O jurista norte-americano Ilya Somin, autor da ação judicial que já suspendeu temporariamente as tarifas recíprocas impostas por Donald Trump a dezenas de países, afirmou que as novas tarifas de 50% aplicadas exclusivamente contra o Brasil também são “claramente ilegais” e têm grandes chances de cair na Justiça. 

Em entrevista à colunista Mariana Sanches, do UOL, Somin avaliou que a medida assinada por Trump no final de julho se sustenta sobre a mesma base jurídica frágil, a Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional (IEEPA), de 1977, que já foi contestada com sucesso em outro caso.

Segundo o jurista, a IEEPA não autoriza o presidente a distribuir tarifas de forma indiscriminada, como vem fazendo o governo Trump desde o início de seu segundo mandato. 

A lei exige a existência de uma emergência nacional que represente uma ameaça “incomum e extraordinária” à economia ou à segurança dos Estados Unidos — o que, na visão de Somin, está ausente tanto no caso das tarifas recíprocas quanto na imposição de sobretaxas ao Brasil. 

“No caso do Brasil, independentemente do que você pense sobre o processo contra o ex-presidente (Jair) Bolsonaro, é muito difícil argumentar que isso seja de alguma forma uma emergência ou uma ameaça para os EUA. Se esse homem for para a prisão, o que talvez devesse mesmo acontecer, isso não causará nada aos Estados Unidos, certo? E, portanto, é simplesmente implausível que argumentemos que se trata de uma ameaça extraordinária e incomum”, argumenta Somin.

A decisão que derrubou temporariamente as tarifas anteriores foi proferida por unanimidade pela Corte Internacional de Comércio dos EUA. 

Na ocasião, a juíza Jane A. Restani argumentou que os poderes presidenciais não são ilimitados e criticou o raciocínio jurídico da Casa Branca, que, se aceito, permitiria ao presidente justificar tarifas com base em qualquer motivo “maluco”, como uma escassez de manteiga de amendoim. 

O caso agora tramita no Tribunal de Apelação do Circuito de Washington, que deve emitir novo veredicto entre o fim de agosto e o início de setembro. 

De acordo com Somin, uma eventual confirmação da ilegalidade das tarifas recíprocas implicará automaticamente na queda da sobretaxa de 50% imposta ao Brasil. “Não é 100% certo, mas há 95% de certeza de que isso também ditará o resultado do caso do Brasil”, afirmou.

Paralelamente, uma empresa norte-americana que importa suco de laranja — um dos cerca de 700 produtos brasileiros afetados — abriu uma ação específica contra as tarifas voltadas ao Brasil, mas o processo ainda aguarda análise em primeira instância. 

Trump justificou a nova taxação alegando que o governo Lula representa uma ameaça à segurança dos EUA, citando supostas violações à liberdade de expressão e perseguição política ao ex-presidente Jair Bolsonaro. 

Para Somin, essas alegações não têm respaldo legal e ferem o princípio constitucional da separação de poderes. “Assim como no Brasil, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são independentes”, disse o jurista.

A Constituição dos EUA estabelece que o poder de impor tarifas cabe ao Congresso. O presidente só pode exercer esse poder em condições muito específicas e com base jurídica sólida. O que está em jogo, segundo Somin, é um perigoso precedente de abuso de autoridade: 

“O governo está dizendo que o presidente pode impor tarifas a qualquer nação que ele quiser, por qualquer motivo que ele quiser, a qualquer hora que ele quiser, e essencialmente não há limite para esse poder que ele está reivindicando”, disse.

As declarações de Somin reforçam a posição do governo brasileiro de que as tarifas são um ataque à soberania nacional. 

Desde que a Casa Branca condicionou as negociações comerciais à suspensão do processo judicial contra Bolsonaro, o Itamaraty e o Palácio do Planalto vêm reiterando que não aceitarão qualquer forma de ingerência estrangeira sobre o Judiciário. 

Ao apontar a ilegalidade da medida e prever sua derrubada nos tribunais norte-americanos, o jurista norte-americano fornece mais um argumento jurídico e político para a contestação do tarifaço de Trump.

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Last Update: 06/08/2025