É justa a taxação de pessoas ricas que não pagam o tributo para compensar as perdas de arrecadação com a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil.

Especialistas em economia e parlamentares petistas membros da Comissão Especial sobre alteração da Legislação do Imposto de Renda (PL 1.087/2025) afirmaram, durante audiência pública nesta terça-feira (10/6), que é mais do que justa a taxação de pessoas ricas que não pagam o tributo para compensar as perdas de arrecadação com a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil e desconto para quem recebe acima desse valor até o limite de R$ 7 mil. Segundo eles, esse é um princípio constitucional de progressividade tributária, que historicamente vem sendo desrespeitado no País.

Durante sua apresentação, a professora do Instituto de Economia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Luíza Nassif Pires, explicou que o Imposto de Renda não tem apenas o propósito de arrecadar recursos para financiar o Estado e suas políticas públicas. Segundo ela, o tributo também tem que ser usado para reduzir as desigualdades de renda no País. “A progressividade, no topo, por si só já é extremamente importante. A carga tributária recai, proporcionalmente no Brasil, mais sobre a menores rendas”, destacou.

Taxar os mais ricos

Como exemplo da importância de se taxar os mais ricos, principalmente os que têm ganhos atualmente isentos do tributo, como lucros e dividendos, ela apresentou dados de um estudo do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (MADE) que apontam a enorme desigualdade de renda no País. Segundo ele, enquanto parcela dos 50% mais pobres do Brasil tem 9,1% da renda, apenas 0,1% detém 11,9% da totalidade da renda nacional.

A professora da Unicamp disse ainda que essa desigualdade tem raça e gênero. Entre os ricos que têm rendimentos isentos e não pagam IR, cerca de 80% são homens e brancos. “O projeto de lei pretende, exatamente, reverter, ainda que parcialmente, esta injustiça tributária. O que o texto quer é começar a criar uma progressividade a partir R$ 50 mil (em ganhos hoje não tributados), chegando a um total de 10% de alíquota efetiva, mitigando, assim, a injustiça em relação à equidade e a injustiça racial e de gênero”, argumentou.

Concentração de renda

Deputado Merlong Solano presidiu a audiência pública na Comissão Especial. Foto: Gabriel Paiva

O deputado Merlong Solano (PT-PI), vice-presidente da Comissão Especial, defendeu a aprovação do projeto de lei como forma de atacar a concentração de renda que se tornou “disfuncional” no Brasil. Ao lembrar do famoso economista John Maynard Keynes (‘Pai’ da doutrina econômica conhecida como Keynesianismo), que demonstrou que o “motor da economia é o consumo”, Merlong destacou que o projeto vai aumentar o poder de compra de parte dos brasileiros, beneficiando principalmente o empresariado.

“Quando você aumenta recursos no bolso de quem ganha até R$ 7 mil, você tem o impacto imediato na economia. O empresariado do comércio, do setor agrário, da indústria, e até do setor financeiro, deveria ter a percepção de que, se pagar um pouquinho (de IR) para essa grande massa da pirâmide consumir mais, isso se reverterá em aumento de oportunidade de negócios”, ressaltou.


Empresários querem mudar o projeto

Representantes de setores empresariais presentes à audiência pública afirmaram que apoiam a isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil e o desconto até R$ 7 mil, mas pediram mudanças no projeto. Sem apresentar dados de estudos ou pesquisas, o consultor tributário da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, Gilberto Alvarenga, criticou a taxação de dividendos como forma de compensar a perda de arrecadação com a isenção proposta pelo governo.

Segundo ele, essa medida pode afetar futuros investimentos nas empresas por conta da frustração de expectativas em relação à distribuição de lucro por meio de dividendos.

O deputado Jorge Solla (PT-BA), por sua vez, criticou a ideia de que taxar dividendos possa reduzir os investimentos realizados em empresas no País. “É uma contradição absurda dizer que taxar dividendos pode reduzir investimentos. O dividendo é uma parte do lucro apropriado pelo sócio que não se transformou em investimento pela empresa, isso me parece óbvio”, afirmou.

Já o Superintendente de Economia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Mário Sérgio Carraro Teles, defendeu a tributação de dividendos. No entanto, propôs que ela seja compensada com aumento na tributação das empresas de apostas esportivas (as Bets) e a tributação das Fintechs (empresas de comércio digital com sede no exterior), com alíquotas de 15% sobre as operações destas empresas.

Ele ressaltou ainda que a taxação dos lucros e dividendos divididos pelas empresas com sócios a acionistas, venha atrelada à redução da alíquota do Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), dos atuais 34% para 23%. Segundo ele, a cobrança conjunta do IR com os dividendos elevaria demais a carga total de tributos de empresas e empresários.

Especialista e petistas refutam mudanças no projeto do IR

Deputada Natália Bonavides. Foto: Gabriel Paiva

O pesquisador do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) Pedro Carvalho refutou a tese de que a taxação de dividendos proposta pelo projeto de lei seja exagerada. Segundo ele, o Brasil tem a 4º menor taxa tributária agregada (34% de IRPJ + 0% taxação de dividendos) entre todos os países membros ou parceiros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Somente Estônia, Hungria e Grécia possuem taxas tributárias menores que o Brasil.

Como exemplo, na América Latina o México (30% de IRPJ + 42% sobre dividendos), o Chile (27% IRPJ + 40% dividendos) e a Colômbia (35% IRPJ +39% dividendos) tem taxas tributárias maiores do que a brasileira. Nos Estados Unidos, a taxa total chega a 46,9% (26,4% IRPJ + 28,7% dividendos), enquanto que na França, que tem a 2ª maior taxa, chega a 57,8% (36,1% IRPJ + 34% dividendos).

Já a deputada Natália Bonavides (PT-RN) lamentou que parte da elite econômica do País se coloque contra uma proposta que é do interesse da maioria do povo brasileiro. “A única razão de ainda existir esse sistema tributário é porque neste Congresso a classe dominante é super-representada e a maioria dos que a compõe está entre o 0,1% que detém a maior parte dos recursos e pagam menos impostos que o restante da população. Porque se esse assunto fosse colocado para o povo decidir, via plebiscito ou referendo, não tenho dúvida de que não seria agora, mas teríamos uma tributação mais justo a muito tempo atrás”, ressaltou.

 

Héber Carvalho

 

 

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Last Update: 10/06/2025