A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de manter símbolos religiosos em instituições públicas, como crucifixos no plenário do STF, reacendeu o debate sobre a laicidade do Estado brasileiro.
Para a antropóloga e pesquisadora Ana Maria, a decisão unânime da Corte levanta questionamentos sobre o espaço que outras religiões teriam caso reivindicassem a mesma representatividade.
“Eu consigo imaginar uma ação para o dia seguinte desta decisão do STF: outras religiões reivindicarem igual espaço de representação nas paredes da Corte. Daí, o STF terá que se justificar sobre por que alguns símbolos são aceitos e outros não. Não há outra resposta, senão o poder de algumas religiões frente a outras”, argumenta Ana Maria.
Para a antropóloga, a discussão sobre a presença de símbolos religiosos em espaços públicos — majoritariamente cristãos — vai além de questões estéticas ou de tradição.
“Olhe esta imagem do plenário do STF: uma cruz no centro das atenções, sobre os ombros do presidente da Corte. A questão é sobre democracia, sobre que tipo de democracia queremos viver e sobre o lugar das religiões nos espaços oficiais do Estado”, reflete a pesquisadora.
Ana Maria destaca que a laicidade do Estado pode ser garantida de duas formas: por um esforço de neutralidade — sem nenhum símbolo religioso nos espaços públicos — ou pela pluralidade religiosa. “Um símbolo religioso na Corte de um estado sem religião oficial não é um ornamento. É um sinal de poder concreto e simbólico. É uma demonstração de força política”, afirma.
A escritora Maria José, com vasto conhecimento em educação, filosofia e espiritismo, também vê a decisão da Corte como um retrocesso democrático.
“O Supremo acaba de ratificar uma tradição que se aferra a um passado em que não havia separação entre Estado e Igreja e, com isso, pode ajudar a pavimentar um futuro em que retrocedamos alguns séculos ainda para trás”.
A decisão unânime da Corte
Nesta terça-feira, por unanimidade, a Corte rejeitou o recurso do Ministério Público Federal (MPF) contra a presença de símbolos religiosos — predominantemente cristãos — por entender que não ferem os princípios do Estado laico.
O relator do caso, ministro Cristiano Zanin, concluiu que a presença dos símbolos “não viola os princípios da não discriminação, da laicidade estatal e da impessoalidade, desde que tenha o objetivo de manifestar a tradição cultural da sociedade brasileira”.
Seu voto foi acompanhado pelos ministros André Mendonça, Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Dias Toffoli, Nunes Marques, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin. Fachin, no entanto, ressaltou a necessidade de contemplar “culturas diversas e formas diferentes de ser e estar”.
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