Os programas sociais ganharam peso na composição da renda das famílias brasileiras em 2024. Dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que os benefícios pagos pelas três esferas de governo representaram 3,8% do rendimento domiciliar médio do país. Esse foi o segundo maior patamar desde o início da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-C), em 2012, ficando atrás apenas de 2020, quando o Auxílio Emergencial teve forte impacto no enfrentamento da crise econômica causada pela pandemia de covid-19.

O principal responsável pelo avanço atual foi o Benefício de Prestação Continuada (BPC), programa que garante um salário mínimo a idosos de baixa renda e pessoas com deficiência. Em 2024, o BPC estava presente em 5% dos domicílios brasileiros, número que corresponde ao dobro do registrado em 2012, quando o percentual era de 2,5%. Em 2019, antes da pandemia e da flexibilização temporária das regras de concessão, esse índice era de 3,5%.

A trajetória de crescimento do BPC chama atenção pela velocidade da expansão. A pandemia foi um fator determinante, pois, na tentativa de ampliar a proteção social, o governo permitiu que a renda de quem já era beneficiário do BPC não fosse considerada para o cálculo da renda familiar exigida para novas concessões. Essa mudança aumentou o alcance do programa e acabou sendo mantida mesmo após o período mais crítico da crise sanitária.

Para ter direito ao BPC, o morador do domicílio precisa ter mais de 65 anos ou ser uma pessoa com deficiência, além de viver em uma família cuja renda mensal per capita seja inferior a um quarto do salário mínimo.

O crescimento do número de beneficiários do BPC ocorre em meio a um contexto em que especialistas e analistas divergem sobre a possível relação entre esse aumento e os efeitos da reforma da Previdência aprovada em 2019. Essa reforma endureceu regras para a concessão de aposentadorias, o que poderia ter levado mais pessoas a buscar o amparo do BPC.

Dados do próprio Ministério da Previdência apontam que, de 2019 a 2024, o número de aposentadorias e pensões do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) cresceu 11,4%, enquanto o número de benefícios do BPC saltou 33,8% no mesmo período.

No entanto, há quem avalie que o crescimento expressivo do BPC não se explique apenas pela substituição das aposentadorias. Para alguns especialistas, como o professor da Universidade de São Paulo (USP) Luis Eduardo Afonso, o aumento pode refletir falhas no controle e na verificação dos critérios exigidos para a concessão do benefício, como a avaliação da renda familiar e a comprovação da deficiência.

Por outro lado, pesquisadores também apontam que, mesmo com o avanço do BPC, não há indícios claros de que o programa esteja suprindo plenamente a redução no acesso às aposentadorias. Segundo dados da Pnad-C, até 2023 houve um aumento do número de pessoas sem qualquer rendimento, principalmente entre a população idosa. Para a pesquisadora Ana Amélia Camarano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), esses dados sugerem que parte da população ficou desprotegida após as mudanças nas regras previdenciárias.

O rendimento médio das aposentadorias e pensões, por exemplo, chegou a R\$ 2.528 em 2024, valor que ainda é 3,1% menor do que o registrado em 2019. Com a nova legislação, trabalhadores precisam contribuir por 40 anos para se aposentar com o benefício integral. No caso das mulheres, o período exigido pode ser até maior, especialmente para aquelas que não se enquadraram nas regras de transição.

Enquanto o BPC se expandiu, o Bolsa Família apresentou uma leve retração na proporção de domicílios atendidos. Em 2024, o programa estava presente em 18,7% dos lares brasileiros, número inferior aos 19% registrados em 2023. Ainda assim, o crescimento do Bolsa Família em relação ao período anterior à pandemia foi expressivo. Em 2019, a presença do programa era de 14,3% dos domicílios.

A ampliação da presença dos programas sociais é mais visível nas regiões Norte e Nordeste, áreas historicamente mais dependentes das transferências de renda. No Norte, os benefícios chegaram a representar 8,2% do rendimento domiciliar médio em 2024, mais do que o dobro da média nacional. No Nordeste, esse peso alcançou 9,4%.

De acordo com os dados do IBGE, cerca de 20 milhões de brasileiros estavam recebendo algum tipo de programa social em 2024, incluindo tanto o Bolsa Família quanto o BPC e outras ações locais implementadas por estados e municípios. Esse contingente é 7 milhões maior do que o registrado em 2019 e só foi superado durante os anos mais críticos da pandemia, quando o Auxílio Emergencial ampliou consideravelmente o número de pessoas atendidas.

O avanço dos programas sociais, em especial do BPC, confirma a tendência de reforço das políticas públicas de transferência de renda no Brasil sob o atual governo. Ao mesmo tempo, o crescimento do número de beneficiários reacende o debate sobre os desafios da gestão, fiscalização e sustentabilidade dessas políticas no longo prazo.

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Last Update: 10/05/2025