O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, afirmou estar “aborrecido e chateado” em entrevista à CNN, devido à repercussão dos abusos policiais cometidos nos últimos dias, que apesar de gravíssimos, não arruínam o trabalho feito na SSP nos últimos dois anos. 

A grande questão é que a atual gestão do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) está fazendo o possível para legitimar as arbitrariedades e violências cometidas pela Polícia Militar (PM) em todo o Estado, nas palavras de Claudinho Silva, ouvidor da Polícia de São Paulo, convidado do programa TVGGN 20H desta quinta-feira (6). 

“Cada uma das mortes que ocorrem no Estado, que a imprensa noticia e que torna pública, opinião pública torna pública, a Secretaria de Segurança Pública faz uma nota à imprensa legitimando aquela atividade nas entrelinhas dessa nota. Coloca lá, floreia lá dizendo que o Ministério Público está investigando, a polícia está investigando e etc., mas nas entrelinhas legitima”, aponta o ouvidor. 

Silva aponta que outra praxe que indica a naturalização da violência policial é informar que “os meliantes estão optando pelo confronto”.

“No caso do Marco Aurélio Cardenas, o estudante de medicina, a primeira nota que a Secretaria de Segurança Pública solta é uma nota dizendo que o estudante investiu contra os policiais. Aí, logo em seguida, aparece o vídeo do sistema de monitoramento do hotel e desmente, mostrando que o estudante, na verdade, estava acuado, sem camisa, sem ofertar qualquer risco àqueles policiais”, exemplifica o convidado.

Ouvidoria

A Ouvidoria da PM foi criada, inicialmente, por decreto em 1995 e dois anos depois virou uma lei complementar durante o governo de Mário Covas (PSDB). Composta por uma lista tríplice renovada a cada três anos, a ouvidoria conta com pessoas da sociedade civil que atendam alguns requisitos, como ter mais de 35 anos, ensino superior e trajetória na área de Direitos Humanos. 

“A própria lei da ouvidoria estabelece que a ouvidoria é ombudsman do sistema de segurança pública do Estado. E, para além disso, ela dá autonomia e independência para a atuação do ouvidor e da ouvidoria”, explica Claudinho Silva.

Na última semana, no entanto, Derrite publicou uma resolução administrativa para criar uma ouvidoria paralela, na qual o próprio secretário escolheria os responsáveis pelo trabalho que seria, obviamente, subordinados a ele. 

“Esse ato de tentar criar uma nova ouvidoria é mais um capítulo, nessa novela conduzida pelo Derrite, de sinalizar para a tropa que a tropa está com proteção por parte do gestor da política de segurança pública”, continua o ouvidor.

O ouvidor emenda ainda que quanto a tropa não tem sinalização de controle, seriedade e cidadania, ela acha que “está solta”. 

“O que o Derrite fez? Quando ele cria uma nova ouvidoria por resolução, ouvidoria essa que, em várias das suas missões que estão estabelecidas, sobrepõe as missões que essa ouvidoria que existe já tem, ele está dizendo para os policiais o seguinte, está vendo esse órgão aí que é o único que está fazendo contraponto na estrutura do Estado, que está fazendo contraponto aos crimes cometidos por vocês, então eu vou atacar ele um pouquinho para fragilizar ele, para vocês poderem ter liberdade para poder cometer os crimes que vocês estão cometendo”, emenda o ouvidor. 

Números alarmantes

Para tentar conter o “assustador números de mortes decorrentes de intervenção policial no Estado de São Paulo”, Claudinho Silva conta que os ouvidores oficiais da PM estão cobrando a atuação do Ministério Público. 

Assim, já foi marcada uma reunião com o procurador-geral de Justiça do Estado, a fim de solicitar que o MP tenha uma postura mais efetiva em relação aos abusos e crimes cometidos por PMs, além de maior controle e enfrentamento aos abusos decorrentes da atividade policial.

“Não dá para a gente fazer esses enfrentamentos, discutir uma segurança pública cidadã sem o MP estar junto.”

Na visão de Silva, o MP se manteve omisso na atuação da polícia, até porque o agente que atirou em um rapaz da ponte esta semana estava envolvido na execução de outro rapaz, morto com 12 tiros sob a acusação de assalto e enfrentamento. 

A arma encontrada com a vítima, no entanto, não tinha condições de atirar, o que derrubou a tese dos policiais de que a execução foi resultante de uma ação de legítima defesa. O caso, no entanto, foi arquivado pelo MP.

Descumprimento

Segundo o ouvidor, a atual gestão da SSP burla até mesmo uma determinação do Supremo Tribunal Federal. O ministro Luís Roberto Barroso acatou uma ação da Defensoria Pública e da Conectas Direitos Humanos para que os policiais usem câmeras corporais nas ações da polícia. 

Desde então, a SSP deixou de narrar as operações da PM, para que a Força Tática e o Luís Roberto Barroso (Baep) pudessem atuar sem o registro de imagens. Foi o que resultou na morte do menino Ryan da Silva Andrade, de 4 anos, no Morro do Sarmento, em Santos. 

“O chefe do Centro de Comunicação Social da PM, numa coletiva de imprensa, ele fala que os policiais estão afastados não porque eles cometeram um erro, mas porque eles são vítimas e eles precisam de proteção. No segundo momento, nessa mesma coletiva de imprensa, ele fala que realmente o tiro que alvejou a criança partiu de uma arma da PM. Lógico, eles tinham de assumir isso, o projeto ficou alojado na criança. Se o projeto tivesse entrado e saído, provavelmente eles iam negar, iam dizer que partiu dos meliantes que supostamente trocaram o tiro com a polícia”, continua o entrevistado. 

Ainda na mesma entrevista, o chefe da comunicação da PM defendeu a redução da maioridade penal.

Confira a entrevista na íntegra:

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Last Update: 06/12/2024