O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou, na terça-feira, 10, o recurso do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) e confirmou a obrigação de pagar R$ 30 mil à deputada Duda Salabert (PDT-MG) por danos morais e transfobia. A decisão, assinada pela ministra Maria Isabel Gallotti, é definitiva.

O processo teve início em 2021, após declarações do então vereador de Belo Horizonte durante a campanha eleitoral de 2020.

Na ocasião, Nikolas Ferreira questionou a identidade de gênero de Duda Salabert, também vereadora à época, ao perguntar “se os documentos de Duda seriam no feminino ou masculino” e ao afirmar, em entrevista, “Eu ainda irei chamar-la de ‘ele’. Ele é homem. É isso o que está na certidão dele, independentemente do que ele acha que é”.

A sentença original, proferida em primeira instância, condenou Nikolas a indenizar Salabert em R$ 30 mil por danos morais decorrentes de discurso transfóbico.

Em recurso ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o parlamentar teve o pedido negado. A defesa, então, recorreu ao STJ, alegando ausência de ato ilícito e invocando a liberdade de expressão, mas o recurso foi rejeitado.

No acórdão, a ministra Gallotti enfatizou que “o réu […] decidiu-se a respeito da identidade de gênero da autora, utilizando um tom jocoso, com objetivo claro de expor ao ridículo e atacar a autoestima de Duda” e observou que “não se pode admitir que pensamentos manifestados de forma abusiva exponham indevidamente a intimidade ou acarretem danos à honra e à imagem das pessoas”. O voto da relatora foi acompanhado pelos demais ministros da Sexta Turma.

Esta é a quarta derrota do parlamentar no processo. Embora as condenações já tenham transitado em julgado, o pagamento da indenização não foi efetuado até o momento. A não quitação do valor tem provocado nova mobilização da deputada Duda Salabert, que reforça a necessidade de cumprimento da decisão.

Para Duda Salabert, a confirmação da condenação representa “uma conquista importante para todas as pessoas trans que enfrentam a transfobia de forma contínua”. Em manifestação após a decisão, a parlamentar afirmou: “Espero que, desta vez, a Justiça garanta a efetividade da decisão, inclusive com o depósito da quantia devida”.

Os advogados de Duda poderão agora requerer medidas para garantir a execução da sentença, incluindo bloqueio de valores ou de bens do condenado. Segundo especialistas em direito processual civil, a fase de execução costuma ser célere quando há decisão definitiva e valores claramente definidos.

O caso ganhou destaque por envolver dois parlamentares mineiros eleitos em 2022 para cargos federais. Enquanto Nikolas Ferreira figura entre os principais representantes do partido do presidente Jair Bolsonaro na Câmara, Duda Salabert tornou-se a primeira deputada federal trans do país. O episódio reforça o debate sobre discurso de ódio e direitos de populações LGBTIQ+ no âmbito político.

Organizações de defesa de direitos humanos acompanharam o julgamento no STJ. Em nota conjunta, entidades avaliaram que a manutenção da condenação reforça jurisprudência que reconhece ofensas homotransfóbicas como violação de direitos fundamentais à honra e à dignidade. As entidades também destacaram a importância do caráter pedagógico das indenizações em casos de discriminação.

Na Câmara dos Deputados, a repercussão foi limitada a manifestações de parlamentares de partidos de oposição, que citaram a decisão para cobrar maior rigor no combate a discursos discriminatórios. Ainda não há previsão de propostas legislativas que incorporem sanções específicas para manifestações transfóbicas no regimento interno da Casa.

Para o advogado de Nikolas Ferreira, a decisão do STJ desconsidera o direito à livre manifestação do pensamento, protegido pela Constituição Federal. Em nota, a defesa informou que avalia as próximas providências e que pode levar o tema ao Supremo Tribunal Federal (STF) caso entenda haver ofensa a garantias constitucionais.

Especialistas em direito constitucional consultados neste momento divergiram sobre a viabilidade de acolhimento de recurso no STF. Segundo um professor de Direito Constitucional de universidade pública, há entendimento consolidado de que liberdade de expressão não ampara discursos que ferem a honra ou expõem alguém ao ridículo com base em preconceito. Outro especialista, com foco em garantias individuais, acredita que o STF pode analisar eventual colisão entre direitos fundamentais.

Com a decisão do STJ, o processo segue para execução. O cumprimento da sentença, segundo juristas, dependerá do acompanhamento da procuradoria da parte autora, que poderá utilizar ferramentas de penhora de valores em contas bancárias ou de bens móveis e imóveis do deputado. A efetivação do pagamento marcará o encerramento definitivo do litígio iniciado no ano de 2021.

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Last Update: 12/06/2025