Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) está pagando o preço por sua reação – ora oportunista, ora desastrada – ao tarifaço de 50% imposto pelo presidente norte-americano, Donald Trump, ao Brasil. Nos últimos dias, aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), representantes do empresariado e jornalões da grande mídia paulista atacaram duramente o governador, que viveu um raro momento de isolamento político.
Nas redes sociais, as postagens sobre sua atuação na crise também foram majoritariamente desfavoráveis. Um estudo da AP Exata, com base em mensagens publicadas no X (ex-Twitter) entre sábado (11) e segunda-feira (13), explicita o revés: quase dois terços das críticas sofridas pelo governador partiram de perfis alinhados à direita e ao bolsonarismo.
A carta em que Trump anunciou sua retaliação ao governo Lula e às instituições brasileiras foi divulgada em 9 de julho. Menos de três horas depois, o Estadão surpreendeu ao antecipar um editorial intitulado “Coisa de mafiosos”, no qual repudia o presidente norte-americano, defende a “reação inicial” de Lula e solta o primeiro de vários esculachos seguidos a Tarcísio.
Segundo o Estadão, “é absolutamente deplorável que ainda haja no Brasil quem defenda Trump, como recentemente fez o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que vestiu o boné do movimento de Trump, o Maga (Make America Great Again), e cumprimentou o presidente americano depois que este fez suas primeiras ameaças ao Brasil por causa do julgamento de Bolsonaro”.
A Folha de S.Paulo só se manifestou no dia seguinte. Seu editorial “Chantagem rasteira de Trump não passará” seguiu a linha do Estadão, mas foi ainda mais incisivo – e explícito – em relação a Tarcísio: “Chegou a hora de lideranças como o governador Tarcísio de Freitas escolherem de que lado estão. Ou bem Tarcísio defende os exportadores paulistas e a soberania brasileira ou continua posando de joguete de boné de um agressor estrangeiro e da família Bolsonaro”.
Os dois jornais insistiram nas cobranças a um tal ponto que Tarcísio – o presidenciável preferido da grande mídia para enfrentar Lula nas eleições 2026 – teve de recuar. Em vez de bajular Bolsonaro e tentar responsabilizar o presidente brasileiro pelo tarifaço, o governador apostou numa agenda de contenção de danos, promovendo agendas com representantes do empresariado e do governo norte-americano.
Desta vez, porém, foi o próprio bolsonarismo que incrementou a artilharia anti-Tarcísio, a começar pelo deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Em entrevista à Folha, Eduardo lamentou a reunião do governador com Gabriel Escobar, encarregado de negócios da embaixada dos Estados Unidos em Brasília. “(Tarcísio) queria buscar uma alternativa lateral. É um desrespeito comigo”, choramingou o “filho 03” do ex-presidente.
Quando Tarcísio lhe respondeu que estava apenas “olhando” para o empresariado paulista, Eduardo subiu o tom: “Prezado governador @tarcisiogdf, se você estivesse olhando para qualquer parte da nossa indústria ou comércio estaria defendendo o fim do regime de exceção que irá destruir a economia brasileira e nossas liberdades. Mas como, para você, a subserviência servil (sic) as elites é sinônimo de defender os interesses nacionais, não espero que entenda”.
Não deu outra: apoiadores de Bolsonaro multiplicaram as ofensas nas redes, e hashtags como #TarcisioTraidor viralizaram. Conforme o estudo da AP Exata, “a crítica central nesse grupo é a de que o governador estaria se distanciando da pauta bolsonarista, como a anistia, e adotando uma postura independente nas negociações, o que foi interpretado como uma traição ao núcleo ideológico mais duro”.
A Folha, a esta altura, classificava Tarcísio como “uma vítima certa” do “tiroteio entre Trump e Lula”. Para o jornal, “sua inabilidade no manejo do episódio causou espanto mesmo entre aqueles que acreditam em suas juras de moderação”. Esse editorial, em particular, lembra que Tarcísio foi alvo de “uma condenação pelo setor produtivo, particularmente o paulista”, por sua “dependência do bolsonarismo”.
Até mesmo o empenho do governador para ter protagonismo na resolução do impasse recebe reparos: “O movimento ainda é atabalhoado e eivado de política rasa, como a disputa pela presença dos mesmos empresários já convocados pelo governo federal para discutir a crise (..). Até aqui o governador colhe o pior de dois mundos, além de presenciar Lula ganhar um ativo político em momento de desgaste”.
O Estadão, por sua vez, dá mais um ultimato em seu quarto editorial em uma semana com advertências ao governador. “A duras penas, Tarcísio recebeu uma das maiores lições de sua curta experiência como mandatário: ninguém se associa aos vândalos políticos do clã Bolsonaro impunemente”, enfatiza o jornal. “A boa notícia, para Tarcísio, é que ainda há uma porta de saída honrosa aberta diante do governador paulista: esconjurar Bolsonaro, pública e peremptoriamente.”
O discurso de Tarcísio, desde o último sábado (12), passou a ser povoado de clichês como “o momento demanda união de esforços e sinergia”, “a gente precisa estar de mãos dadas” e “vamos deixar a questão política de lado”. Até o momento, parece pouco aos ouvidos tanto dos bolsonaristas quanto da grande mídia. Sem margem para mais vacilações, o governador terá de fazer uma “escolha de Sofia” e, seja qual for sua decisão, não escapará de algum prejuízo político-eleitoral.