Fim de incentivo fiscal eleva ICMS para 18% e trava setor plant-based
O Governo do Estado de São Paulo aumentou a alíquota de ICMS sobre o leite vegetal à base de aveia, encerrando o benefício fiscal que reduzia a carga para 7% desde 2023.
Com a nova regra, o imposto subiu para 18%, elevando os preços nas prateleiras e pressionando empresas do setor. A decisão contraria sinalizações anteriores de renovação do incentivo e pegou o mercado de surpresa.
Entre os impactos imediatos estão descontinuação de linhas de produção, retração no consumo e risco de demissões. A medida também afeta produtores de aveia e paralisa investimentos em um setor que vinha em crescimento acelerado no estado.
Crescimento interrompido e risco de saída de empresas
De acordo com Juliana Bechara, representante da Associação Base Planta — que reúne marcas como Nude, Vida Veg, NotCo, A Tal da Castanha e Natural One —, o aumento do imposto prejudica uma cadeia que vinha crescendo entre 20% e 25% ao ano.
“São Paulo atraía investimentos, gerava empregos e aumentava a arrecadação com um setor moderno e de alto valor agregado. Agora, perde competitividade e capacidade de escala”, afirma.
A Nude, por exemplo, já estuda transferir sua sede para o Paraná, onde o leite vegetal tem incentivos. Segundo Alexander Appel, cofundador da marca, a mudança fiscal exigiria um aumento mensal de R$ 1,5 milhão em vendas só para manter o ponto de equilíbrio financeiro.
Indústria suspende projetos e demissões podem ocorrer
O impacto já chegou à indústria.
Rodrigo Funaro, gerente-geral da Natural One, afirma que a empresa precisará suspender a produção de leite de aveia no interior do estado.
“A planta que investimos, com capacidade para 60 mil garrafas por hora, não se sustenta mais com o novo imposto. A operação se tornou inviável”, afirma.
A Positive Company, dona da marca A Tal da Castanha, também vê reflexos diretos.
“Mesmo com custos de produção parecidos com o leite de vaca, nossos produtos chegam a custar três a quatro vezes mais na gôndola, por causa da alíquota cheia, da Substituição Tributária e da MVA elevada”, explica Felipe Carvalho, cofundador da empresa.
Cadeia produtiva e consumidor também sentem os efeitos
A alta de impostos compromete toda a cadeia, desde o agricultor familiar até o consumidor final.
Com preços mais altos, as empresas reduzem pedidos, renegociam contratos e pressionam os produtores rurais. Isso pode levar à substituição da cultura da aveia por outras, impactando a oferta.
Hoje, o litro do leite de aveia chega a custar R$ 20 nas gôndolas, contra R$ 8 de um leite de vaca premium — que segue com incentivos fiscais e menor tributação.
Na avaliação de Álvaro Gazolla, da Vida Veg, o imposto é o principal fator que afasta o consumidor do produto vegetal.
“A barreira não é o lucro da indústria, mas a carga tributária. O consumidor quer escolher, mas o bolso impede”, diz.
Receita aumentou com imposto menor
Mesmo com a alíquota reduzida, a arrecadação do ICMS cresceu.
Em 2023, com imposto de 7%, o recolhimento foi de R$ 1,1 milhão. Já em 2024, as empresas associadas à Base Planta somaram mais de R$ 13 milhões pagos aos cofres do estado.
Para a entidade, trata-se de um exemplo de política pública eficiente: com menor carga, o volume cresceu, e a arrecadação também.
Demanda por isonomia tributária
A Base Planta pede que as bebidas vegetais tenham tratamento tributário equivalente ao dos laticínios.
Em países como Inglaterra e Alemanha, a alíquota é igual para ambos. No Brasil, a diferença chega a 40% por causa dos subsídios ao leite de vaca.
“A indústria plant-based está instalada em São Paulo. O leite de vaca, em sua maioria, não é produzido aqui. Ainda dá tempo de rever a decisão e alinhar discurso e prática”, afirma a associação.
Tendência global, impacto social e alimentar
Além dos impactos econômicos, o setor defende o papel das bebidas vegetais na promoção da saúde, inclusão alimentar e sustentabilidade.
Elas não contêm lactose, colesterol ou gordura trans, são livres de glúten e oferecem fibras, cálcio, ferro e proteínas.
Entre 2017 e 2022, o mercado de alimentos plant-based cresceu 50% no Brasil. Em 2024, a categoria movimentou R$ 450 milhões, com alta de 22%.
Setor pede diálogo e equilíbrio
A Base Planta reafirma disposição para dialogar com o governo estadual.
“Sabemos dos desafios fiscais, mas acreditamos em soluções equilibradas. O setor quer contribuir com emprego, arrecadação e inovação. Precisamos de um ambiente tributário que reflita isso”, conclui Juliana Bechara.