despesas com juros. Entre janeiro e junho de 2024 foram transferidos R$ 455 bi ao sistema financeiro para cumprir a remuneração dos papéis da dívida pública, o que corresponde a uma média mensal de R$ 76 bi. Esse número representa um crescimento de 35% em relação ao valor dispendido no primeiro semestre de 2023, quando foram gastos R$ 337 bi. Já este montante, por sua vez, representa um aumento de 18% sobre os R$ 286 bi do último exercício de Bolsonaro. Finalmente, esse valor de 2022 significou uma elevação de 96% sobre o quanto foi gasto em 2021.

Caso o interesse seja o de comparar aquilo que é efetivamente pago sob a forma de juros da dívida pública ao longo de 12 meses, o quadro não é alterado de forma significativa. Os valores sob a atual gestão de Lula seguem mantendo a posição de destaque no pódio. A partir da observação de um crescimento ao longo dos últimos anos, a tendência será a de encerrar o ano de 2024 com valor também superior ao do ano passado. O cálculo foi aproximado considerando-se o período julho de 2023 até a última informação disponível, ou seja, o dado relativo a junho do ano corrente.

O fato concreto é que nenhuma outra rubrica orçamentária da abordagem “primária” tem observado tal ritmo de crescimento. Em 2021 o total de despesas com juros sai de R$ 448 bi para chegar aos atuais R$ 836. Este movimento significa um aumento de 86% em apenas 3 anos no volume de gastos financeiros. Ou seja, uma média anual de 23%, índice que deverá ainda mais alto quando encerrarmos as contas do segundo semestre de 2024. Como a abordagem oficial exclui do cálculo do desempenho fiscal esse dispêndio com os compromissos de remuneração do endividamento público, o resultado concreto é que inexistem mecanismos de teto, de limite ou de contingenciamento para as despesas com juros. A prática da austeridade fiscal e o combate à “gastança” se resume, dessa forma, às políticas sociais e aos investimentos públicos.

Finalmente, vale registrar o comportamento de outro fator que torna ainda mais dramática a continuidade de tal política que privilegia exclusivamente os gastos financeiros em relação aos demais. Na verdade, trata-se de sua ineficiência no que se refere à sua proposição básica. O argumento central daqueles que defendem a austeridade fiscal primária e o fiel compromisso com o cumprimento das obrigações derivadas da dívida pública é que tal procedimento provocaria a redução do peso do endividamento sobre as demais variáveis da economia.

Ocorre que a observação atenta da evolução dos montantes da Dívida Líquida do Setor Público (DLSP) aponta em direção contrária. Apesar de todo o esforço realizado para cumprir com o pagamento de juros da dívida, o estoque total da mesma continua crescendo ao longo dos exercícios. Esse total do endividamento tem crescido a uma média superior a 11% ao longo dos últimos anos. Os dados oficiais do BC apontam para uma elevação dos R$ 5 trilhões observados em 2021 para os atuais R$ 6,9 tri de junho de passado.

O que se pode concluir a respeito do que foi analisado é que alguma coisa de muito grave não vai bem na combinação da política fiscal com a política monetária. Como se diz no popular, ao que tudo indica o governo continua enxugando gelo. O modelo exige da grande maioria da população um enorme esforço para cumprir com as metas da austeridade fiscal (antes com o teto de gastos do Temer; agora com o novo arcabouço fiscal do Haddad), ao passo que permite um completo relaxamento na liberação de recursos para o cumprimento dos “contratos” com o financismo. Assim, os “contr

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Last Update: 06/08/2024