O Supremo Tribunal Federal (STF) irá avaliar se a Lei da Anistia alcança os crimes de ocultação de cadáver ocorridos durante a ditadura militar, e que seguem sem solução.
O relator dos autos é o ministro Flávio Dino, que inclusive submeteu a questão, que é objeto do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1501674, ao Plenário Virtual, que reconheceu a repercussão geral do tema em deliberação que se encerrou na última sexta-feira (14).
Desta forma, a Corte decide julgar a matéria de fundo debatida no recurso e a questão de mérito que será posteriormente tomada pelo Plenário, e que deverá ser acompanhada pelas demais instâncias do Judiciário em casos semelhantes.
Em sua manifestação, o ministro Flávio Dino destacou que o caso avaliado não envolve proposta de revisão da decisão da ADPF 153, mas a delimitação do alcance da Lei de Anistia em relação ao crime permanente de ocultação de cadáver, em que a ação se prolonga no tempo.
“A manutenção da omissão do local onde se encontra o cadáver, além de impedir os familiares de exercerem seu direito ao luto, configura a prática do crime, bem como situação de flagrante”, ressaltou, explicando que tal crime não ocorre apenas de forma física.
Ao se manifestar pela existência de repercussão geral, Dino ressaltou o impacto social da matéria, que se relaciona com a maneira como o Brasil enfrentou a sua história, destacando “a conclusão milenar sobre um direito natural de pais e mães de velarem e enterrarem dignamente seus filhos, o que se estende a irmãos, sobrinhos, netos, etc”.
Além disso, a análise levará em conta o alcance da decisão do STF sobre a Lei da Anistia e questões de direitos humanos relacionadas, em especial os pontos consagrados pela Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado, promulgada pelo Decreto 8.767/2016. A posição do relator foi seguida por unanimidade.
Entenda o caso
O caso concreto envolve a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) no Pará, apresentada em 2015, contra os tenentes-coronéis do Exército Lício Augusto Ribeiro Maciel, acusado de matar, em 1973, “mediante emboscada e por motivo torpe”, três opositores ao regime militar e de ocultar seus restos mortais, e Sebastião Curió Rodrigues de Moura, acusado de atuar na ocultação dos cadáveres entre 1974 e 1976.
Os fatos ocorrem no contexto da chamada Guerrilha do Araguaia, movimento armado organizado por militantes do Partido Comunista do Brasil (PC do B) nas proximidades do Rio Araguaia (nos Estados do Pará e Tocantins, na época, norte do Goiás).
A denúncia foi inicialmente rejeitada pela Justiça Federal no Pará com base na Lei da Anistia (Lei 6.683/1979), e no entendimento do STF sobre a validade dessa norma, no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 153. A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), o que levou o MPF a recorrer ao Supremo.