O Chile decide neste domingo (14) quem governará o país a partir de 2026 em um segundo turno presidencial marcado pela tentativa da candidata comunista Jeannette Jara de conter a ascensão da extrema direita, representada por José Antonio Kast, que chega à votação como favorito nas pesquisas após consolidar o apoio da direita tradicional e de setores ultraconservadores.
Jeannette Jara disputa a Presidência pela coalizão Unidad por Chile, que reúne o Partido Comunista, o Partido Socialista e outras legendas de centro-esquerda alinhadas ao governo de Gabriel Boric.
Ex-ministra do Trabalho, Jara defende a continuidade de políticas sociais, como a ampliação de direitos trabalhistas, o fortalecimento do gasto público em áreas como educação, previdência e segurança, além de uma política migratória baseada em controle estatal e regularização.
Seu adversário, José Antonio Kast, lidera o Partido Republicano e concentra o apoio da direita tradicional e da extrema direita.
Kast propõe um ajuste fiscal acelerado, com cortes de até US$ 6 bilhões no gasto público em 18 meses, redução de impostos para os setores de maior renda, endurecimento penal, ampliação do papel das Forças Armadas na segurança interna e deportação em massa de imigrantes sem documentos — agenda que críticos apontam como capaz de reduzir a proteção social em um país ainda marcado por crescente desigualdades estruturais.
No primeiro turno, realizado em 16 de novembro, Jara ficou em primeiro lugar com 26,8% dos votos, seguida por Kast, que obteve 23,9%, resultado que levou ambos ao segundo turno.
Apesar da liderança inicial da candidata governista, o conjunto das candidaturas da direita e da extrema direita somou cerca de 76% dos votos válidos, criando uma base favorável para Kast na etapa decisiva.
A participação foi de 85,3%, e cerca de metade do eleitorado não votou em nenhum dos dois finalistas, tornando decisiva a disputa pelos votos transferidos de candidaturas derrotadas, especialmente em um segundo turno marcado pelo voto obrigatório, retomado no país após décadas.
Na reta final da campanha, Jara tem buscado confrontar diretamente o programa do adversário e rejeitar o discurso da ultradireita sobre imigração e segurança. Em debates televisivos, a candidata questionou a viabilidade das propostas de deportação em massa defendidas por Kast.
“Mandar 330 mil pessoas para fora do país significa nove anos com um avião por dia transportando cem pessoas. Para de mentir à população para arrancar alguns votos aqui e ali”, afirmou, ao criticar o uso do tema migratório como instrumento eleitoral.
Ao rebater as acusações de que representaria apenas a continuidade do atual governo, Jara também tem insistido que sua candidatura apresenta um projeto distinto do ajuste fiscal proposto pela extrema direita.
“Eu não vou reduzir os impostos dos ricos como propõe Kast. Não vou diminuir o gasto social como propõe Kast, porque quero mais carabineiros nas ruas, mais professores nas salas de aula e mais iluminação nas ruas”, declarou, ao afirmar que cortes acelerados no orçamento colocariam em risco políticas públicas essenciais.
Kast construiu sua campanha a partir de um discurso de colapso permanente, sintetizado no slogan segundo o qual “o Chile está caindo aos pedaços”. Para especialistas, a retórica de emergência adotada por Kast tem sido utilizada para justificar propostas de exceção e a ampliação de poderes do Executivo.
Para o professor de Comunicação Política da Universidade Diego Portales, Cristian Leporati, a narrativa ignora indicadores econômicos positivos e opera a partir da amplificação do medo. Em entrevista ao Página/12, ele afirmou que o discurso da oposição constrói artificialmente uma sensação de colapso econômico.
“Se você analisa, por exemplo, os números das exportações do Chile, este ano serão históricos. Há uma série de sinais de que a economia está funcionando, mas a retórica da oposição há tempo é que está tudo mal”, afirmou.
As urnas foram abertas às 8h (horário local) e permanecem em funcionamento até as 18h, desde que não haja eleitores na fila. Segundo o Serviço Eleitoral do Chile (Servel), mais de 15,7 milhões de cidadãos estão aptos a votar no país e no exterior.
O voto é obrigatório no território chileno — retomado após décadas — e a autoridade eleitoral estima que os resultados preliminares do segundo turno comecem a ser divulgados a partir das 20h.