Nem mesmo a retomada da atividade econômica levou o Banco Central a tirar o pé do acelerador dos juros: na última reunião de Roberto Campos Neto à frente da autoridade monetária, o Copom (Comitê de Política Monetária) decidiu elevar a taxa Selic em 1 ponto percentual, para 12,25% ao ano, em decisão unânime.

Segundo o comunicado divulgado após a reunião, “o cenário mais recente é marcado por desancoragem adicional das expectativas de inflação, elevação das projeções de inflação, dinamismo acima do esperado na atividade e maior abertura do hiato do produto, o que exige uma política monetária ainda mais contracionista”.

Ao mesmo tempo, o Copom entende que a decisão de aumentar o ajuste em uma magnitude maior “é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego”.

Se o cenário mais adverso para a inflação for confirmado, o colegiado prevê ajustes de mesma magnitude nas próximas duas reuniões.

“A magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerá da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos”, ressaltou o colegiado.

Sobre os desdobramentos da política fiscal sobre a política monetária e os ativos financeiros, o Copom afirma que “a percepção dos agentes econômicos sobre o recente anúncio fiscal afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio. Avaliou-se que tais impactos contribuem para uma dinâmica inflacionária mais adversa”.

Clique aqui e leia a íntegra do comunicado do Copom sobre o aumento dos juros.

Repercussão no mercado

A decisão ficou acima inclusive das projeções de mercado, que consideravam um ajuste de 0,75 ponto percentual na taxa Selic. Enquanto analistas citam a mudança de comando do Banco Central e o componente externo como justificativas para a decisão do Copom, representantes da indústria criticaram o momento para a realização de tal ajuste.

Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, o momento atual é “totalmente inoportuno” para um aumento da taxa básica de juros.

“Seria uma medida excessiva em termos de controle da inflação e apenas traria restrições adicionais ao crescimento do país. A CNI avalia que a prioridade deve ser a implementação de uma agenda que viabilize a retomada dos cortes na taxa de juros. Sem esse esforço, atrativos do nosso mercado podem ser anulados, frustrando muitos projetos de investimentos, que ficarão apenas no papel”, avalia Alban.

A surpresa pela intensidade do ajuste também foi vista entre os analistas. “Tivemos uma alta de 1% nessa última reunião presidida aqui pelo Roberto Campos Neto. O mercado estava dividido entre uma alta de 0,75 e 1%, então a decisão foi mais pesada, foi mais dura. E o comunicado também”, explica Marcelo Bolzan, CGA, estrategista de investimentos e sócio da The Hill Capital.

Em nota, Bolzan explica que o comunicado apresenta algumas mudanças em relação às últimas reuniões. “Comunicado deixa bem claro aqui que a dinâmica inflacionária está mais adversa. E esse cenário atual é marcado por uma desancoragem adicional das expectativas de inflação, então veio com um tom mais pesado aqui”.

Na visão de Ângelo Belitardo, gestor da Hike Capital, o Copom mostrou preocupação com uma eventual mudança de magnitude, por parte do FED, na condução da política monetária, assim como na expectativa futura de inflação e no comportamento do hiato do produto.

“O atual cenário de incertezas em relação à tramitação do pacote de gastos e do direcionamento das despesas por parte do governo tem levado a cotação do dólar para patamares recordes, o que deverá ser refletido em inflação ao longo dos próximos meses”, destacou Belitardo, ressaltando que a sinalização de novos ajustes leva a um aumento da volatilidade da curva de juros, afetando negativamente os ativos de renda fixa com prazo de vencimento longo e especialmente os indexados ao IPCA com elevados spreads.

A transição de comando do Banco Central também foi citada por analistas. Segundo Sidney Lima, analista da Ouro Preto investimentos, o aumento da taxa Selic está alinhada com a necessidade de uma política monetária que ancore as expectativas inflacionárias, especialmente dentro de um contexto de troca de comando do Bacen.

“Essa continuidade nas altas pode gerar mais confiança nas intenções do Comitê, dada a troca de liderança, mas também traz custos para a economia. Juros mais elevados encarecem o crédito, limitam o consumo e retardam os investimentos, o que pode impactar o crescimento no curto prazo. No entanto, essa estratégia é fundamental para garantir a estabilidade econômica nos próximos anos, consolidando um controle mais efetivo sobre a inflação no médio e longo prazo”, diz Lima.

Na visão de Bruno Corano, economista da Corano Capital, a decisão unânime da equipe – boa parte indicada pelo atual governo – chama a atenção. “Isso responde o questionamento que existia no passado Se esse grupo técnico iria realmente ser independente (…) Por outro lado, triste, em perceber que os problemas que estão gerando o aumento de juros são em quase sua totalidade motivados pela ineficiência da gestão do próprio governo”, pontuou

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Last Update: 11/12/2024