Sistemas Econômicos Comparados Japão versus Brasil/EUA

por Fernando Nogueira da Costa

A maioria da população japonesa usa bicicletas. Brota a dúvida em visitantes: por qual razão a indústria automobilística japonesa se desenvolveu com grandes marcas no mercado mundial?

A resposta exige uma breve recapitulação histórica do desenvolvimento econômico japonês. Lá, o uso doméstico de bicicletas e o avanço global da indústria automobilística não são contraditórios, mas expressam lógicas distintas de planejamento industrial, urbanismo e inserção internacional.

O Japão tem uma cultura de uso intenso de bicicletas, não só em cidades pequenas e médias. Nas grandes metrópoles, o transporte ferroviário (metrôs e trens-balas) é o verdadeiro protagonista da mobilidade urbana. A bicicleta, nelas, costuma ser o meio de acesso ao transporte público, usada para curtas distâncias.

Logo, o Japão é um país altamente motorizado em sua capacidade industrial, mas não dependente de carros para deslocamento urbano de massa. Isso acontece em países como Estados Unidos ou Brasil.

A explicação da razão pela qual a indústria automobilística japonesa cresceu tanto envolve estratégia nacional de desenvolvimento, política industrial e inserção no comércio internacional.

Após a Segunda Guerra Mundial, o Japão adotou um modelo de capitalismo coordenado com forte planejamento estatal, liderado pelo Ministério do Comércio Internacional e Indústria (MITI). Na política industrial ativa, no pós-guerra, o governo protegeu e incentivou setores-chave, como o automobilístico, com crédito direcionado, metas de produtividade, controle de importações e exigências tecnológicas.

Como o mercado doméstico era limitado (e disciplinado pelo urbanismo denso), a indústria foi estrategicamente orientada para exportar desde os anos 1960–70. A ênfase era colocada em produção eficiente, carros compactos, alta qualidade e custo competitivo.

Adotou a exportação como motor de crescimento. Assim, nasceram gigantes como Toyota, Honda, Nissan, Mitsubishi, Mazda etc.

O Japão tornou-se referência em produção enxuta (lean manufacturing), com o Sistema Toyota de Produção (STP), também conhecido como Toyotismo. É um sistema de gestão da produção desenvolvido pela Toyota com vista a eliminação de desperdícios e a busca pela eficiência máxima.

Ele se baseia em dois pilares principais:

1. o Just-in-Time (JIT) é produzir o produto certo, na hora certa e na quantidade certa, evitando estoques excessivos e desperdícios;

2. a Autonomação (Jidoka) é dotar as máquinas de inteligência para identificar defeitos e parar a produção automaticamente, evitando problemas se propagarem.

As montadoras japonesas passaram a liderar em confiabilidade mecânica, eficiência e inovação incremental — e depois entraram no segmento de carros híbridos e elétricos. Reuniram inovação e qualidade.

O modelo japonês não é centrado no automóvel, como o americano. É centrado em transporte coletivo e mobilidade eficiente.

Bicicleta, carro e urbanismo não têm contradição. Assim, a bicicleta, usada inclusive por mães carregando dois filhos, um atrás outro na frente, convive com a indústria automobilística sem conflito porque a mobilidade local urbana soma as bicicletas ao transporte público. O melhor de tudo, com poucos carros nas estreitas ruas sem calçadas, as crianças desde cedo vão às escolas sozinhas em segurança!

A indústria de alta tecnologia prioriza a exportação de veículos, engenharia avançada, cadeia de valor global.

Há um tremendo contraste com países como Brasil e Estados Unidos. No Brasil, o uso de automóveis foi induzido como símbolo de modernidade e mobilidade individual, mesmo sem infraestrutura urbana adequada. A política de transporte no Brasil foi moldada por interesses da indústria automotiva e da especulação urbana, criando cidades carro-dependentes.

Nos EUA, o american way of life pós-guerra foi literalmente construído sobre rodovias, subúrbios e carros — e hoje paga o preço disso em congestionamentos e crises climáticas. Pior é o mimetismo brasileiro dessa cultura hoje imperial.

O Japão fez o oposto — e deu certo. Desviou-se do modelo norte-americano e mostrou ser possível sua população usar bicicleta e transporte coletivo, no cotidiano, enquanto lidera setores de alta tecnologia industrial, como o automotivo.

A questão central não é quantos carros são usados, mas para qual finalidade se desenvolve uma indústria. No caso japonês, não foi para inchar as cidades com carros, mas para liderar mercados globais com eficiência e inovação.

Abaixo está um quadro comparativo didático entre Japão, Brasil e EUA sobre mobilidade urbana, urbanismo e política industrial automotiva. Foi construído pela Inteligência Artificial a pedido e sob orientação.

Indicador Japão Brasil EUA
Uso predominante no transporte urbano Transporte coletivo + bicicleta Ônibus +
carro particular
Carro particular
Proporção de bicicletas no modal urbano (%) 20% 4% 2%
Dependência do carro nas cidades (%) 35% 75% 85%
Investimento público em transporte coletivo (US$/hab) 550 150 200
Modelo de urbanismo dominante Alta densidade, cidades compactas Espraiado, rodoviarista Subúrbios e rodovias
Exportação de veículos (ranking mundial) Top 3 Top 8 Top 2
Política industrial automotiva Planejamento estatal com foco exportador Subsídios internos e mercado doméstico Mercado privado com forte lobby

A produção de veículos no Brasil em 2024 foi impulsionada por um aumento de 9,7% em relação ao ano anterior, totalizando 2,5 milhões de unidades, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

Este crescimento permitiu ao Brasil ultrapassar a Espanha e reconquistar a oitava posição no ranking mundial de produção.

Ranking de produção de veículos (2024):

  1. China (31,3 milhões)
  2. Estados Unidos (11,9 milhões)
  3. Japão (8,2 milhões)
  4. Índia (5,6 milhões)
  5. México (4,3 milhões)
  6. Coreia do Sul (4,2 milhões)
  7. Alemanha (4,2 milhões)
  8. Brasil (2,55 milhões) 

Fernando Nogueira da Costa – Professor Titular do IE-UNICAMP. Baixe seus livros digitais em “Obras (Quase) Completas”: http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/ E-mail: [email protected]

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Last Update: 08/07/2025