O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, encaminhou ofícios ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) solicitando a abertura de investigações sobre possíveis práticas anticoncorrenciais envolvendo refinarias de petróleo privatizadas e distribuidoras de gás de cozinha no Brasil. Os documentos foram obtidos pela agência Reuters nesta quarta-feira (29).
No caso do refino, Silveira apontou diretamente a atuação da Refinaria da Amazônia (Ream), atualmente sob controle do Grupo Atem, como principal foco de preocupação. Segundo o ministro, essa e outras refinarias privadas estariam comercializando derivados a preços “significativamente” superiores aos praticados por outros fornecedores primários e acima do valor de paridade de importação.
“Esse cenário adquire relevância, especialmente no contexto de interrupção das operações desta refinaria, que vem operando apenas como terminal desde meados do primeiro semestre de 2024”, afirmou Silveira em ofício enviado ao presidente do Cade, Alexandre Macedo.
A Ream foi privatizada em 2022, quando ainda operava como Refinaria de Manaus (Reman), e desde então passou a integrar a rede de ativos da Atem. A unidade é a única refinaria localizada na Região Norte do país. Apesar disso, segundo o ministro, não estaria cumprindo plenamente sua função como unidade de refino.
Até o momento, a Ream e a Refina Brasil, entidade que representa refinarias privadas no país, não se manifestaram oficialmente sobre as alegações.
A Federação Única dos Petroleiros (FUP), que vem questionando a atuação da Ream desde a privatização, também protocolou nesta quarta-feira (29) uma representação na Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) solicitando investigação sobre a operação da refinaria.
“A ação… destaca que a Ream, única refinaria na Região Norte, vem sendo deliberadamente descaracterizada como unidade de refino, contrariando os termos da autorização concedida pela ANP e os compromissos reforçados no processo de privatização da antiga Reman, em 2022”, disse a FUP por meio de nota.
O documento entregue à ANP foi assinado pelo Sindicato dos Petroleiros do Estado do Amazonas (Sindipetro-AM), filiado à FUP. A entidade alega que há indícios de descumprimento das obrigações operacionais estabelecidas no processo de transferência da refinaria do controle estatal para a iniciativa privada.
Além da questão relacionada ao refino, o ministro também solicitou ao Cade que analise a evolução das margens de lucro no setor de distribuição de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), também conhecido como gás de cozinha. Silveira argumenta que houve um crescimento desproporcional das margens entre 2019 e 2025, ultrapassando os índices gerais de inflação.
“Entre maio de 2019 e março de 2025, a margem de distribuição cresceu 64%, bem acima do IPCA registrado para o período (35%)”, afirmou o ministro.
O Ministério de Minas e Energia citou um estudo realizado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), que analisou os componentes das margens bruta e líquida das distribuidoras. De acordo com o levantamento, os custos operacionais das empresas acompanharam a inflação medida pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), com alta de 48%, enquanto a margem líquida avançou 188% nominalmente no mesmo período, representando atualmente 44% da margem bruta.
O estudo da EPE, conforme destacado pelo ofício, também indica que as distribuidoras apresentam aumento de geração de caixa, baixos níveis de endividamento e margens acima da média observada internacionalmente em mais de 30%.
Diante dos dados apresentados, Silveira afirmou que “a evolução do perfil das margens brutas e líquidas dos distribuidores de GLP, interpretada à luz da estrutura do mercado e das atuações dos agentes econômicos, merece ser evidente e detalhada em relação aos aspectos concorrenciais envolvidos”.
O ministro não apresentou conclusões definitivas sobre as práticas adotadas, mas pediu ao Cade que avalie se há concentração de mercado ou condutas que possam ser enquadradas como infrações à ordem econômica.
Procurado, o Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás) também não respondeu aos pedidos de comentário.
As movimentações do Ministério de Minas e Energia ocorrem em um momento de debate sobre os impactos da privatização de refinarias no Brasil e da formação de preços dos combustíveis. A agenda de transição energética e regulação do setor também tem sido tema de discussão entre representantes do governo, reguladores e agentes do mercado.
O Cade ainda não se pronunciou oficialmente sobre o recebimento ou a eventual abertura de processos com base nos ofícios encaminhados pelo ministério. Caso o órgão decida iniciar investigações, os procedimentos devem seguir ritos administrativos que incluem coleta de informações, análises técnicas e eventuais medidas preventivas.
A ANP também não se manifestou sobre a representação apresentada pela FUP e o Sindipetro-AM até o fechamento desta edição.